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Justiça

13 de fevereiro de 2009

Condenação de jovem de 24 anos que matou a própria irmã "em defesa da honra" é alerta importante na prevenção de novos crimes do gênero, opina Ulrike Mast-Kirschning.

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Violência em nome da honra: segundo informações divulgadas pelo tribunal de Hamburgo, a jovem Morsal, alemã de origem afegã e de 16 anos, foi submetida a quase toda a gama de atrocidades, para as quais organizações de defesa da mulher costumam alertar não só na Alemanha, mas em todo o mundo.

Morsal não era casta o suficiente, segundo os conceitos arcaicos de honra defendidos por sua família. Ela se vestia de forma ocidentalizada e costumava não ouvir os conselhos do pai. E acabou sendo severamente sancionada através da violência física e de ameaças de outras punições. Evidentes são também os sinais de que houve tentativas de enviá-la ao Afeganistão – país de sua famíia – através de um casamento forçado, a fim de ajustá-la aos preceitos morais patriarcais da família. Ela tinha 16 anos quando seu irmão mais velho a matou num estacionamento, em Hamburgo, com 23 facadas.

É usual neste tipo de crime que os homens tentem reaver a suposta honra manchada da família. Mesmo que neste caso não tenha havido nenhuma decisão coletiva da família, o tribunal de Hamburgo foi claro: Ahmad, condenado à prisão perpétua, deve responder pela morte de sua irmã, que ele, na realidade, deveria ter protegido. A família é altamente cúmplice do que aconteceu, por ter possivelmente feito do filho um executor de seus métodos de educação.

Tudo isso, inclusive o fato de o tribunal não ter aceitado a culpa parcial do crime por parte de Ahmad, é um sinal importante: primeiro para todos os criminosos em potencial, que de forma semelhante vivem em famílias patriarcais. No futuro, eles não poderão se esconder atrás dos conceitos de valores de suas famílias.

O veredicto é também um alerta importante para todas as famílias patriarcais, que precisam aprender que os preceitos de honra que estiverem aliados a um sério desrespeito aos direitos humanos, não têm lugar nesta sociedade. E também um alerta para todos os responsáveis pela integração de pessoas de origem migratória na Alemanha.

Pois desviar o olhar não solucionou o problema até agora: mais de 50 mulheres foram vítimas de crimes em defesa da honra. É difícil determinar o número exato, pois são poucos os casos que acabam nas mãos de Justiça. A organização de defesa dos direitos femininos Terres de Femmes presta consultoria a mais de 500 mulheres e adolescentes que vivem em condições semelhantes à de Morsal no país. Os funcionários da organização acreditam que essa é apenas a ponta do iceberg.

Justamente as jovens que se integram à sociedade alemã, frequentam a escola, rejeitam os preceitos de vestimenta e uso do véu muçulmano e querem escolher elas próprias seus maridos são as que correm maior perigo. Exatamente essas mulheres, que querem se livrar das situações de dependência em suas famílias patriarcais de migrantes, é que estão mais expostas a esta ameaça. Elas necessitam de um apoio imediato das escolas e dos órgãos públicos responsáveis pelos menores, além de precisarem de alojamentos especiais para mulheres em tais situações de perigo.

Também as escolas alemãs precisam debater com maior vigor o conceito da honra, a fim de proteger os garotos de crimes como esse que foi cometido em Hamburgo. São exatamente esses os jovens que poderiam achar um caminho que os tire das chamadas "sociedades paralelas" na Alemanha.

Mesmo que o código penal alemão não conheça o conceito de "morte pela honra", o tribunal de Hamburgo não deixou de dar um recado claro: a sociedade alemã não aceita um sistema patriarcal de valores, que admite a violência contra as mulheres até o seu assassinato.

Ulrike Mast-Kirschning é redatora da Deutsche Welle, especializada em questões ligadas aos direitos humanos e da mulher.