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Parlamento Europeu diante de sua "eleição do destino"

5 de junho de 2024

Na UE a ultradireita avança sistematicamente, o que preocupa as demais alas políticas. Meloni acena com uma grande coalizão no Parlamento. E Von der Leyen, a chefe da Comissão Europeia, não descarta uma cooperação.

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Imagem simbólica sobre eleições para Parlamento Europeu
Na União Europeia, 350 milhões de eleitores de 27 países têm direito a votoFoto: IMAGO/IlluPics

Nos últimos meses, a presidente do Parlamento Europeu, Roberta Metsola, viajou por todos os 27 Estados-membros da União Europeia com o slogan "Usa o teu voto". Em numerosas rodadas de debates em auditórios municipais, universidades e escolas, ela tentou interessar os eleitores, sobretudo jovens, pelo pleito que se realiza a cada cinco anos.

"A imagem que vocês vêm na mente são essas mais de 700 poltronas azuis. Elas vão ser distribuídas, quer vocês votem, quer não. Mas agora vocês têm a escolha, podem fazer uma diferença, podem influenciar quem vai ocupar ou não um assento", explicou a política democrata cristã maltesa a um grupo de jovens na Dinamarca.

Depois das eleições da Índia, a da UE é o segundo maior escrutínio democrático do mundo, envolvendo 350 milhões de eleitores – um empreendimento nada simples. Na última, em 2019, a presença nas urnas ficou em cerca de 50%. Desta vez, uma pesquisa de opinião recente indicou interesse popular em torno de 60%, portanto a participação poderá ser maior.

E participação será especialmente importante, nesta que políticos das mais diversas alas declaram "eleição do destino" ou "do direcionamento". Pois, do ponto de vista estatístico, o centrismo é que costuma se beneficiar de uma presença alta nas urnas.

Em diversos países-membros, inclusive a Alemanha, a campanha foi marcada pela discussão sobre segurança e defesa, em face da guerra da Rússia contra a Ucrânia. Entretanto as consultas mostram que política econômica é o tema dominante para a decisão eleitoral nos 27 Estados, na maioria dos quais a política de migração não desempenha um papel decisivo.

Em grande parte dos países-membros, ocupou muito os candidatos o previsto crescimento da ala direitista – desde eurocéticos conservadores até radicais. Num vídeo para conclamar à eleição, o chanceler federal alemão, Olaf Scholz, fez advertências sombrias.

"Alguns populistas exigem que a Alemanha saia da União Europeia. Outros veem a Rússia de [Vladimir] Putin ou a China de Xi Jinping como um modelo para a Europa. E ainda outros querem o retrocesso da UE. Que desvario destruidor! A Europa e sua unificação garantem nossa prosperidade e nosso futuro."

Premiê italiana, Giorgia Meloni, e húngaro, Viktor Orbán
Premiê italiana, Giorgia Meloni, e húngaro, Viktor Orbán: nacionalistas e populistas europeus fecham alasFoto: Geert Vanden Wijngaert/AP/picture alliance

Grande coalizão de ultradireita avança com Meloni

Na França, Itália, Holanda, Bélgica, Áustria e Hungria, os partidos de extrema direita são os primeiros na preferência do eleitorado. Na Alemanha, Polônia e Suécia, podem chegar no mínimo a um segundo ou terceiro lugar. Com cerca de 15% das intenções de voto, a em parte extremista Alternativa para a Alemanha (AfD) está em pé de igualdade com os partidos Social-Democrata (SPD), de Scholz, e Verde. Quem domina no país, porém, é a União Democrata Cristã (CDU), com 30% das nas consultas.

As projeções sugerem que o número de ultradireitistas no plenário do órgão legislativo crescerá significativamente, até 21% a 25%, mas ainda sem alcançar uma maioria decisiva. Por isso, a primeira-ministra da Itália, Giorgia Meloni, também chefe do grupo de direita Conservadores Reformistas e Europeus (ECR, na sigla em inglês) quer criar uma coalizão no Parlamento segundo o modelo italiano.

Há 18 meses a política do Irmãos da Itália (FdI) governa com uma aliança de populistas e extremistas de direita, e democratas cristãos. Sua intenção é romper a atual grande coalizão inoficial centrista do Parlamento Europeu, formada por social-democratas, liberais e democratas cristãos.

Por outro lado, há dois grupos ultradireitistas no órgão. Agora, juntamente com a populista de direita francesa Reunião Nacional (RN), de Marine Le Pen; o nacionalista húngaro Fidesz, de Viktor Orbán; o polonês Lei e Justiça (PiS) e outros, Meloni quer fundar uma grande bancada nacionalista de direita.

"Estamos às vésperas de uma eleição decisiva, pois pela primeira ela poderá dar fim às maiorias antinaturais e contraproducentes. Podemos permanecer concentradas e com os dois pés no chão. Voltemos o olhar para o horizonte", exortou Meloni em comício eleitoral na Espanha.

Presidente da Comissão Europeia Ursula von der Leyen fala no Parlamento Europeu
Presidente da Comissão Europeia Ursula von der Leyen não descarta cooperação com populistas de direitaFoto: Frederick Florin/AFP via Getty Images

Democratas cristãos flertam com populistas de direita

A candidata dos democratas cristãos europeus, presidente da Comissão Europeia Ursula von der Leyen, não descarta uma futura cooperação com Meloni e companhia. Como formulou em diversos debates televisivos: o que importa não é tanto o manifesto partidário, mas se os eurodeputados estão do lado da Ucrânia e se atentam para os valores europeus.

"E ela é sem sombra de dúvida pró-europeia, é contra Putin, isso ela deixou bem claro. E é pelo Estado de direito. Se permanecer assim, vamos lhe oferecer a cooperação", anunciou, referindo-se à premiê italiana. Social-democratas, liberais, verdes e esquerdistas criticaram duramente esse novo curso da democrata cristã Von der Leyen.

Em sua décima legislatura, o Parlamento Europeu contará com 720 assentos, 15 a mais do que até então. Segundo as enquetes mais recentes, democratas cristãos e social-democratas manterão o atual peso de suas bancadas, enquanto liberais, verdes e esquerdistas devem perder representação.

Independente de que coalizões se estabelecerão após a formação das bancadas, deve-se considerar que o Parlamento sediado em Estrasburgo é apenas uma de duas câmaras legislativas equipotentes. Portanto não pode decidir sozinho, tendo que agir em conjunto com o Conselho da União Europeia, onde estão representados os governos dos 27 países.

Em contrapartida, os governos nacionais dependem da aprovação do único parlamento supranacional e eleito por voto direto do mundo. Em nenhuma outra região existe uma instituição análoga, capaz de aprovar leis para além de fronteiras nacionais.

Tradicionalmente, o pleito legislativo europeu se realiza em quatro dias. Em 2024 ele se inicia em 6 de junho na Holanda, mas a maioria dos países vota no domingo, 9 de junho. A partir de 23h00 (18h00 em Brasília) saem as primeiras avaliações garantidas sobre a distribuição dos assentos no 10º Parlamento Europeu.

Bernd Riegert
Bernd Riegert Correspondente em Bruxelas, com foco em questões sociais, história e política na União Europeia.