Paulistas têm um alvo, mas demandas distintas
16 de março de 2015Parecia Copa do Mundo, mas algo muito mais sério estava em jogo neste domingo (15/03), quando manifestantes vestidos de verde e amarelo tomaram a Avenida Paulista.
Unidos pela insatisfação com o governo, centenas de milhares de pessoas se reuniram na principal via de São Paulo para protestar. Não havia, no entanto, uma agenda comum entre os manifestantes – ainda que a maioria quisesse a saída da presidente Dilma Rousseff e do PT do poder.
"Sou contra a corrupção e quero o impeachment, caso haja provas contra a presidente. O Collor saiu por muito menos", afirma Melchiades Freitas, de 89 anos. Apesar da forte chuva, ela garantiu que seguiria na manifestação "até o final".
De acordo com a PM, um milhão de manifestantes estiveram na Avenida Paulista – 210 mil segundo o Datafolha. Entre elas as adolescentes Nicolle Souza (17), Rebeca Fonseca (14) e Julia Albuquerque (17), que foram ao protesto acompanhadas dos pais, com os rostos pintados com as cores da bandeira.
"Queremos impeachment de todo mundo porque queremos um futuro melhor, e isso vai parar a corrupção", dizem. Indagadas sobre Michel Temer (PMDB), entretanto, as adolescentes aparentaram não conhecer o vice-presidente.
Mas nem todos os presentes eram favoráveis ao impeachment. O médico Cristiano Gomes, de 41 anos, veio de São Caetano do Sul, na região metropolitana de São Paulo, junto com 15 familiares, inclusive o filho, de 6 anos. "Vim para protestar contra a corrupção. Para ter impeachment é preciso uma base legal e ainda não há provas contra ela", afirma.
Golpe militar
Entre os cartazes e faixas na manifestação, apenas uma minoria pedia uma intervenção militar. Mas, quando indagadas sobre a possibilidade de um golpe, das 12 pessoas entrevistadas pela DW Brasil, metade não descartou a opção.
Os irmãos Cátia (32) e Carlos Eduardo Muniz (34), moradores de Penha e de São Miguel, na Zona Leste, acreditam que uma intervenção militar seria válida "em último caso".
Carlos, que é negro e trabalha como analista de sistemas, diz que não só "brancos ricos" querem o impeachment da Dilma. "Isso é mentira do PT", afirma.
Tatuados da cabeça aos pés, com alargadores, piercings e cabelos pintados de rosa e azul, os amigos Andréia Borgoni (30) e Rafael Costabile (22) concordariam com uma intervenção militar. "Agora não queremos. Mas não vai ser tão fácil tirar a Dilma como foi com o Collor. O PT não vai aceitar", diz ela.
Entretanto, havia manifestantes que chegavam a ficar ofendidos com a pergunta sobre um golpe. "É um absurdo, não tenho nem o que falar sobre isso. Eu vim aqui defender a democracia e a liberdade", respondeu Cristiano Gomes.
Pendurada na frente de dois caminhões, que estacionaram próximos à manifestação, a faixa com os dizeres "intervenção militar já" se tornou um ponto de encontro de simpatizantes da ideia. Dezenas de pessoas se revezavam para posar para fotos e fazer selfies com o cartaz ao fundo.
Os manifestantes eram atraídos para o local, na Rua da Consolação, pelas altas buzinas e pelo roncar dos motores de cerca de 60 caminhões estacionados na via. Os caminhoneiros formaram uma fila, bloqueando a rua.
Segundo Autieres de Oliveira, um dos organizadores da manifestação dos caminhoneiros, o grupo não é favorável ao impeachment e muito menos ao golpe. "Colocaram essa faixa aí na frente, mas não fomos nós", explica.
Oliveira, que participou da recente paralisação de caminhoneiros, diz que o grupo protestava contra o alto preço dos combustíveis e pedágios.
Clima festivo e panelaço
O clima de comemoração começou já dentro do metrô, a caminho do protesto. Cada vez que o trem parava em uma estação da linha verde do metrô, mais pessoas vestidas de verde e amarelo se juntavam à multidão, e eram aplaudidas com entusiasmo. Nos vagões, os manifestantes puxavam coros de "fora PT" e "eu sou brasileiro, com muito orgulho, com muito amor".
Na Avenida Paulista, muitos ambulantes vendiam cerveja e alimentos, que rapidamente se esgotavam. Os manifestantes, com os rostos pintados, cornetas, apitos e adereços nas cores da bandeira do Brasil, pareciam vestidos para assistir a um jogo da Copa do Mundo, não fossem as faixas com conteúdo político.
"Comunismo não, salve a família brasileira", se lia em um cartaz, colado na saída da estação de metrô Brigadeiro.
O protesto, que começou por volta das 14h, seguiu até o início da noite. Por volta das 19h, a Avenida Paulista havia sido liberada para o trânsito. Cerca de uma hora depois, entretanto, o protesto continuou, desta vez das varandas e janelas de bairros de classe média alta da cidade.
Em São Paulo, bairros como Itaim Bibi, Perdizes, Pinheiros, Vila Madalena, Morumbi, Vila Mariana, Higienópolis e Jardins registraram um panelaço, enquanto as declarações dos ministros da Justiça, José Eduardo Cardozo, e Miguel Rossetto (Secretaria-Geral da Presidência) eram transmitidas ao vivo pela televisão.
O governo federal foi alvo de um protesto similar na semana passada, quando a presidente fez um pronunciamento na televisão.