Os demais governos da União Europeia cederam o máximo possível às exigências britânicas. E, para tal, tiveram de engolir sapos. Mas foi uma decisão acertada. A economia do Reino Unido precisa da União Europeia, que, por sua vez, também precisa dos britânicos.
Eles proporcionam à Europa um peso econômico, político-financeiro, diplomático e militar, que, de outra forma, faltaria ao bloco europeu. E, sem eles, particularmente os alemães estariam bastante isolados frente aos postulantes resistentes a reformas, que estão de olho principalmente nos bilhões de Bruxelas.
O maior ponto de discórdia foi, provavelmente, a redução dos benefícios sociais para estrangeiros provenientes de países da União Europeia e que vivem no Reino Unido, um problema principalmente para alguns Estados-membros do Leste Europeu, de onde muitas pessoas emigraram para o Reino Unido a fim de encontrar trabalho.
O alegado abuso dos benefícios sociais é colocado de forma claramente exagerada pelo governo em Londres. Pois o lucro do Estado britânico com os trabalhadores estrangeiros europeus é bem maior que os benefícios que tais trabalhadores recebem de Londres.
No entanto, ficou demonstrado que também outros países têm interesse em mudanças. Por exemplo, a chanceler federal alemã, Angela Merkel, apoiou claramente a exigência britânica de que os pagamentos do salário-família a estrangeiros provenientes de Estados da UE, cujos filhos vivem nos países de origem, devem se adequar ao padrão de vida local.
O primeiro-ministro dinamarquês Anders Fogh Rasmussen declarou, finalmente, que se tratava de uma ideia sua e a chamou de "uma flor no meu jardim". Talvez seja típico do humor na UE, como também injusto, que o primeiro-ministro britânico David Cameron tenha que aguentar todas as críticas, enquanto outros se beneficiam à surdina.
Pelo lado britânico, o maior obstáculo deve estar menos em tais problemas concretos, mas num sentimento generalizado de ingerência externa. Mesmo que se afirme que hoje nenhum país é soberano. Ou que, pelo contrário, a coesão europeia é uma garantia maior de assertividade no mundo do que o isolamento. Nada resta a Cameron a não ser ter que lidar com essa forma de percepção das coisas. Agora, ele vai precisar de todo o seu talento para convencer seus conterrâneos do acordo fechado com a UE.
Até o referendo, a ser realizado em 23 de junho próximo, sobre a permanência do Reino Unido na União Europeia, vão permanecer as frentes amplas de inimigos da UE em seu próprio gabinete de governo, como também a mídia eurocética.
Mesmo um acordo tão generoso é inútil se for realizado sem o consentimento do povo britânico. O pior seria se a UE tivesse atendido às exigências do Reino Unido até os limites do desapego próprio – e, no final, os súditos da rainha votarem a favor de uma saída do bloco europeu.
Então não haveria mais controle e, eventualmente, outras nações eurocéticas também poderiam tomar a decisão de partir. Ou, ao menos, outros Estados também ameaçariam com uma saída, para igualmente impor solicitações especiais. E, no final, não restaria muito de uma "União" Europeia, no sentido estrito da palavra.
É trágico que a discussão com o Reino Unido aconteça em meio à crise de refugiados. Os cidadãos do Reino Unido – mas também os demais europeus – veem a impotência com que a UE resvala nessa crise. Muitos têm a impressão de que somente uma ação nacional corajosa pode fazer com que algo aconteça. E especialmente os britânicos têm um problema particular com a política de refugiados aberta de Angela Merkel.
Se, em alguns anos, a Alemanha conceder a alguns milhões de migrantes e refugiados a cidadania europeia, eles teriam o direito de se estabelecer também no Reino Unido. No ponto de vista britânico, isso significaria uma imigração indesejada pela porta dos fundos. Políticos do Reino Unido não cansam de reiterar que a recente vantagem dos opositores da UE nas pesquisas de opinião se deve a esse fato.
Um referendo no início do verão europeu acontece sob a impressão de novos milhares de migrantes chegando diariamente, adentrando a UE de forma incontrolável. Já por esse motivo, o resultado da consulta popular pode ser negativo para a União Europeia. Portanto, teria sido melhor marcar o referendo para mais tarde, quando a Europa – tomara – tiver um melhor controle da situação.