Alemanha debate proibição de fogos após virada caótica
2 de janeiro de 2025Após encararem o rastro de destruição deixado por mais um Ano Novo festejado com a queima indiscriminada de fogos de artifício por milhares nas ruas – que, em alguns casos, mais se assemelham a verdadeiras batalhas –, autoridades na Alemanha debatem a proibição da prática, hoje acessível a qualquer cidadão.
"Fogos estão sendo usados para atacar pessoas, e o número de Kugelbomben está crescendo", disse Stephan Weh, chefe do sindicato de policiais de Berlim, referindo-se a uma categoria potente de explosivo carregado com pólvora e de acesso restrito na Alemanha, mas que teria sido muito usada por amadores nesta virada.
"Fogos de artifício têm que estar nas mãos de profissionais", insistiu Weh, ao defender um pleito antigo da categoria pela proibição da pirotecnia amadora.
A virada transcorreu de maneira pacífica na maior parte do país, mas em alguns locais os serviços de emergência tiveram uma noite movimentada. A pirotecnia provocou cinco mortes, deixou centenas de feridos e fez arder em chamas diversos imóveis, além de estourar vidraças de apartamentos e estabelecimentos comerciais em pleno inverno.
Em algumas cidades, policiais e bombeiros também foram atingidos por fogos de artifício – uma tendência recorrente nos últimos anos. Um policial de Berlim ficou gravemente ferido e precisou ser operado.
"Não há absolutamente nenhuma razão para aceitarmos que os fogos só possam ser usados profissionais em 364 dias do ano, e que em um dia do ano todo mundo possa fazer o que quiser", afirmou às emissoras alemãs RTL e n-tv o ex-prefeito de Berlim Michael Müller, do Partido Social Democrata (SPD).
"Explosivo é coisa para profissional, e não para bêbados festeiros", concordou Vasili Franco, deputado estadual em Berlim pelo partido dos Verdes, em declaração à agência de notícias dpa.
Fogos ilegais nas mãos de amadores
O debate sobre a proibição do uso de fogos por amadores sempre ressurge na Alemanha após o Ano Novo, mas enfrenta resistência de partes significativas da sociedade que consideram o ato uma "tradição".
Defensores da prática argumentam que o problema não são os fogos, e sim o uso irresponsável que é feito deles na noite da virada.
Outros apontam ainda que os danos desta vez foram causados por pirotecnia ilegal contrabandeada do Leste Europeu, cuja venda a amadores na Alemanha já é probida.
"A importação de fogos proibidos [...] precisa ser combatida por controles de fronteira ainda mais duros", defendeu à dpa Burkard Dregger, porta-voz do partido conservador CDU no Parlamento para assuntos de segurança doméstica. "Esses fogos, que já são proibidos, foram a principal causa dos ferimentos e danos causados."
Há ainda pessoas que fabricam seus próprios explosivos para a noite de Ano Novo, ou modificam fogos de artifício por conta própria para potencializar as explosões.
Pelas leis atuais, o uso de fogos ilegais na Alemanha já pode ser punido com até três anos de prisão ou multa de até 50 mil euros. Se o uso provocar ferimentos em uma outra pessoa, ou se o dispositivo for atirado propositalmente em direção a outras pessoas – algo que ocorre com frequência, mas que é difícil de provar em juízo –, a pena pode chegar a até cinco anos.
"Discussão sobre proibição não pode mais ser tabu"
Dos cinco homens mortos registrados na virada de 2024 para 2025 na Alemanha, três foram vítimas de fogos de artifício caseiros, ilegais ou de venda restrita.
Em um único hospital de Berlim, 42 pessoas estão internadas, muitas delas feridas por fogos de artifício ilegais, que contém pólvora em sua composição. Elas têm ferimentos nas mãos, no rosto e nos olhos. Outros, impactados pela magnitude das explosões, perderam a audição ou a visão.
As vítimas são quase sempre homens, segundo a revista especializada Deutsches Ärzteblatt, que contabiliza uma média de cerca de 8 mil pessoas com danos ao aparelho auditivo, todos os anos, por causa dos fogos.
Críticos da prática apontam, além dos riscos à vida humana e à propriedade privada, também o impacto ambiental que ela gera, perturbando ecossistemas, lançando poluentes na atmosfera e produzindo toneladas de lixo. A concentração de micropartículas no ar das capitais alemãs chega a subir 70 vezes após a queima de fogos, segundo o Ministério do Meio Ambiente.
"Uma discussão séria sobre uma proibição abrangente da pirotecnia não pode mais ser tabu", argumentou Franco, dos Verdes. "A única medida prudente é uma proibição total da venda de pirotecnia."
Em outubro, o governo federal enviou ao Parlamento uma proposta para endurecer as leis sobre explosivos. O texto, segundo a ministra do Interior, Nancy Faeser, prevê punições mais duras para o uso de explosivos e pirotecnia perigosa, além de criminalizar o transporte e o armazenamento desses itens.
Mas com o governo sem maioria no Parlamento e às vésperas das eleições gerais, previstas para 23 de fevereiro, é improvável que o texto seja aprovado até lá.
ra (dpa, ots)