Líder da esquerda alemã critica missão do país na Síria
29 de dezembro de 2015A líder da bancada esquerdista do Bundestag (câmara baixa do Parlamento alemão), Sahra Wagenknecht, comparou o planejado envio de aviões militares alemães, para apoiar ataques aéreos na Síria, aos atentados jihadistas cometidos pelo "Estado Islâmico" (EI) em 13 de novembro, em Paris.
A partir de janeiro, seis aeronaves de reconhecimento do país se unirão a um avião de reabastecimento da Bundeswehr em Incirlik, no sudeste da Turquia, para apoio não letal nos ataques aéreos da aliança internacional, liderada pelos Estados Unidos, contra a milícia do EI.
Em entrevista divulgada pela agência de notícias alemã DPA, nesta segunda-feira (28/12), a deputada do partido A Esquerda lembrou que civis sírios morrerão, e que crescerá no Oriente Médio a "espiral de violência" cuja culpa recai sobre as potências do Ocidente, especialmente os EUA.
Da crise do euro aos bombardeios na Síria
Wagenknecht traçou paralelos entre o gerenciamento austero da crise do euro pela Alemanha e a ascensão do partido de extrema direita Frente Nacional (FN) na França. Ela acusou o presidente francês, François Hollande, de prosseguir os bombardeios contra o EI na Síria por razões políticas.
"O governo alemão fortaleceu a extrema direita na França por causa de sua política do euro, e quer fazer um favor a Hollande", disse Wagenknecht, referindo-se ao envio de seis caças de reconhecimento para ajudar a coalizão internacional que combate o EI no norte da Síria.
"Por causa de considerações domésticas alemãs e europeias, mulheres e crianças vão morrer numa chuva de bombas sobre Raqqa [autoproclamada capital do "Estado Islâmico"] e hospitais e escolas serão destruídas", acusou. "Certamente não é considerado menos crime assassinar civis inocentes na Síria com bombas do que abrir fogo em restaurantes e salas de concerto em Paris."
"Sem a guerra do Iraque, o EI não existiria. Sem o bombardeio da Líbia [por potências ocidentais em desafio à Rússia, em 2011] e a desestabilização da Síria, o EI não teria se tornado tão forte. O Ocidente, especialmente os EUA, transformou o EI no monstro que é", concluiu a parlamentar.
Segundo dados divulgados pelo Observatório Sírio para os Direitos Humanos em outubro, os ataques aéreos liderados pelas Forças Armadas americanas e iniciados em setembro de 2014 mataram desde então 3.276 combatentes do "Estado Islâmico", 147 membros da Frente al-Nusra e de outros grupos islâmicos, e 226 civis.
Oposição estuda entrar com ação judicial
Numa iniciativa independente, também nesta segunda-feira, os partidos Verde e A Esquerda advertiram que, para a utilização de militares alemães a bordo de aviões de vigilância da Otan, conhecidos como Awacs, seria necessária a autorização do Bundestag.
"Não basta a Bundeswehr declarar que soldados alemães não estão envolvidos em operações de combate. Mesmo que eles realmente estejam somente indiretamente envolvidos, mesmo assim é necessário um mandato", reforçou o especialista em assuntos de defesa dos Verdes, Tobias Lindner.
Assim, a discussão sobre o uso de soldados alemães em aviões de reconhecimento sobre a Turquia pode chegar até o Tribunal Constitucional Federal. Verdes e esquerdistas querem examinar a possibilidade de entrar com uma ação judicial, devido à baixa participação do Bundestag na tomada de decisão.
Os verdes mencionaram um precedente: em 2008, os juízes da corte suprema alemã decidiram pela obrigatoriedade de aprovação do Bundestag na utilização de soldados alemães em aviões de reconhecimento sobre a Turquia, durante a guerra do Iraque de 2003.
Um mandato parlamentar só é obrigatório quando há certa probabilidade de que os soldados possam se envolver em confronto armado. Do ponto de vista do governo federal, este não é o caso.
"Nem a milícia terrorista do EI possui forças áreas, nem é provável que o regime [do presidente sírio Bashar al] Assad lance sua Força Aérea contra a Turquia. Além disso, não há indicações concretas de que a Rússia tenha intenção de atacar a Força Aérea turca", declarou o governo federal por escrito ao Parlamento.
Wagenknecht discorda e acusa: "A declaração de que o governo federal não espera o uso de força armada é apenas fachada, e uma desculpa para evitar o envolvimento do Parlamento."
PV/dpa/epd/afp