Imposto bancário no Chipre gera série de críticas e abala confiança na UE
18 de março de 2013De repente, ninguém tem culpa. Ninguém quer assumir a responsabilidade pelo fato de que até os pequenos investidores do Chipre sejam obrigados a pagar pelo resgate financeiro do país. Porém, Simon O'Connor, porta-voz do comissário europeu de Assuntos Econômicos e Monetários, Olli Rehn, enfatizou nesta segunda-feira (18/03): "A decisão foi tomada por unanimidade, inclusive pelo Chipre".
Seja como for, a indignação é enorme. Fala-se de quebra de confiança, fraude, violação de regras e ingerência no direito ao capital. No entanto, além da referência à aprovação unânime, a Comissão Europeia se recusa a fazer qualquer comentário.
Esse não é o caso no Parlamento Europeu. Sharon Bowles, presidente da Comissão de Assuntos Econômicos e Monetários do legislativo comunitário, ressalta que a taxa que também afeta as poupanças abaixo de 100 mil euros é designada maliciosamente como "imposto", de modo a, formalmente, não violar as normas de garantia de investimentos da União Europeia. No entanto, afirma, "isso priva os pequenos investidores da proteção que lhes foi prometida".
A lição que se tira, prossegue Bowles, é que a zona do euro, o Banco Central Europeu e o Fundo Monetário Internacional podem, de fato, suspender as regras do mercado comum. A garantia para investimentos, harmonizada em toda a União Europeia, foi criada para que os cidadãos do bloco não tivessem mais qualquer motivo para ficar transferindo seu capital de um país para outro, por sentirem-no ameaçado. Segundo a eurodeputada, agora esse princípio fundamental foi nocauteado.
Para Guy Verhofstadt, chefe da bancada liberal no Parlamento Europeu, a medida "beira um assalto à plena luz do dia". "A UE já não está perdendo suficiente confiança com medidas que não contam com o apoio dos cidadãos?", questiona.
Os dois líderes da bancada dos verdes, Daniel Cohn-Bendit e Rebecca Harms, também reagiram com crítica, exigindo que os europeus possam seguir confiando na garantia aos investimentos. Eles reivindicam que os depósitos até 100 mil euros fiquem isentos da taxa obrigatória.
Indignação interna e internacional
Já Jörg Asmussen, do diretório do BCE, defende fundamentalmente a inclusão dos proprietários de cadernetas de poupança. No entanto, ressalta, caberia ao Chipre distribuir individualmente os encargos. Assim, o próprio país pode determinar como serão taxados os pequenos depósitos e como as grandes fortunas, contanto que se chegue aos 5,8 bilhões de euros planejados.
Segundo Asmussen, portanto, os países-membros da UE não insistiram quanto aos números concretos – ou seja, taxação compulsória de 6,75% para os poupadores até 100 mil euros e, acima desse limite, 9,9%. Assim, caso haja mudanças e os pequenos investidores sejam poupados ou taxados apenas em 3%, os proprietários de reservas maiores terão que pagar proporcionalmente mais. No entanto, caso o Chipre decida modificar as porcentagens estipuladas, será necessário o aval dos ministros das Finanças europeus, antes do voto do Parlamento cipriota.
Quer as taxas sejam alteradas, quer não, os investidores russos estão entre os grandes atingidos pela medida. O presidente da Rússia, Vladimir Putin, classificou a taxação de "injusta, antiprofissional e perigosa". O primeiro-ministro Dimitri Medvedev declarou que ela "parece o confisco do dinheiro dos outros".
O ministro cipriota das Finanças, Michalis Sarris, é esperado nesta quarta-feira (20/03) em Moscou para negociações. O encontro promete não ser dos mais efusivos: dois anos atrás, a Rússia concedeu um crédito de 2,5 bilhões de euros ao Chipre, que agora deseja prolongar o prazo de devolução – e provavelmente experimentará pressão extra por parte dos russos.
Cerca de um terço dos depósitos de capital do Chipre pertence a estrangeiros, sobretudo a milionários russos, mas também a gregos que queriam colocar seu dinheiro a salvo da crise em seu país. Ao que tudo indica, agora essa segurança chegou ao fim.
Quebra de tabu perigosa
Um sentimento de insegurança também é algo que assombra muita gente em Bruxelas. É grande o medo de que as contas bancárias do Chipre venham a ser totalmente esvaziadas ou de que os bancos do país abram as portas. E a intranquilidade não deverá se ater às fronteiras nacionais. Pois, embora os ministros das Finanças da UE afirmem que o Chipre é uma exceção, o mesmo se disse a respeito do corte de dívidas dos credores privados na Grécia.
Desse modo, muitos temem que, depois dessa quebra de tabu, ninguém mais na Europa possa se sentir totalmente a salvo de investidas contra o próprio capital. O que impede que se imponha uma contribuição compulsória dos investidores privados para salvar os bancos espanhóis, por exemplo?
No que tange à Alemanha, o governo federal assegura não haver razão para temor. Entretanto, a decisão no Chipre pode ter um efeito colateral inesperado para os defensores de uma união bancária o mais estreita possível dentro da União Europeia.
Falando ao jornal Handelsblatt nesta segunda-feira, o presidente da Confederação das Caixas Econômicas Alemãs (DSGV), Georg Fahrenschon, declarou que a situação mostra "que é muito bom não haver uma garantia de capital unitária para toda a Europa". A Comissão Europeia defende a adoção de tal garantia, porém, até o momento, Berlim vem rechaçando a proposta. Essa rejeição deverá se acirrar a partir do acordo do Chipre.