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"Pacote da destruição é o oposto do que é feito na UE"

8 de abril de 2022

Eurodeputada Anna Cavazzini avalia que projetos de lei em tramitação no Brasil que enfraquecem terras indígenas e incentivam grilagem devem dificultar exportações brasileiras para a Europa.

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Protesto de indígenas contra o governo Bolsonaro
Protesto de indígenas contra o governo BolsonaroFoto: Adriano Machado/REUTERS

A Câmara dos Deputados do Brasil se prepara para votar nesta semana o Projeto de Lei 191, que libera a mineração em terras indígenas. Em análise há quase dois anos, a proposta ganhou caráter de urgência com a guerra na Ucrânia.

Seus defensores alegam que é necessária diante do temor de uma falta de fertilizantes no país devido às sanções impostas contra a Rússia, um dos principais fabricantes mundiais de adubos químicos, que utilizam potássio e fosfato na composição. No entanto, críticos apontam que as maiores reservas desses minerais não estão em terras indígenas.

Para a eurodeputada alemã Anna Cavazzini, do Partido Verde, a aprovação da PL 191 e das outras quatro que ficaram conhecidas como "pacote de destruição" devem contribuir para enterrar de vez o acordo comercial entre a União Europeia (UE) e o Mercosul, além de dificultar muito a exportações brasileiras para o bloco europeu.

Anna Cavazzini
A eurodeputada Anna CavazziniFoto: Dwi Anoraganingrum/Future Image/imago images

"Esses projetos são o oposto do que está sendo feito na União Europeia", afirma Cavazzini, em entrevista à DW Brasil. "Se esse pacote de leis for aprovado, será uma catástrofe não somente para o Brasil, mas para a biodiversidade mundial e para luta contra as mudanças climáticas", avalia.

Os projetos de lei, que foram apelidados por ambientalistas de "pacote de destruição", preveem, além da mineração em terras indígenas, a alteração na demarcação destas áreas (PL 490), a flexibilização na aprovação de agrotóxicos (PL 6.299) e nas regras de licenciamento ambiental (PL 2.159), e a concessão de anistia à grilagem de terras públicas (PL 2.633 e 510).

Os projetos de lei 2.633 e 510, chamados de PL da grilagem, além das PLs 2.159 e 6.299 já foram aprovados pela Câmara dos Deputados e estão atualmente em tramitação no Senado.

Em viagem recente ao Brasil, Cavazzini se reuniu com senadores, ativistas e indígenas, além de participar de uma conferência sobre meio ambiente e direito no Senado. Em entrevista, ela falou sobre a viagem e sua avaliação do governo de Jair Bolsonaro.

DW Brasil: Qual é a sua opinião sobre os projetos de lei que ficaram conhecidos como "pacote de destruição", que incluem o projeto que pretende liberar a mineração em terras indígenas?

Anna Cavazzini: Se esse pacote de leis for aprovado, será uma catástrofe não somente para o Brasil, os indígenas e ativistas ambientais, mas para a biodiversidade mundial e para luta contra as mudanças climáticas. Esses projetos terão um efeito desastroso sobre o desmatamento.

No Brasil, levei a mensagem de que esses projetos são o oposto do que está sendo feito na União Europeia, onde estamos elaborando uma lei para proibir todas as importações vinculadas ao desmatamento. Se esses projetos forem aprovados isso terá consequências no comércio com a União Europeia.

Neste caso, quais outras reações o Brasil poderia esperar da União Europeia?

Todo país tem soberania para fazer suas leis, mas, naturalmente, muitos eurodeputados irão reagir criticamente se esses projetos forem aprovados. A princípio cada país pode fazer o que quiser, mas isso não contribuirá nas relações com a União Europeia.

Já mandamos várias cartas a nossos homólogos brasileiros. A União Europeia quer aprovar uma lei que bane importações de produtos vinculadas ao desmatamento. Se no Brasil ficar cada vez mais fácil desmatar, os produtores brasileiros terão dificuldades em estar de acordo ou em cumprir as especificações europeias. Assim haverá impactos negativos indiretamente.

Essas leis são o oposto do que a União Europeia tem feito e terão um impacto no comércio com o bloco. O acordo comercial com o Mercosul também pode ser esquecido. Embora a China tenha ultrapassado a União Europeia, a UE ainda é um grande mercado para o Brasil.

E os consumidores na Europa podem fazer algo para tentar evitar a aprovação deste pacote?

Com certeza. No passado, quando houve a explosão do desmatamento e o governo Bolsonaro tentou aprovar medidas que impulsionariam o desmatamento, diversas redes de supermercado ou investidores ameaçaram não comprar mais carne do Brasil. Assim, foi enviada uma mensagem política importante.

A divulgação sobre a situação do Brasil aqui na Europa também pode ter impactos no comércio, pois muitos dos consumidores não querem que suas compras contribuam com o desmatamento no Brasil.

Embargos e sanções podem contribuir para que políticos brasileiros, incluindo o presidente Bolsonaro, mudem de opinião sobre esses projetos ou para reduzir a destruição ambiental?

Em princípio é necessário uma política de punição e incentivo, por exemplo, recusar a ratificação do acordo comercial com o Mercosul da maneira como está, mas também oferecer cooperações para ajudar o Brasil a reduzir o desmatamento. Aqui é preciso lembrar que o Fundo Amazônia foi congelado por causa do Bolsonaro.

Sanções são muito difíceis de se implementar politicamente, mas o que haverá no futuro é essa lei que banirá automaticamente dos mercados europeus produtos vinculados ao desmatamento. Isso é de fato um embargo a determinados produtos.

Já há alguma previsão para votação desta lei no Parlamento Europeu?

Estamos negociando no momento alguns pontos. A votação no plenário deve ocorrer em setembro e, se tudo ocorrer como o planejado, ela poderá ser aprovada ainda neste ano, e entrar em vigor em breve.

Como você avalia os quatro anos do governo Bolsonaro?

De uma perspectiva de direitos humanos, indígenas e da sociedade civil, e de meio ambiente e políticas climáticas, o governo Bolsonaro é devastador. Houve muitos retrocessos, que destruíram avanços conquistados nos últimos anos. Há ainda a política adotada na pandemia que contribuiu para o trágico número imenso de mortos no Brasil. O balanço de seu governo é péssimo. Espero que os eleitores no Brasil deem a Bolsonaro uma resposta nas urnas.