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Putin escorregou feio no petróleo

Ashutosh Pandey
14 de março de 2020

A retirada do presidente russo do acordo com a Opep para reduzir a produção de petróleo abalou o mercado de energia. Isso pode ser apenas o início de uma crise global em meio a uma pandemia, opina Ashutosh Pandey.

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Estação de petróleo no Tartaristão
Foto: picture-alliance/dpa/Tass/Y. Aleyev

Mais uma vez, o presidente da Rússia, Vladimir Putin, deu uma pisada na bola de dimensões históricas. Os erros mais graves que ele já cometeu, sem dúvida, foram a anexação da península da Crimeia e a guerra híbrida com a Ucrânia. Mas também vêm à mente outras fortes concorrentes: a participação na guerra da Síria, as reformas da aposentadoria em seu país e a reformulação da Constituição russa, na esperança de assegurar para si o posto de dirigente vitalício.

Na segunda semana de março, contudo, fez manchetes um novo candidato ao topo da lista: a queda dos mercados globais de petróleo e a desvalorização imediata do rublo russo. Ambos foram resultado imediato da decisão de retirar o país do assim chamado Opep+, o acordo entre as nações exportadoras para reduzir sua produção. Na Rússia, só o presidente pode tomar esse tipo de decisão, e tudo indica que Putin não poderia ter escolhido um momento pior para tal.

Este comentário não deve, em absoluto, ser mal-interpretado como um endosso ao acordo da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep). Ela é povoada por monarcas reacionários, pseudodemocracias corruptas e regimes ideológicos. A Opep é um cartel típico, simplesmente tentando inflacionar artificialmente os preços, em detrimento dos consumidores. Empresas privadas que operem assim no livre-mercado costumam ser multadas por tal comportamento.

A Rússia não recebeu exatamente aplauso no fim de 2016, ao assinar o acordo da Opep, prorrogado diversas vezes. Ainda assim, faz ainda menos sentido sabotar tal pacto após ter concordado com ele. Isso se aplica especialmente numa época em que o nervosismo dos mercados globais de matérias primas, em meio à crescente pandemia do coronavírus, pode facilmente precipitar-se em pânico total por novos fatores desestabilizadores.

No entanto é justo isso o que decidiu fazer Putin, o autonomeado garantidor da estabilidade. Agora, num momento em que a demanda global de energia registra um recorde negativo histórico devido às apreensões quanto à escala da pandemia, o presidente russo desestabiliza ainda mais o arisco mercado do petróleo ao iniciar uma guerra de preços.

A intransigente recusa russa de acatar a política proposta pela Opep de cortes de produção causou o colapso do pacto em 6 de março. Agora estão suspensos até mesmo os acordos de redução que seriam válidos por um período de três anos. Assim, tudo pode acontecer, e a partir de 1º de abril os países produtores estão livres para extrair quanto combustível queiram.

No fim das contas, a Rússia abandonou seus parceiros em pleno colapso mundial dos preços do petróleo. Isso não significa que se deva ter pena pelos membros do cartel, mas explica por que a Arábia Saudita, um dos membros-chave da Opep, reagiu com tanta brutalidade, anunciando que expandiria maciçamente sua produção a partir de 8 de março, além de oferecer enormes descontos a seus clientes – em especial aos do mercado europeu, tão importante para os produtores russos.

O anúncio causou uma queda de quase um terço dos preços da energia, resultando em o petróleo ser agora vendido à negociado dos preços de janeiro. Putin iniciou uma guerra a pleno vapor no mercado petroleiro, e a Arábia Saudita e o Iraque entraram na briga acelerando sua produção e reduzindo preços.

Seria de pensar que os Estados-membros da União Europeia estariam felicíssimos com essa guinada nos acontecimentos, já que petróleo barato é como um pacote de estímulo para as economias nacionais. No momento, contudo, os investidores em pânico estão se livrando de suas ações de numerosas firmas europeias.

Eles veem algo para que Putin parece estar cego: as possíveis consequências abrangentes da pandemia de covid-19 para os mercados globais. Além disso, reconhecem que um colapso do mercado de petróleo seria extremamente destrutivo, acarretando futura desestabilização macroeconômica – com impacto negativo sobre a economia global, fazendo empresas falirem e aumentando a probabilidade de inadimplência.

No entanto em alguns casos é exatamente isso que o Kremlin torce para acontecer. Há anos as companhias americanas de óleo de xisto betuminoso são uma pedra no sapato do Kremlin, por tornarem os EUA se tornarem um concorrente ainda mais poderoso das firmas russas. Assim, Moscou se alegraria com a queda dessas companhias, muitas das quais arrastam débitos consideráveis.

Outro efeito colateral favorável, aos olhos de Moscou, é o estresse econômico de tais rupturas sobre seu principal adversário, a Arábia Saudita. Contudo a Rússia parece não ter levado em consideração as consequências muito reais de uma recessão econômica global, em que o colapso dos concorrentes americanos endividados acabaria por abalar também os bancos que os financiam.

Não é preciso muita imaginação para prever uma reação em cadeia, jogando o mundo de volta ao mesmo ponto em que esteve durante a crise financeira global de 2008 – uma situação que agora, como naquela época, pode ter impacto desastroso para a Rússia.

O país teve uma amostra imediata desse possível destino quando o rublo despencou em reação direta ao anúncio da medida de Putin. O resultado será um pique na inflação nacional, que acabara de ser controlada, e tempos duros para a economia doméstica, fortemente dependente de importações. E também causará uma substancial perda de renda e prosperidade entre a população russa.

Assim, não é difícil imaginar que, dentro de alguns meses, a decisão de Vladimir Putin, de começar uma totalmente desnecessária crise global do petróleo em meio a uma pandemia mundial, venha a ocupar o topo da lista dos maiores erros históricos.

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