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Mãe-solo: um destino cruel no Afeganistão do Talibã

15 de agosto de 2024

Volta ao poder do Talibã em 2021 privou afegãs de praticamente qualquer direito: sair de casa, só com um parente e coberta de véu. Criar filhos sem um companheiro é uma tarefa cruel – e meninos também são vítimas.

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Mulheres de véu islâmico de costas, com loja de roupas ao fundo
Sem um 'mahram', afegãs não têm direito de sair à rua – nem cobertas da cabeça aos pésFoto: Ali Kaifee/DW

Desde que o Talibã retomou o poder no Afeganistão, em 15 de agosto de 2021, muitos ex-soldados e policiais afegãos foram executados ou desapareceram pois, para os fundamentalistas islâmicos, agentes de segurança do governo anterior são traidores.

Na época, Fouzia vivia com a família na capital Cabul. No entanto, como era policial e funcionária das forças de segurança nacionais, o marido teve medo, e não quis ter mais nada a ver com ela, que agora cria sozinha o filho de cinco anos.

"Meu marido me deixou, eu tive que me esconder com o meu filho. Há mais de um ano estamos em fuga. De meses em meses, a gente segue adiante e vai morando com parentes." Sem salário e sem poder encontrar um novo emprego, Fouzia tem que trabalhar como faxineira para sobreviver.

Assim como muitas outras afegãs em situação semelhante, ela está desesperada – e pronta a assumir grandes riscos: "Eu penso se não devia vender um rim. Queria fugir com o meu filho." Os familiares, que têm sido seu único amparo, também já não podem mais sustentá-la.

A economia do Afeganistão está no fundo do poço. Segundo a Organização das Nações Unidas, 97% da população vive na pobreza; 23,7 milhões dos 40 milhões de habitantes dependem de ajuda humanitária; e 6 milhões – um em cada sete – está até ameaçado de morrer de fome.

Mulher de véu de corpo inteiro e menina andam ao longo de muro
Isolamento, repressão, discriminação se perpetuam de geração para geração feminina no AfeganistãoFoto: AHMAD SAHEL ARMAN/AFP

Confinadas em casa, sem estudos

Entre os mais necessitados do Afeganistão, um grupo é especialmente grande: o das mães-solo, afirma a jornalista Azadah Shirzad, de Cabul. "Não há estatísticas sobre as mães-solo, mas nos últimos anos falei com pelo menos 50." Ela é uma das poucas profissionais de seu setor que ainda atuam em Cabul. Embora com cautela e em âmbito restrito, elas procuram dar uma voz às mulheres do país.

De início, os talibãs prometeram respeitar os direitos femininos no âmbito da xaria, a lei canônica islâmica. Na prática, contudo, nos três anos desde a retomada do poder introduziram em todo o país um grande número de leis e medidas políticas retirando os direitos fundamentais das mulheres e meninas, exclusivamente por causa de seu gênero. Funcionárias foram mandadas para casa, escolas femininas foram fechadas, negou-se às mulheres o acesso às universidades.

Segundo o fundo da ONU para a infância Unicef, desde então 1,5 milhão de jovens são alienadas de seu direito humano à educação, com efeitos danosos para suas chances profissionais e saúde psíquica.

Perante tal discriminação sistemática, a vida tornou-se especialmente penosa para muitas mães-solo. Elas só podem circular publicamente se acompanhadas por um mahram, um parente do sexo masculino. De resto, só saem de casa por motivos urgentes e cobertas com uma burca da cabeça aos pés. Desse modo, mães sem filhos em casa ou um irmão nas proximidades ficam basicamente confinadas.

Meninos também são vítimas da discriminação

"Em Cabul, as mães-solo ainda podem trabalhar secretamente, como cozinheira, costureira, cabeleireira ou faxineira", relata Shirzad. Mas não nos lugarejos e aldeias: "Onde todo mundo conhece todo mundo, e o Talibã tem tudo sob seu controle, nem mesmo isso é possível. Lá, elas estão submissas à própria família e parentes, têm que obedecer e se sujeitar. Muitas são maltratadas ou forçadas a ser a segunda ou terceira esposa num casamento arranjado."

Devido a sua situação financeira catastrófica, muitas são forçadas a mandar os filhos para o trabalho. Bem cedo os garotos são forçados a assumir responsabilidade e trazer dinheiro para casa: "Eles trabalham como vendedores de rua, engraxate ou nos campos, fora da cidade", conta a jornalista.

"Esses meninos são explorados e, com frequência, sofrem abuso sexual. Mas as mães não têm outra opção senão mandá-los trabalhar." Também para esses homens jovens, encarregados desde tão cedo do sustento da família, a escola e a universidade não passam de um sonho distante.