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PolíticaEslováquia

O retorno dos populistas pró-Rússia na Eslováquia

Tim Gosling
1 de outubro de 2023

Ex-premiê Robert Fico foi o vencedor das eleições na Eslováquia, país membro da Otan e da UE. Resultado eleitoral deve fortalecer campo contrário ao apoio ocidental à Ucrânia.

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Robert Fico, líder do partido eslovaco Smer-SD, em imagem de outdoor durante a campanha eleitoral de 2023 na Eslováquia.
Fico já governou a Eslováquia de 2006 a 2010 e de 2012 a 2018Foto: Aureliusz M. Pędziwol/DW

O partido populista Direção-Social Democracia (Smer-SD), do ex-primeiro-ministro Robert Fico, venceu as eleições legislativas da Eslováquia, derrotando seus rivais liberais, segundo os resultados divulgados neste domingo (01/10).

Com quase todos os votos computados, o Smer-SD de Fico obteve 23,3%, derrotando o partido liberal Eslováquia Progressista (PS), que obteve pouco menos de 18%.

Cinco outros partidos ultrapassaram a cláusula de barreira de 5% dos votos para entrar no parlamento, após uma disputa de grande visibilidade impulsionada pela improvável ressurreição política de Fico, que já governou a Eslováquia de 2006 a 2010 e de 2012 a 2018. O comparecimento foi de 68,5%, o mais alto em 20 anos.

A vitória deve provocar muitas ramificações na Europa Central e provavelmente vai testar a firmeza da unidade ocidental em relação à Ucrânia. Pró-russo declarado, Fico se opõe à ajuda à Ucrânia na guerra. Caso consiga formar uma coalizão para se manter ao poder após cinco anos de interregno, ele se comprometeu a "suspender imediatamente qualquer entrega de ajuda militar à Ucrânia".

O então primeiro-ministro eslovaco, Robert Fico (1º à esquerda), e o ministro do Interior, Robert Kalinak (2º à esquerda), apertam as mãos de membros da Força Policial da República Eslovaca em Bratislava, Eslováquia, em 20 de outubro de 2015.
Fico governou a Eslováquia durante grande parte da última década, apesar das acusações de ter transformado o país em um "estado mafioso"Foto: imago/Xinhua

Como Fico voltou ao poder na Eslováquia

Como líder do Smer-SD, nominalmente um partido de esquerda, Fico governou a Eslováquia durante grande parte da última década, apesar das acusações regulares de que ele havia transformado o país em um "estado mafioso". Depois de sua renúncia após o assassinato do jornalista Jan Kuciak, ele adotou uma roupagem de extrema direita para permanecer para tentar permanecer nos holofotes.

Ele também foi ajudado por uma série de anos caóticos que se sucederam na política eslovaca desde que o Smer-SD foi destituído do cargo. A coalizão de centro-direita que emergiu das eleições de 2020 não conseguiu lidar com a pandemia, as consequências da guerra na Ucrânia e a persistente crise de custo de vida no país. Um voto de desconfiança em dezembro de 2022 acabou condenando o atual governo de coalizão, levando à eleição antecipada deste ano.

Fico persuadiu os eslovacos de que só o Smer-SD seria capaz de governar de forma estável, apesar das acusações de corrupção e autoritarismo que marcaram seu último governo.

Sua promessa de acabar com o apoio à Ucrânia, no entanto, estão em sintonia com as pesquisas de opinião pública, que apontam que cerca de metade dos eslovacos apoia a Rússia em sua guerra de agressão contra a Ucrânia. Prometendo que "nenhuma bala" cruzará a fronteira oriental da Eslováquia, o político populista também sugeriu que pode tentar bloquear quaisquer outras sanções da União Europeia contra a Rússia.

Isso implicaria uma guinada da política externa da Eslováquia, membro da União Europeia e da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), que forneceu uma ajuda substancial a Kiev desde o início da invasão russa, em 24 de fevereiro de 2022.

O populista afirmou, ainda, que não autorizaria a detenção do presidente russo, Vladimir Putin, em obediência a um mandado de prisão do Tribunal Penal Internacional (TPI), se ele alguma vez viesse à Eslováquia.

As preocupações de que uma vitória de Smer pudesse levar ao isolamento da Eslováquia dos parceiros ocidentais e prejudicar a sua frágil democracia fizeram com que o apoio ao liberal PS aumentasse à medida que as eleições se aproximavam. As primeiras sondagens chegaram a apontar que os liberais tinham vencido, mas à medida que a contagem prosseguiu durante a noite, a margem da vitória de Fico tornou-se mais clara.

A decepção entre os liberais do país foi palpável, com muitos arrasados com o regresso de Fico.

"Fico venceu e, após 12 anos de regime criminoso e quase 200 pessoas acusadas en seu entorno, ele conseguiu convencer a maioria dos eleitores de que a sua visão da Eslováquia é melhor do que qualquer outra”, escreveu Matus Kostolny, editor-chefe do Dennik N, um jornal liberal da Eslováquia.

A única fresta de esperança para os defensores da democracia foi que o partido neonazista Republika não conseguiu ultrapassar a claúsula de barreira de 5% para entrar no parlamento.

A presidente da Eslováquia, Zuzana Caputova, fundadora do PS, concede entrevista a jornalistas.
A presidente do país, Zuzana Caputova, fundadora do PSFoto: Zuzana Gogova/Getty Images

Fico será capaz de montar uma coalizão?

A presidente do país, Zuzana Caputova, fundadora do PS, disse antes das eleições que incumbiria o vencedor de formar um novo governo, desde que ele conseguisse organizar uma maioria no parlamento de 150 cadeiras.

Embora as conversas provavelmente demorem, os resultados sugerem que Fico deverá considerar a construção de uma coalizão razoavelmente simples. O Partido Nacional Eslovaco (SNS), de direita radical, conseguiu ultrapassar a cláusula de barreira e é visto como um parceiro natural para o Smer-SD. O mesmo pode ser dito do Hlas, partido que se separou do Smer-SD em 2020.

O Hlas ficou em terceiro lugar com cerca de 15% dos votos, atribuindo-lhe o papel de fiel da balança. O Smer-SDE deverá conquistar 42 assentos no parlamento, tornando os 27 assentos que Hlas parece destinado a ocupar cruciais para a formação de qualquer governo. No entanto, o líder do Hlas, Peter Pellegrini, um antigo primeiro-ministro e protegido de Fico que tentou distanciar-se do extremismo do seu antigo mentor, provavelmente fará exigências significativas.

"As negociações ainda não começaram, mas a probabilidade de a Eslováquia ter um governo Smer-Hlas-SNS é muito elevada", disse Grigorij Meseznikov, chefe do Instituto de Assuntos Públicos de Bratislava.

Esperanças de moderação

Ainda há esperança de que o pró-europeu Pellegrini, do Hlas, possa ajudar a moderar a política no provável próximo governo. A promessa de Fico de suspender o apoio à Ucrânia assustou alguns parceiros ocidentais. O líder do PS, Michal Simecka, também manifestou preocupação de que um governo liderado por Fico possa isolar a Eslováquia dentro da UE, de forma semelhante a um de seus vizinhos, a Hungria, comandada pelo ultranacionalista pró-Rússia Viktor Orbán.

Fico também ameaçou expurgar a polícia e o sistema judiciário da Eslováquia, que passou os últimos três anos tentando desmantelar as redes de corrupção que floresceram durante seu mandato anterior. Alguns, no entanto, esperam que Fico possa vir a moderar alguns de seus posicionamentos, depois de ter garantido seu retorno ao cargo.

"Ele sabe que é vital que a Eslováquia tenha acesso aos fundos da UE", disse Milan Nic, membro sênior do Conselho Alemão de Relações Exteriores.

No entanto, Meseznikov adverte que, embora Pellegrini "possa tentar moderar algumas políticas, o Smer-SD e o SNS serão dominantes".