Imprensa alemã fala em "pântano da corrupção"
11 de julho de 2005
Na página seis da sua edição desta segunda-feira (11/07), o conceituado diário Frankfurter Allgemeine Zeitung (FAZ) noticia a troca na presidência do PT, com a saída do deputado federal José Genoíno do cargo, que passa a ser ocupado pelo ministro da Educação, Tarso Genro. O artigo também destaca as negociações com o PMDB para a manutenção da governabilidade e a cessão de três ministérios ao partido: das Minas e Energia, da Saúde e das Comunicações.
O jornal ainda noticia equivocadamente a prisão do deputado federal José Nobre Guimarães, irmão de Genoíno, e refere-se a ele como "assessor". Na verdade, um assessor do deputado Guimarães foi preso no aeroporto de Congonhas, em São Paulo, com 200 mil reais em dinheiro numa valise e 100 mil dólares escondidos na cueca.
Governo corrupto, esquerda assustada
O escândalo é acompanhado há dias pela imprensa alemã. O jornal de esquerda Die Tageszeitung publicou matéria com o título "Governo de Lula é corrupto – esquerda horrorizada". O correspondente Gerhard Dilger fez a cobertura do encontro de partidos de esquerda e movimentos sociais Fórum de São Paulo.
Segundo o jornal, Lula estava "visivelmente abatido" ao afirmar que "nós seremos implacáveis com opositores e aliados que pensam que podem continuar enriquecendo com dinheiro público". O artigo afirma que os brasileiros na platéia ouviam com ceticismo tais promessas, "pois são exatamente as pessoas mais próximas de Lula que conduziram as alianças com pequenos partidos corruptos e preencheram milhares de cargos na máquina administrativa com colegas de partido". Na base do PT, cresce a indignação, diz a matéria.
Pântano da corrupção
O Frankfurter Allgemeine Zeitung comentou o escândalo no governo brasileiro com o título "Ensaio de ruptura no pântano da corrupção". "Revelações diárias ameaçam o PT e o presidente Lula", afirma a matéria assinada pelo correspondente do FAZ no Brasil, Josef Oehrlein, e que explica aos leitores alemães o escândalo do mensalão. "Continua incerto quão a fundo o presidente Lula estava informado sobre os acontecimentos", comenta o jornalista.
Também no Süddeutsche Zeitung, importante diário de Munique, o escândalo brasileiro mereceu destaque. O jornal afirma que "cada vez mais colegas de partido do presidente brasileiro Lula afundam no pântano da corrupção". Segundo a matéria, a saída de nomes importantes do governo Lula "mais parece uma amputação". Até o próprio Lula já espalhou que, nas atuais condições, provavelmente não se candidatará à reeleição no próximo ano".
"O PT de Lula está sendo fortemente atingido pelo escândalo", prossegue o jornal. "Nenhum outro partido era visto como mais honesto e íntegro, ninguém parecia mais qualificado para mudar a cultura política" do país, segue o diário, que lembra que os fundadores do PT, sindicalistas, estudantes e intelectuais, nutriam desde o início aversão à elite econômica e política brasileira. "Agora surge a suspeita de que, em menos de três anos de governo, o PT estabeleceu um sistema no qual o Estado e suas instituições estão a serviço do partido".
Denúncias mortais para o PT
Para o professor de Ciência Política com especialização em América Latina da Universidade de Tübingen Andreas Boeckh, "as denúncias de corrupção que derrubaram a cúpula do PT são mortais para um primeiro mandato do partido na Presidência da República. Muitos projetos de reforma que precisariam ser urgentemente implementados serão congelados".
Boeckh considera precipitadas as reivindicações de alguns adversários do presidente de que ele renuncie desde já à possibilidade de concorrer a um segundo mandato. "Até agora ninguém conseguiu comprovar o envolvimento direto de Lula nos casos", lembrou.
O professor alemão declarou-se "de certa forma surpreso" com a repercussão que o escândalo tem no Brasil e no exterior. "Quem acompanhou a Constituinte de 1988 ou a votação da lei que possibilitou o segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso sabe que é normal a 'compra' de maiorias no Congresso pelos governos de ocasião. Teria sido uma surpresa se o PT fosse completamente diferente nesse aspecto. O fato é que se admitiu abertamente esse tipo de negociata, e isso foi uma quebra de tabu."
Segundo Boeckh, é muito difícil, num Congresso tão fragmentado, obter maioria confiável. "O governo sempre está diante de um dilema: ou paga um determinado preço pelas reformas ou não consegue aprovar as suas propostas, o que politicamente, a longo prazo, representa um desgaste maior. É mais barato comprar alguns votos do que suportar um eterno bloqueio da oposição. Parece cínico, mas assim tem funcionado a política no Brasil."