Zubin Mehta: 80 anos de um maestro vienense nascido na Índia
30 de abril de 2016O maestro Zubin Mehta vive basicamente nos Estados Unidos. Apesar disso, manteve seu passaporte indiano e diz se sentir como "um vienense nascido por acaso na Índia". O rótulo cosmopolita de fato se aplica perfeitamente ao músico, que transita ativamente entre os continentes.
Ele nasceu em 29 de abril de 1936 em Bombaim (atual Mumbai). Seu pai, Mehti Mehta, era violinista de concerto, tendo fundado a Bombay Symphony Orchestra. E Zubin cresceu em meio aos discos de ícones do pódio, como Arturo Toscanini e Wilhelm Furtwängler.
Mas seu verdadeiro berço musical foi Viena. "Minha família era contra a carreira artística, e na Índia a família é que escolhe a profissão dos filhos." Assim, abandonando o estudo de medicina, em 1954 ele foi para a capital austríaca estudar regência com o mestre Hans Swarovsky. Entre seus colegas na Escola Superior de Música estavam Claudio Abbado e Daniel Barenboim.
Sucesso meteórico
A grande revelação veio ao escutar a Sinfonia nº 1 de Johannes Brahms (1833-1897) com a Orquestra Sinfônica de Viena. "Eu achei que os meus ouvidos iam estourar!" Mas o que explodiu foi a carreira do jovem Mehta: em 1961, com apenas 25 anos, ele já regera as filarmônicas de Viena e de Berlim. Entre 1961 e 1967, foi maestro titular da Orquestra Sinfônica de Montreal; de 1962 a 1978, diretor musical da Filarmônica de Los Angeles.
Em 1978 sucedia Pierre Boulez à frente da Filarmônica de Nova York, mantendo-se no cargo por 13 anos. No meio tempo, regeu em casas de ópera em Florença, San Francisco, Nova York, Londres, Viena, Salzburgo, Milão e Berlim. A partir de 1998, ocupou o posto de diretor-geral de música bávaro no Teatro Nacional de Munique.
No fim das contas, entretanto, é com a Orquestra Filarmônica de Israel que ele mais se identifica. Hoje "regente vitalício", ao longo de quase meio século de intensivo trabalho conjunto ele conseguiu situá-la entre as orquestras importantes do panorama internacional.
Faro para o espetacular
Os críticos atestam impetuosidade e refinamento sonoro, alegria, energia e fortes contrastes à atuação de Zubin Mehta no pódio, e essas características lhe garantem uma multidão de fãs. Mas não há dúvida que seu faro certeiro para ocasiões de apelo midiático também propeliram a ascensão do maestro.
Como quando, em 1990, ele regeu o primeiro concerto dos "Três Tenores", José Carreras, Plácido Domingo e Luciano Pavarotti, e novamente, quatro anos mais tarde, na Copa do Mundo nos EUA. Por cinco vezes, em 1990, 1995, 1998, 2007 e, por último, em 2015, ele foi o regente convidado para o prestigioso Concerto de Ano Novo da Filarmônica de Viena – com 50 milhões de espectadores em 90 países, a cada ano, o evento de música erudita de maior audiência no mundo.
Forte apelo de massa também tiveram as espetaculares montagens de óperas de Giacomo Puccini que Mehta regeu nos locais originais das tramas: Tosca em Roma e Turandot na "Cidade Proibida" de Pequim, com mais de 300 figurantes e 300 soldados.
Glamour, honras – mas também engajamento
Em consonância com o fogo que instila na música, Mehta cultivou um estilo de vida beirando o escandaloso. Seu primeiro casamento, com a soprano Carmen Lasky, só durou seis anos. Nos anos seguintes ele foi alvo da atenção da mídia, com sua atração por "mulheres caras em carros velozes, e mulheres rápidas em carros caros"."Eu era um verdadeiro bon vivant", reconhece.
Só o novo casamento com a ex-atriz americana Nancy Kovac, em 1969, trouxe estabilidade à vida pessoal do músico indiano. E também favoreceu sua evolução musical: "Meu estilo de vida mudou radicalmente, a minha forma de fazer música amadureceu", comentou.
Reconhecido com numerosas distinções – entre elas, o Prêmio de Paz e Tolerância pelo Conjunto da Obra, da Organização das Nações Unidas – Mehta é, ainda, maestro honorário de várias orquestras de ponta. Em 2001 foi-lhe dedicada a estrela número 2.434 da Calçada da Fama em Hollywood; em 2008 recebeu o Praemium Imperiale da casa real do Japão.
Entre tantas honrarias, o regente indiano mantém os pés no chão e não deixa de se engajar politicamente, mesmo que de maneira simbólica. Durante a Guerra dos Seis Dias, em 1967, ele foi para Jerusalém reger a Orquestra Filarmônica de Israel, diante de uma plateia protegida por máscaras contra gás. Em 2013 foi com a Orquestra Nacional Bávara à região de crise de Caxemira, num apelo à reconciliação indo-paquistanesa.
O (limitado) poder da música para mudar o mundo
Pertencente à pequena comunidade religiosa dos parses – originária da Pérsia antiga e baseada nos ensinamentos do profeta Zaratustra – ele se empenha com convicção pelo entendimento entre os povos. E se engaja, por exemplo, para que árabes israelenses possam integrar a Filarmônica de Israel – até agora sem sucesso.
Mehta acredita no poder da música, embora com ressalvas. Em entrevista à DW em 11 de setembro de 2011, décimo aniversário dos atentados terroristas nos EUA, ele comentou: "Hoje vão se realizar milhares de concertos pelo mundo. Durante a duração deles, reinará a paz. E paz multiplicada tantos milhares de vezes conta muito."
No entanto isso não basta para que a música seja um agente pacificador, já que "a política se atravessa no caminho". Ainda assim: "Não podemos jamais subestimar o poder da música. Para mim, a música é amor."
Entre os muitos eventos em torno do 80º aniversário de Zubin Mehta, destaca-se o concerto com a Filarmônica de Viena, tendo o amigo de longa data Daniel Barenboim como solista ao piano. Para agosto o cosmopolita nascido na Índia tem programada uma turnê pela América do Sul. Também parte das comemorações é o lançamento, em edição limitada, de uma coleção de 23 CDs sob sua regência, contendo interpretações consideradas antológicas.