Os primeiros passos de Merkel
25 de novembro de 2005As primeiras viagens da atual chefe de governo alemã foram, em primeira linha, um ato formal de gentileza. Definições de uma linha política a ser seguida a longo prazo por Angela Merkel não podem ser deduzidas nem da escolha nem da ordem dos países visitados.
Reviravoltas com o tempo
Vide, por exemplo, a primeira viagem oficial de Gerhard Schröder, há sete anos: o então recém-empossado chanceler federal resolveu romper com a tradição institucionalizada por seu antecessor Helmut Kohl, escolhendo Londres como primeira cidade a ser visitada após sua posse.
Isso porque Schröder, na ocasião, apostava na construção de relações especiais com o Reino Unido, uma vez que não escondia sua simpatia pelo premiê Tony Blair. E vice-versa.
Ao fim do mandato de Schröder, a situação havia se invertido. Enquanto as relações franco-alemãs estavam cada vez melhores, com um chanceler federal mais próximo do que nunca do presidente francês Jacques Chirac – muito em conseqüência da postura comum frente à guerra do Iraque – o abismo entre Alemanha e Reino Unido só tendia a crescer. Os encontros regulares teuto-britânicos, também tradicionais durante o governo Helmut Kohl, deixaram há anos de acontecer.
Paris: mantendo a tradição de Kohl
Neste contexto, a rota da viagem de Angela Merkel demonstra esperteza na escolha. Primeira estação: Paris. Para reaquecer a tradição das boas relações mantidas com o vizinho desde o Tratado do Eliseu, assinado em 1963.
Mesmo que Merkel tenha insistido que não deverá priorizar as relações franco-alemãs dentro da União Européia às custas de outros membros do bloco, principalmente dos países pequenos, que muitas vezes, nos últimos anos, se roeram de ciúmes diante da tão propagada amizade entre Berlim e Paris. Esse foi pelo menos o tom da nova chanceler federal, ao seguir de Paris no mesmo dia em direção a Bruxelas.
Bruxelas: sinais de simpatia aos EUA
A cronologia das visitas feitas por Merkel em Bruxelas também não foi isenta de simbolismos: primeiro o encontro com o secretário-geral da Otan – um sinal indireto à potência máxima da organização, os EUA, de que Berlim tem grande interesse em intensificar novamente as relações com Washington.
E só depois, então, a visita ao presidente da Comissão Européia, que após a longa pausa de seis meses espera ansioso definições por parte do governo alemão. Isso depois de a UE ter entrado em desacordo a respeito da política monetária, sem contar as decepções com o fracasso dos plebiscitos que acabaram por não aprovar a Constituição do bloco.
Londres: o orçamento da UE
Logo, a conseqüência lógica: uma visita a Londres, um dia depois, para uma conversa com o premiê Tony Blair, atual presidente rotativo do Conselho Europeu. Se Blair quiser mesmo fazer com que sua presidência no Conselho seja bem-sucedida, terá certamente que contar com a boa vontade e não com a renitência da nova chanceler federal alemã.
A solução para as controversas envolvendo o orçamento da EU não estarão, como aconteceu nos últimos anos, na disponibilidade da Alemanha em arcar com mais pesos financeiros do bloco. Isso Angela Merkel deixou claro. Tanto em Paris, como em Bruxelas e Londres.
Teste diplomático
Ao mesmo tempo, a nova chefe de governo mostrou que não pretende trilhar um caminho individual, ignorando os outros, nem tampouco deu sinais de que quer tomar decisões precipitadas. Ou seja, deu amostras de que pode ter talento diplomático, dando uma demonstração de firmeza no cenário internacional.
Em seus três primeiros dias de governo, Merkel derrubou seus inimigos políticos, que afirmaram durante a campanha eleitoral e mesmo nas semanas que se seguiram às eleições que ela, a primeira mulher a ocupar o posto de chanceler federal da Alemanha, não iria conseguir se posicionar no cenário político internacional. Agora é esperar como será seu comportamento no próximo encontro de cúpula da EU e também em Varsóvia, Washington e Moscou.