Renúncia como premiê arranha imagem de Juncker, o "europeu exemplar'
11 de julho de 2013Para muitos, ele é a cara da zona do euro. Durante oito anos – até o início de 2013 – Jean-Claude Juncker conduziu as negociações dos ministros das Finanças dos 17 países de moeda comum. Como presidente do Eurogrupo, ele criou pacotes de resgate, cortes da dívida e uma supervisão uniforme sobre bancos em crise. Juncker é, como brincam alguns diplomatas, o mediador ideal, mas com duas falhas: tem uma opinião e também a defende.
A piada, contada com prazer em Bruxelas, agrada ao próprio luxemburguês. Ele é afeiçoado a formulações irônicas, especialmente quando se trata de apresentar resultados de negociações ou passar um recado a jornalistas. "Eu não tenho que lidar agora com uma questão que não se coloca no momento. Se o burro fosse um gato, passaria o dia todo sentado numa árvore."
A resposta é uma das prediletas que ele dá a repórteres quando lhe fazem uma pergunta hipotética. Certa vez, em Bruxelas, ele chegou mesmo a morder o protetor de vento cinza do microfone de uma jornalista – de brincadeira, é claro.
Juncker não se vê exatamente como um mediador e diz que entre os ministros de Finanças da zona do euro há gritos e discussões acirradas. "Não é possível transmitir ao vivo", brincou numa entrevista.
Habilidoso no trato com jornalistas e nas negociações em Bruxelas, Juncker não conseguiu, em seu país, evitar um escândalo que teria passado despercebido na Europa se não tivesse culminado na sua renúncia. Na quarta-feira (11/07), o chefe do governo luxemburguês anunciou que deixaria o cargo que ocupou nos últimos 18 anos.
O Parlamento acusa o político de 58 anos, jurista de formação, de ter negligenciado o controle sobre o serviço de inteligência luxemburguês. Investigações para o esclarecimento dos misteriosos atentados a bomba de 1984 a 1986 em Luxemburgo teriam sido obstruídas.
O pequeno grão-ducado, espremido entre Alemanha, Bélgica e França, tem somente meio milhão de habitantes. Desses, 60% são cidadãos luxemburgueses, o resto é composto por estrangeiros – a maioria empregada nos muitos bancos ou instituições europeias instalados no país.
Dois suspeitos de colocar bombas estão respondendo processo perante a Justiça. Os verdadeiros autores não foram presos até hoje. Os serviços de inteligência da Otan e até mesmo a nobreza do grão-ducado podem estar envolvidos, especulam a imprensa luxemburguesa e alemã.
Juncker rebateu as acusações, mas renunciou, evitando assim uma moção de desconfiança no Parlamento. O chefe de governo mais antigo da União Europeia (UE) admitiu que, na crise de endividamento, passou tempo demais no Eurogrupo. "Não foi nenhum divertimento", disse ele em entrevista à Deutsche Welle. Por esse motivo, após deixar a presidência do Eurogrupo, ele disse querer se ocupar mais com Luxemburgo.
Possível retorno
Os chefes de governo e Estado da União Europeia escolheram o convicto Juncker para a chefia do poderoso cargo de presidente da Comissão Europeia em 2004. Juncker recusou, por não querer se afastar do governo luxemburguês. Em 2009, ele quis então deixar a pátria para se tornar o primeiro presidente permanente do Conselho da União Europeia. "Isso foi impedido por outras importantes figuras europeias", reclama Juncker ainda hoje.
"Para mim, a Europa é uma mescla de pragmatismo e convicções fortes, quase fervorosas. Mas convicções fortes não levam a nada, quando não se age com pragmatismo. Portanto devo unir ambos", disse Juncker em entrevista à emissora Phoenix.
Marcado pelas vivências de seu pai, que foi convocado à força pelas Forças Armadas alemãs na Segunda Guerra e mais tarde trabalhou na indústria metalúrgica, Jucker sempre defendeu a reconciliação dos povos na Europa. Nesse contexto, disse ver Luxemburgo como elo entre os principais Estados da UE. "Nós luxemburgueses sabemos de coisas alemãs que nenhum francês pode imaginar e vice-versa. Somos influenciados por ambas as culturas", disse.
Nas próximas eleições, que possivelmente serão antecipadas para novembro, Juncker deverá participar como candidato do Partido Conservador. Isso foi assegurado pelo presidente do partido, Michel Wolters: "É claro que Jean-Claude Juncker vai participar das próximas eleições. Se alguns são da opinião que, em caso de novas eleições, ele não vai se candidatar, é preciso dizer a eles que ele vai ficar mais quatro anos."
Caso os luxemburgueses não venham a reelegê-lo, Juncker poderia ainda ir para Bruxelas na União Europeia. No final de 2014, serão escolhidos os postos de presidente da Comissão Europeia e do Conselho da União Europeia.