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Um crime abala a liberal e receptiva Freiburg

Christoph Ricking fc
6 de dezembro de 2016

Estudante de 19 anos que se engajava na ajuda aos refugiados é estuprada e morta, e o principal suspeito é um adolescente afegão. Caso acirra os ânimos numa cidade onde predomina a cultura de boas-vindas aos imigrantes.

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Freiburg
Freiburg, no sul da Alemanha, é uma das cidades mais idílicas do paísFoto: picture alliance/DUMONT Bildarchiv/M. Kirchner

"A catedral, os pequenos canais de água, as iguarias e o vinho aliados à sustentabilidade – Freiburg é tudo isso e muito mais!": é assim que a cidade do sul da Alemanha se apresenta para os turistas na internet. Com seu pitoresco centro antigo, a cidade de 225 mil habitantes tem um quê de mundo perfeito. Cercada por vinhedos e nas proximidades da Floresta Negra, ela está localizada no próspero sudoeste alemão e é considerada liberal, tolerante, jovem e cosmopolita.

Cerca de 40 mil estudantes vivem em Freiburg, e a universidade é o principal empregador. A cidade tem uma longa história de envolvimento dos seus cidadãos em causas sociais. Nos anos 1970 ela foi um dos centros do movimento ambiental e antinuclear. Em 2002, Freiburg se tornou a primeira grande cidade alemã a ter um prefeito do Partido Verde, que está no poder até hoje.

Freiburg, em resumo, é uma cidade com uma forte cultura alternativa e uma população engajada – seja na proteção do meio ambiente, seja na ajuda aos refugiados.

O medo se infiltra na cidade

Agora, porém, esse idílio foi abalado. Em meados de outubro, a estudante Maria L., de 19 anos, foi estuprada e morta, e seu corpo foi encontrado no rio Dreisam. A estudante de medicina estava a caminho de casa com sua bicicleta, depois de sair de uma festa, quando foi vítima do crime. No final de semana passado, um suspeito finalmente foi preso. O acusado de cometer o crime é um refugiado de 17 anos, do Afeganistão, que chegou desacompanhado na Alemanha em 2015.

A cidade está em estado de choque: Maria L. participava da assistência aos refugiados e, agora, é ela mesma vítima num crime que teria sido cometido por um refugiado. "As reações variam, especialmente na internet", diz o jornalista Uwe Maucher, do Badische Zeitung. "Há os que dizem que sempre souberam. E outros que afirmam que se trata de um caso isolado e que condenações generalizadas não têm cabimento." De forma geral, porém, o clima na cidade se tornou "mais áspero e repulsivo".

Freiburg
Policiais patrulham parque de Freiburg, onde muitas mulheres agora têm medo de sair para fazer joggingFoto: picture-alliance/dpa/W. Rothermel

Contra as generalizações

E isso foi percebido por uma iniciativa dos estudantes de Freiburg em prol dos refugiados. A família de Maria L. pediu, no obituário dela, doações para o projeto. Desde então, a iniciativa vem sofrendo com um shitstorm. O prefeito da cidade, Dieter Salomon, tentou acalmar os ânimos.

"O fato de o suposto criminoso ser um jovem proveniente do Afeganistão é, claro, água no moinho daqueles que 'sempre souberam' que os refugiados são pessoas más. Mas eu peço que, por favor, diferenciem uma coisa da outra, e acredito que os cidadãos de Freiburg saberão fazê-lo e entender que temos aqui o caso de alguém que cometeu um crime terrível, mas isso não significa que todos os outros farão o mesmo", afirma.

A maior parte dos cidadãos parece concordar com o prefeito. Na noite deste domingo (04/12), enquanto cerca de 30 pessoas atendiam a um chamado do partido de extrema direita Alternativa para a Alemanha (AfD) para participar de uma manifestação contra a "política merkeliana", cerca de 300 compareceram a uma manifestação simultânea contra a AfD. O partido, conhecido pela sua retórica anti-imigração, Anteriormente, havia afirmado que Maria L. seria uma vítima da cultura de boas-vindas da chanceler Angela Merkel.

A cultura de boas-vindas é forte em Freiburg. "Desde o início da crise de refugiados formou-se em Freiburg uma incrível e ampla rede de ajuda aos imigrantes", relata o jornalista. "Existem muitas iniciativas, especialmente no Facebook, que ajudam de maneira muito rápida e descomplicada, oferecendo desde cursos de alemão até atividades recreativas. Desde o início foi assim e continua sendo."

Freiburg
Grafite em região da praça Stühlinger, região de maior criminalidade de FreiburgFoto: picture-alliance/dpa/R. Haid

Aumento de criminalidade

O assassinato de Maria L. não é o único que deixa a cidade insegura. Algumas semanas após o crime, uma jovem de 27 anos desapareceu na localidade de Endingen, nas proximidades de Freiburg. Quatro dias depois, o corpo dela foi encontrado, e as investigações mostraram que ela foi vítima de crime sexual. O caso ainda não foi esclarecido, e nada indica que haja uma relação com a morte de Maria L. Mas muitas mulheres se sentem ameaçadas e têm medo de fazer jogging ou vão ao cinema apenas em grupo.

"Este sentimento de insegurança surgiu já há algum tempo", diz Maucher. Na praça Stühlinger, a oeste do centro da cidade, traficantes da Gâmbia vendem drogas. "A polícia sabe desse situação, mas não consegue resolver o problema. Essa área está se tornando um local onde as pessoas têm medo de ir, e muitos não vão mais lá", afirma. Além disso, houve um aumento no número de furtos de bolsas e carteiras. "A maior parte dos suspeitos são requerentes de asilos. E agora temos esses assassinatos. Isso tudo muda o clima da cidade."

A grande maioria das pessoas que chegaram como refugiadas a Freiburg nos últimos meses não causa problemas. E muitas também se dizem chocadas com o estupro e assassinato de Maria L. e condenam a criminalidade. Mas será que o clima receptivo e liberal de Freiburg está ameaçado por causa de um crime cometido por uma única pessoa? "Freiburg é uma cidade liberal e receptiva, e isso não se muda de uma hora para a outra", opina Maucher. "No entanto, se você tomar a internet como indicador, eu não colocaria a minha mão no fogo."