Bissau: Antigo ministro diz que leis eleitorais se opoem
12 de fevereiro de 2025O jurista e antigo ministro da Justiça da Guiné-Bissau Carlos Vamain disse hoje que a Constituição e a Lei Eleitoral do país se contradizem quanto ao fim do mandato do Presidente e a data da realização de eleições.
Em declarações à Lusa a propósito da polémica sobre o fim do mandato do atual Presidente, Umaro Sissoco Embaló, e a data das eleições presidenciais, Vamain afirmou que se está perante um "imbróglio jurídico", já que a Constituição fixa o mandato presidencial em cinco anos e a Lei Eleitoral determina os meses exatos em que se podem realizar eleições para substituição de um chefe de Estado que tenha sido eleito.
Antigo professor da Faculdade de Direito de Bissau, Vamain, que se dedica ao estudo da Constituição guineense, disse à Lusa que a Lei Eleitoral recomenda que as eleições presidenciais se façam entre outubro e novembro, conforme defende o Presidente, Umaro Sissoco Embaló.
Vamain citou o artigo 3º, da Lei Eleitoral da Guiné-Bissau: "No caso das eleições legislativas e presidenciais não decorrerem da dissolução da ANP [Assembleia Nacional Popular] e da vacatura do cargo do Presidente da República, as eleições realizam-se entre os dias 23 de outubro e 25 de novembro do ano correspondente ao termino da legislatura e do mandato presidencial".
Carlos Vamain defendeu que, olhando para a Constituição da República, "não restam dúvidas" em como o mandato do atual Presidente, Umaro Sissoco Embaló, termina no próximo dia 27 por ter iniciado funções, com a posse, no dia 27 de fevereiro de 2020.
"Acontece que está-se perante uma situação de existência de um dispositivo da Lei Eleitoral que contraria flagrantemente a Constituição nesse sentido e que serviu, entretanto, de fundamento para a marcação da data das eleições presidenciais de 2019", observou Vamain.
O jurista, que se dedica à advocacia e consultoria, afirmou que, se se aplicar a Lei Eleitoral, e uma vez que Sissoco Embaló ocupou o cargo não por via de uma vacatura, mas através de umas eleições e por ter levado o seu mandato até ao fim do prazo de cinco anos, então, as novas eleições podem ser realizadas em novembro próximo.
O antigo ministro observou que o número 2 do artigo 3º da Lei Eleitoral é inconstitucional por colidir com a Constituição quando esta fixa o mandato presidencial em cinco anos.
Carlos Vamain lembra que a mesma lei foi aplicada em duas eleições presidenciais (1999 e em 2019) sem que tenha sido contestada no Supremo Tribunal da Justiça, nas vestes do Tribunal Constitucional.
"Em conclusão, enquanto não for resolvido o imbróglio jurídico-político decorrente da legislação eleitoral por inconstitucionalidade, acrescido da sua prática reiterada (...) vai-se atropelando a Constituição da República, nesta matéria", sublinhou.
O antigo ministro integrou a equipa de juristas guineenses que trabalharam num projeto de revisão da Constituição, por iniciativa de Umaro Sissoco Embaló, embora o processo tenha sido rejeitado pelo parlamento com a alegação de que é da sua exclusiva competência.
O Presidente guineense tem repetido, citando a Lei Eleitoral, que as eleições presidenciais, às quais vai associar as legislativas, vão ter lugar em novembro, estas na sequência da dissolução do parlamento e da demissão do Governo liderado pela coligação PAI-Terra Ranka, substituído por outro de iniciativa presidencial, no final de 2023.
A oposição a Embaló e várias organizações da sociedade civil têm criticado esse posicionamento, afirmando que as presidenciais deveriam ter lugar em finais de 2024 para que o novo Presidente fosse investido neste mês de fevereiro, quando consideram que termina o atual mandato.
Contudo, Umaro Sissoco Embaló tem reiterado que o seu mandato é válido até 04 de setembro, por ter sido nesse dia de 2020 que foi emitida a decisão do Supremo Tribunal relativa ao contencioso eleitoral levantado pelo seu opositor nas eleições de 2019, Domingos Simões Pereira.