Há 70 anos, a antiga República Democrática Alemã (RDA) inaugurava com orgulho a sua cidade-modelo: Eisenhüttenstadt, localizada a cerca de 120 quilômetros de Berlim, na fronteira com a Polônia, uma cidade socialista moderna planejada para abrigar os familiares e funcionários da siderúrgica que estava sendo construída na região.
O município era a "menina dos olhos" da Alemanha comunista, destinado, na década de 1950, a se tornar o centro da indústria siderúrgica do jovem país. Além de complexos residenciais com grandes aéreas verdes, a cidade abrigaria ainda escolas, hospitais, lojas e parques.
Em janeiro de 1951, foi lançada a pedra fundamental da siderúrgica e, assim, dada a largada para a construção do município, que inicialmente deveria se chamar Cidade Karl Marx. No entanto, com a morte de Josef Stalin, em 1953, o então secretário-geral do Partido Socialista Unificado (SED) Walter Ulbricht teve a "brilhante" ideia de homenagear o ditador soviético, mudando o planejado nome do município, que se tornou então Cidade Stalin (Stalinstadt).
Durante oito anos, o município carregou esse nome. Até que o próprio Ulbricht achou a escolha meio passada. Assim, Eisenhüttenstadt foi rebatizada com o nome que leva até hoje e cresceu um pouco mais com a fusão de dois vilarejos da região, incluindo o histórico Fürstenberg, fundado por volta de 1250.
A cada ano que se passava, a cidade-modelo atraia mais moradores. Em 1953, eram cerca de 2.400 habitantes, dois anos mais tarde já possuía 15 mil, chegando ao auge de 53 mil habitantes em meados da década de 1980.
Com a Reunificação da Alemanha, Eisenhüttenstadt enfrentou um verdadeiro êxodo populacional, e atualmente tem apenas cerca de 27 mil habitantes. Grande parte desta fuga se deve às mudanças econômicas enfrentadas pela região. A siderúrgica estatal foi vendida para uma empresa belga. Modernizado, o local, que chegou a ter 16 mil funcionários durante a RDA, possui atualmente apenas 3.200. Muitos jovens passaram a buscar melhores oportunidades de trabalho em outras regiões do país. Assim, a cidade foi encolhendo.
Em 2009, conheci Eisenhüttenstadt. Uma grande amiga nasceu lá. Devido ao êxodo populacional, muitos dos complexos residenciais acabaram vazios e foram demolidos. Lembro-me de passar por grandes terrenos aparentemente baldios, que antes serviram de casa para centenas. Já outros prédios sem moradores aguardavam para ser demolidos. Com a crise imobiliária em Berlim, me pergunto se era preciso destruir moradias assim? Se não havia outra opção para os prédios vazios? A cidade fica a uma hora da capital alemã de trem...
Em 2012, ela se tornou conhecida mundialmente e passou a atrair turistas de vários países, após o ator americano Tom Hanks fazer propaganda de Eisenhüttenstadt no programa Late Show com David Letterman. Em dezembro de 2011, durante uma pausa nas filmagens de Cloud Atlas em Berlim, o ator americano aproveitou para conhecer a cidade.
Como um turista normal, adquiriu um tour guiado pela cidade e, ao chegar no centro de informações turísticas, surpreendeu os funcionários do local. A guia disse que chegou a ficar sem palavras, e depois foi só elogios com o turista famoso, que se mostrou "realmente muito interessado" na história local.
Depois, no programa de Letterman, Hanks falou de um "local maravilhoso" e mostrou fotos da viagem. E o ator realmente gostou da cidade: tanto que depois da primeira visita, já voltou ao menos duas vezes a Eisenhüttenstadt. E, para quem se interessa por história e arquitetura, eu também recomendo um tour pela antiga cidade-modelo.
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Clarissa Neher é jornalista da DW Brasil e mora desde 2008 na capital alemã. Na coluna Checkpoint Berlim, escreve sobre a cidade que já não é mais tão pobre, mas continua sexy. Siga-a no Twitter.