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PolíticaHungria

Hungria planeia enviar tropas para o Chade

Isaac Mugabi
12 de setembro de 2024

O primeiro-ministro húngaro, Viktor Orbán, quer enviar soldados para o Chade para travar a migração. Segundo observadores, Orbán pretende imitar a crescente influência do Presidente russo, Vladimir Putin, no continente.

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O primeiro-ministro húngaro, Viktor Orbán (à direita) e o Presidente do Chade, Mahamat Idriss Déby Itno, durante uma cerimónia de boas-vindas na Praça de São Gyorgy, em Budapeste, na Hungria, a 9 de setembro de 2024
O primeiro-ministro húngaro, Viktor Orbán (à direita) e o Presidente do Chade, Mahamat Idriss Déby Itno, assinaram acordos nas áreas da defesa, agricultura e educaçãoFoto: VIVIEN C. BENKO/Hungarian Prime Minister/AFP

Depois de se ter encontrado com o Presidente chadiano, Mahamat Idriss Deby Itno, em Budapeste, na segunda-feira (09.09), o primeiro-ministro húngaro, Viktor Orbán, quer avançar com o seu plano de enviar cerca de 200 soldados para o Chade.

Este país africano desempenha um papel vital na campanha contra a migração da região do Sahel para a Europa, escreveu Orbán no Facebook.

"O Chade é um país-chave na luta contra a migração ilegal em África. A migração de África para a Europa não pode ser travada sem os países da região do Sahel. É por isso que a Hungria está a construir uma parceria com o Chade. Estamos a trabalhar neste sentido com o Presidente Déby", afirmou o primeiro-ministro da Hungria.

Com uma população de cerca de 19 milhões de habitantes, o Chade faz fronteira com o Sudão, a Líbia, o Níger e a República Centro-Africana e ocupa uma posição crucial no Sahel.

Esta localização estratégica, associada ao seu estatuto de aliado fundamental do Ocidente numa região volátil, sublinha a sua importância no panorama geopolítico mundial.

Quais são os interesses da Hungria no Sahel?

O analista político ganês Fidel Amakye Owusu disse à DW que Viktor Orbán, tal como o Presidente russo, Vladimir Putin, tem interesses económicos na região.

O primeiro-ministro húngaro está também a tentar marcar pontos políticos, numa altura em que as tropas dos Estados-membros da União Europeia (UE), como a França, perderam prestígio e estão a reduzir a sua presença no Sahel.

"Em primeiro lugar, temos de analisar os fatores que poderiam atrair Budapeste para o Sahel ou para o Chade, especificamente os recursos abundantes no Sahel como petróleo, urânio, ouro e outros recursos que são muito abundantes e que ainda não foram explorados", diz Owusu.

"Como qualquer país europeu, a Hungria está a tornar-se mais influente e também gostaria de ter acesso a uma parte significativa dos recursos de África. O ouro, o cobalto, o lítio e outros recursos são fatores importantes que podem atrair Budapeste para o Sahel e que não devem ser ignorados", destaca o especialista.

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Observadores fora do continente africano acreditam que, ao disponibilizar 200 tropas, Orbán está a tentar imitar a crescente influência da Rússia na África Ocidental. Mas enquanto alguns pensam que o destacamento pode ter um impacto significativo em termos de segurança na região do Sahel, Fidel Amayke Owusu mostra-se cético.

"O Chade é muito maior do que a Hungria e do que muitos países da Europa Ocidental. Por isso, 200 tropas podem não ter impacto", sublinha. "Na política externa, temos o aspeto simbólico em que o Estado gosta de mostrar que está a fazer alguma coisa para resolver a situação de segurança fora das suas fronteiras."

Ryan Cummings, analista da Signal Risk, na África do Sul, disse à DW que as estratégias que os Estados do Sahel têm utilizado para combater os atores não estatais armados, geralmente numa perspetiva militar, não têm abordado eficazmente os desafios de segurança na região.

"Até agora, a estratégia dos países do Sahel, quando recorrem às forças europeias ou ocidentais, às forças russas, centra-se nos sintomas e não nas causas destas insurreições ou na razão pela qual estes grupos terroristas estão a receber o apoio que recebem", considera Cummings.

Planos ambiciosos da Hungria em África

No último ano, a Hungria desenvolveu rapidamente a sua relação com o Chade. Abriu um centro de ajuda humanitária e uma missão diplomática na capital, N'Djamena, e também assinou acordos nos domínios da agricultura e da educação.

A Hungria tem uma presença historicamente fraca em África, mas Orbán tem defendido uma política externa de abertura a Leste e a Sul, procurando estabelecer laços mais estreitos com a China, a Rússia e os países africanos.

Budapeste também procura desempenhar um papel militar mais significativo no Sahel, onde quer treinar as forças de defesa, lembra Viktor Marsai, diretor do Instituto de Investigação sobre Migração.

De acordo com Marsai, tradicionalmente a Hungria tem "feito parte de coligações militares" quando é destacada para o estrangeiro, mas, desta vez, terá de "fornecer tudo sozinha", o que poderá representar desafios significativos, nomeadamente em termos de recursos e de coordenação.

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Desde que os líderes militares da África Ocidental tomaram o poder nos últimos anos, quase todos recorreram à Rússia e ao seu grupo de mercenários Wagner para obter apoio. Especialistas e políticos da oposição na Hungria têm manifestado o receio de que Budapeste, que continua próxima do Kremlin, possa atuar em nome da Rússia no Sahel.

Quando questionado sobre a missão, o Governo húngaro negou que "represente interesses russos ou quaisquer outros interesses estrangeiros no Sahel".

UE "congratula-se" com destacamento para o Chade

Apesar das divergências com Budapeste, a União Europeia saudou a iniciativa da Hungria no Chade. "É importante que mais parceiros internacionais trabalhem com o Chade", disse um porta-voz da UE à agência noticiosa AFP. Mas, a nível interno, a missão militar foi alvo de críticas, com os partidos da oposição a classificarem o destacamento de tropas como "perigoso e esbanjador".

O Governo húngaro também foi acusado de nepotismo, depois de o jornal francês Le Monde e o site de investigação húngaro Direkt36 terem noticiado que o único filho do primeiro-ministro, Gaspar Orbán, tinha participado discretamente nas negociações oficiais.

Budapeste rejeitou as críticas, apontando as "competências linguísticas" de Gaspar Orbán e a sua experiência como capitão do Exército húngaro. Desde então, foi nomeado "oficial de ligação para ajudar a preparar a missão no Chade".

Com os restantes países do Sahel de costas voltadas com a França, a chegada das forças húngaras poderia significar tropas mais diversificadas na região, considera Fidel Amayke Awusu. No entanto, se a Hungria estiver interessada nos recursos do Chade, "talvez acabe por ter de contribuir com mais forças para garantir que esses interesses são bem protegidos", acrescenta o analista.

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