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Por que é tão fácil embarcar nas "fake news"

9 de julho de 2023

Notícias falsas se propagam seis vezes mais rápido do que verdades: uma ameaça concreta para a sociedade. Que fatores sociais e psicológicos ditam a tendência de se deixar enganar? Há um antídoto contra "fakes"?

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Menino consulta smartphone
Toda a "verdade" do mundo a partir da mídia socialFoto: Martin Bertrand/IMAGO

Quer se trate da guerra na Ucrânia, covid-19 ou questões de gênero, cresce o volume das notícias falsas em circulação na internet, sobretudo em relação a tópicos emocionais ou controversos. Às vezes é difícil distinguir entre verdade e mentira, por outras está claro o que é fato e o que é fake.

Mas não para todo mundo: alguns usuários da rede são especialmente suscetíveis a aceitar desinformação e fake news como notícias verdadeiras. Por quê?

Viés cognitivo seduz e desvia

Viés cognitivo é um termo que se vê muito nesse contexto, designando tendências do raciocínio humano de que é difícil libertar. Quando alguém "engole" notícias falsas, em geral entram em jogo suas crenças e noções preconcebidas do mundo – o que especialistas descrevem como "parcialidade" ou "viés confirmatório".

Stephan Lewandowsky, psicólogo cognitivo e autor de livros sobre o assunto, explica: "Se eu ouço algo que quero ouvir, por estar alinhado com minhas opiniões políticas, sim, aí é que eu vou acreditar mesmo."

De um modo ou de outro, todo mundo é tendencioso. Por exemplo: quem crê que a Alemaha esteja acolhendo refugiados demais estará mais inclinada/o a acreditar em notícias mostrando a pressão sobre as autoridades locais, ou que apresentem uma imagem negativa dos refugiados, em geral.

Outro viés frequente é o de confiar prematuramente na própria intuição; quando parece supérfluo, ou trabalhoso demais conferir a veracidade de uma informação antes de aceitar, comentar ou compartilhá-la. Muitos internautas só leem as manchetes, não os artigos propriamente ditos.

Os veículos de mídia The Science Post e NPR testaram esse princípio publicando manchetes enganosas, as quais os leitores só descobriram ser parte de um experimento após clicar nos links – coisa que a maioria não fez.

Indignação viraliza

"Bandwagon effect" (literalmente "efeito carro da banda") é traduzível como "efeito arrastão" ou "efeito da moda". É a tentação de sempre "ir atrás do bloco", se orientar pela opinião alheia em vez de formar uma própria. No contexto das fake news, indica a tendência de acreditar mais numa informação se muitos outros também creem.

Quando uma postagem tem muitos compartilhamentos e curtidas na rede, tende-se a confiar na inteligência coletiva – embora haja que fale antes de "instinto de rebanho". O problema é que quase todos fazem o mesmo e, como mencionado, a maioria compartilha e curte sem conhecer os detalhes do conteúdo.

A memória humana tampouco é muito confiável quando se trata de armazenar precisamente informação visual ou escrita. Há o fenômeno de "persistence of inaccuracy" (persistência da imprecisão): não é incomum alguém insistir numa informação, mesmo que ela tenha sido corrigida posteriormente – talvez através de uma checagem de fatos.

Além desses vieses cognitivos, as fake news funcionam tão bem porque os humanos são mais guiados pela emoção do que se dão conta. É justamente devido a esse aspecto emocional que uma notícia falsa se propaga seis vezes mais rápido do que uma verdadeira, aponta Lewandowsky.

"A maioria das fake news é altamente emocional, contém sentimentos negativos, tendendo a provocar indignação no receptor da mensagem. E sabe-se que as pessoas, quer queiram, quer não, se envolvem com informações ultrajantes, provocadoras, que ganham mais probabilidade de viralizar."

Mão de mulher segura carimbo com rótulo 'fake news'
Muitos disseminam notícias falsas sem pensar nas consequênciasFoto: picture alliance/blickwinkel/McPHOTO

Fator sombrio de personalidade: a caminho da psicopatia

Num estudo realizado em 2022 pela Universidade de Würzburg, na Alemanha, pediu-se que 600 participantes avaliassem a veracidade de diversas afirmações. A conclusão foi que traços de personalidade obscuros e convicções epistêmicas pós-fatuais aumentam a suscetibilidade a notícias falsas.

O autor principal, Jan Philipp Rudloff, explica: "Para aferir as convicções dos participantes relativas a conhecimento e fatos, perguntamos: você confia em sua intuição ao se confrontar com informações? Que valor dá a provas? Você acredita que algo como 'fatos independentes' sequer exista?"

Demonstrou-se que, quanto mais os participantes acreditavam na própria intuição, mais difícil lhes era distinguir entre afirmativas verdadeiras e falsas, e menos eles acreditavam na existência de fatos. Essas são convicções epistêmicas pós-fatuais.

"E aí também abordamos o 'fator sombrio de personalidade', núcleo de todos os traços de personalidade obscuros, como narcisismo ou psicopatia. Eles são denominados obscuros por estarem associados a comportamentos que não se aprovam numa sociedade."

Para aqueles dotados de um forte fator sombrio de personalidade, a própria vantagem pessoal é o mais importante. Todo o resto se torna subordinado, inclusive a verdade sob certas circunstâncias.

"Então a questão para eles não é se uma informação é verdadeira ou não, mas se os beneficia, serve a seus interesses ou lhes vale como justificativa." Segundo Rudloff, os traços de personalidade obscuros e uma compreensão problemática do conhecimento costumam estar associados e se manifestam bastante cedo na vida.

Fake news como fonte de atenção e aprovação

Joe Walther, diretor do Centro de Tecnologia de Informação e Sociedade da Califórnia, menciona outro forte impulsionador de fake news: curtir, comentar e compartilhar informação na internet seria, em primeira linha, uma forma de interação social, e os usuários "muitas vezes se envolvem na mídia social para sentir que estão participando e serem reconhecidos por isso".

"Então, se lhe envio uma história maluca – sobre como 'a ciência constatou que gente baixa é mais suscetível a notícias falsas do que os altos' –, eu mesmo duvido que seja verdade, mas acho que você vai gostar de receber essa coisa maluca, engraçada", exemplifica o especialista em comunicação.

"E acho que as pessoas usam as redes sociais para que os outros gostem delas, para conseguir atenção, ser reconhecidas, validadas." O exemplo também ilustra que internautas compartilham fake news não por terem caído no engano, mas simplesmente para se divertirem e aos outros. Ou até por não as considerarem verdadeiras.

Monitor de smartphone com diversos ícones de apps
Sede de curtidas e comentários também contribui para amortecer o senso críticoFoto: Nasir Kachroo/ZUMA Press/imago images

Autopercepção e metaconhecimento como antídoto

As razões para a crença nas notícias falsas são complexas, relacionadas, entre outros fatores, com a própria personalidade e atitude em relação ao conhecimento e aos fatos. Além disso, elas constituem uma forma atraente para interagir com outros indivíduos, e conquistar atenção e aprovação. Diversos mecanismos cognitivos também distorcem a percepção humana.

Então, como adquirir resistência às fake news? Um provável primeiro passo seria reconhecer a própria suscetibilidade a manipulação e subjetividade. Jan Rudloff é a favor de que escolares e universitários tenham mais acesso ao metaconhecimento sobre fatos e ciência.

"No fim das contas, o que se tem na ciência é um consenso, uma espécie de concordância entre o maior número possível de especialistas. Assim que se acrescentam novas informações, porém, pode mudar o que antes valia como fato ou consenso."

A complexidade do processo dá a alguns a impressão de que "elites" determinam arbitrariamente os fatos. Isso ficou evidente durante a pandemia de covid-19, quando inicialmente se afirmava que as crianças não disseminavam tanto o vírus, e aí, de repente, disseminavam, sim.

Outro recurso no combate às notícias falsas seria "prebunking", um "desmascaramento prévio", sensibilizando o público sobre a desinformação antes mesmo que ele seja exposto a ela. Por exemplo: antes de uma eleição, onde se conta com histórias falsas para manipular o eleitorado, valeria considerar uma campanha de informação pertinente.

Por último, a equipe de checagem de fatos da DW sugere cinco passos para avaliar a veracidade de notícias nas mídias:

  1. Fake news costumam apelar às emoções e instintos. Reflita por que a notícia afeta você.
  2. A origem da informação está clara? Confira se é da fonte original. Se não, seja cética/o.
  3. O indivíduo ou website que divulga a informação parece fidedigno? Olhe mais de perto.
  4. Redação sensacionalista, layout duvidoso ou erros de ortografia são razão para suspeita.
  5. Busque por mais informação sobre o tópico, compare e coteje.