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Criminalidade

Quem matou Marielle?

16 de março de 2018

Sob pressão de ativistas, políticos e entidades nacionais e internacionais, os investigadores seguem sem dar resposta para assassinato que comoveu o Brasil. Munição usada teria sido comprada pela PF em 2006.

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Homenagem a Marielle em São Paulo: atos em várias partes do Brasil lembraram vereadora
Homenagem a Marielle em São Paulo: atos em várias partes do Brasil lembraram vereadoraFoto: Getty Images/AFP/M. Schincariol

Em plena intervenção federal, a Polícia Civil do Rio de Janeiro tenta esclarecer a morte da vereadora Marielle Franco, do Psol, e de seu motorista, Anderson Gomes, na quarta-feira (14/03). Sob pressão de ativistas, políticos e entidades nacionais e internacionais, os investigadores seguem sem resposta.

A principal hipótese analisada pela Delegacia de Homicídios do Rio é de que se tratou de uma execução premeditada, dada a ação dos criminosos. Amigos e familiares de Marielle acreditam que ela não chegou a sofrer ameaças de morte. Nenhum suspeito foi preso até então.

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O assassinato da vereadora provocou comoção e indignação em todo o Brasil. Milhares de manifestantes foram às ruas em várias cidades do país em repúdio à morte de Marielle e também como forma de reiterar o apoio a temas pelos quais ela lutava, como os direitos das mulheres e a inclusão social. A vereadora era conhecida ainda por ser crítica da violência policial.

A necessidade de dar continuidade à luta de Marielle foi enfatizada por amigas e moradoras do Complexo da Maré, onde a vereadora morava. Em entrevista à DW, elas afirmaram, porém, que o momento é também de comoção e medo: "A gente vem saindo de um lugar invisível e ganhando força na política. Parece que não adianta a gente se colocar, senão seremos mortas."

Além dos protestos da população, várias autoridades, instituições, ONGs e ativistas de direitos humanos vêm fazendo pressão por uma apuração rápida e esclarecimentos do caso.

Para a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), o assassinato de Marielle é "um crime contra toda a sociedade e ofende diretamente os valores do Estado Democrático de Direito". O órgão disse estar acompanhando o caso e "espera agilidade na apuração e punição exemplar para os envolvidos".

A morte também gerou repercussão internacional. A ONU afirmou esperar rigor na investigação e uma breve elucidação, com responsabilização pela autoria do crime. A ONG Anistia Internacional, por sua vez, também pediu uma investigação imediata e rigorosa do assassinato.

Veja o que se sabe até o momento:

Local da morte

O incidente ocorreu na rua Joaquim Palhares, no bairro do Estácio, a 700 metros da prefeitura do Rio e a 100 metros de uma estação de metrô.

Como agiram os criminosos

Os atiradores emparelharam um carro ao lado do de Marielle, abriram fogo e fugiram rapidamente do local, sem cometer nenhum roubo. A vereadora estava no banco de trás do veículo, um Chevrolet Agile branco, acompanhada de Anderson Gomes e de uma assessora, que foi atingida por estilhaços e teve ferimentos leves.

O carro foi baleado nove vezes. De acordo com a Polícia Civil, todos os disparos foram em direção ao banco de trás, onde estava a vereadora. Ela foi alvejada com ao menos quatro tiros na cabeça, e Anderson Gomes foi atingido por três disparos na lateral das costas.

Mais de um veículo envolvido

A polícia investiga ainda a participação de outros dois veículos, que teriam dado cobertura aos atiradores. Um dos carros foi visto durante duas horas nos arredores da Casa das Pretas, na Lapa, onde Marielle participava do debate, e mais tarde seguiu o carro da vereadora. A placa foi identificada como sendo de Nova Iguaçu, município na Baixada Fluminense.

Segundo imagens de câmeras de segurança, dois homens estavam dentro do veículo e falavam no celular. Os investigadores coletam dados com as operadoras de telefonia para tentar identificar os autores das chamadas, bem como as pessoas com quem eles conversavam.

De acordo com a polícia, esse veículo teria trocado sinais de farol com um terceiro carro no momento da saída de Marielle do local. Ela e o motorista foram mortos minutos mais tarde, a quatro quilômetros dali.

Neste domingo (18/03), a Polícia Civil de Minas Gerais anunciou que apreendeu na madrugada um carro que pode ter isso usado por criminosos no assassinato da vereadora. O veículo foi aprendido no município de Ubá, na Zona da Mata. A confirmação depende ainda da realização de uma perícia.

Arma do crime

A munição utilizada pelos criminosos foi calibre 9 mm, que pode carregar submetralhadoras ou pistolas. Essa munição pode ser adquirida apenas por forças de segurança, colecionadores e atiradores esportivos. As balas de calibre 9 mm podem ser compradas mais facilmente no Paraguai, de onde são contrabandeadas para o Brasil e vendidas no mercado negro.

Rio reage à morte de vereadora

Segundo informações obtidas pela Rede Globo, a munição usada no crime é de lotes vendidos pela empresa CBC para a Polícia Federal de Brasília em dezembro de 2006. Uma perícia da Divisão de Homicídios indica que o lote é original, ou seja, a munição não teria sido recarregada.

O lote é o mesmo usado em uma chacina em agosto de 2015 em Barueri e Osasco, na Grande São Paulo, considerada a maior da história do estado, com 17 mortos. Três policiais militares e um guarda civil foram condenados nesse caso.

Diante das novas informações, a PF instaurou um inquérito para apurar a origem das munições e as circunstâncias envolvendo as cápsulas encontradas no local onde a vereadora foi morta.

Na noite de sexta-feira, o ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann, afirmou que as munições  foram furtadas da sede dos Correios da Paraíba em 2006. Neste sábado (17/03), porém, os Correios informaram não tinham conhecimento do furto apontado pelo ministro. “Não há nenhum registro de qualquer incidente dessa natureza e que está apurando internamente as informações", disse a empresa, em nota. 

Investigações

A polícia coletou informações no local do crime durante toda quinta-feira. A assessora de Marielle, cujo nome não foi divulgado por razões de segurança, prestou depoimento à polícia, que ouviu ainda outras testemunhas. O Disque Denúncia do Rio de Janeiro recebeu dez notificações sobre o caso até a noite desta quinta-feira.

A Polícia Civil acredita que Marielle foi seguida desde o momento em que saiu do evento no bairro da Lapa, num percurso de quatro quilômetros até o local onde seu carro foi alvejado.

Manifestações

Milhares de pessoas saíram às ruas de várias cidades brasileiras em atos de protesto contra a morte de Mariella e a violência. No Rio de Janeiro, uma grande multidão tomou a praça em frente à Câmara dos Vereadores. Manifestações ocorreram também em outros pontos do centro da cidade.

Em São Paulo, milhares de pessoas fecharam a Avenida Paulista num ato de repúdio ao assassinato. Protestos ocorreram também em várias capitais do país e também em Nova York e Portugal.

Reação no Parlamento Europeu

Deputados da bancada de esquerda do Parlamento Europeu condenaram o assassinato da vereadora e pediram à União Europeia (UE) que, diante do caso, suspenda as negociações do acordo comercial com o Mercosul.

Em sessão na sede do Parlamento em Estrasburgo, na França, vários eurodeputados ergueram cartazes com a frase "Marielle presente, hoje e sempre" em homenagem à política carioca.

Fake news

A morte da vereadora também resultou na disseminação de boatos e mentiras em redes sociais. Correntes e publicações apontaram sem provas e com erros grosseiros de informação que Marielle era, por exemplo, “esposa” de um traficante ou que a vereadora recebeu ajuda eleitoral da facção Comando Vermelho. Os boatos foram desmentidos por sites de checagem de dados. 

Ainda assim, uma desembargadora do Tribunal de Justiça do Rio chegou a reproduzir as mentiras em uma publicação na sua conta no Facebook. Após ser criticada, a desembargadora Marilia Castro Neves, admitiu que viu originalmente as informações do “texto de uma amiga” e que nem sequer havia ouvido falar de Marielle antes do crime.

Horas depois, foi a vez do deputado federal Alberto Fraga (DEM-DF),  um membro da “bancada da bala” da Câmara, reproduzir as mentiras em sua conta no Twitter. Após receber centenas de críticas, apagou a publicação e admitiu que havia reproduzido “fake news” que recebeu em uma corrente. 

O PSOL, partido da vereadora assassinada, disse que pretende abrir uma ação criminal contra a magistrada por calúnia e difamação.

RC/EK/ots

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