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MigraçãoAmérica Latina

Cuba, Nicarágua, Venezuela: os efeitos do êxodo migratório

Viola Träder
28 de julho de 2024

Sob a sombra do autoritarismo, países vivem onda de emigração histórica e massiva. Como isso afeta a população que fica?

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Cubanos interceptados por agentes de imigração na fronteira dos Estados Unidos
Cubanos interceptados por agentes de imigração na fronteira dos Estados Unidos. Entre 2020 e 2023, autoridades fronteiriças afirmam ter detido mais de 645 mil delesFoto: Carl Juste/Miami Herald/TNS/Photo via Newscom/picture alliance

Desde 2018, a Venezuela assiste a uma debandada de sua população. É o segundo maior êxodo migratório do mundo: mais de 7,7 milhões de venezuelanos deixaram o país, segundo o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (Acnur).

Fenômeno semelhante é observado em países como Nicarágua e Cuba, onde o problema também adquiriu uma dimensão histórica.

Como essa perda populacional massiva afeta os que ficam?

Cuba: quinta e maior onda migratória da história?

"O êxodo cubano contemporâneo, particularmente desde 2021, quebrou todos os recordes históricos", afirma à DW Jorge Duany, diretor do Instituto de Pesquisas Cubanas da Universidade Internacional da Flórida.

Entre 2020 e 2023, o Departamento de Alfândega e Proteção de Fronteiras dos EUA (CBP, na sigla em inglês) afirma ter detido mais de 645 mil cubanos, principalmente na fronteira entre o México e os Estados Unidos.

"A esse número deve-se acrescentar os 106.757 cubanos que obtiveram o parole [permissão de residência temporária] nos Estados Unidos desde 2023", observa Duany.

A título de comparação: Cuba tem pouco mais de 11 milhões de habitantes, segundo dados reunidos pelo Banco Mundial.

"Esta é a maior onda migratória de Cuba para os Estados Unidos, tanto antes quanto depois da Revolução Cubana de 1959, sendo mais numerosa do que os Voos da Liberdade, entre 1965 e 1973, o êxodo de Mariel, em 1980, e a crise dos balseros de 1994", afirma Duany.

Cuba está perdendo população jovem

O antropólogo aponta que a população cubana encolheu pelo menos 10% desde 2020, fenômeno impulsionado pela grave crise econômica que se abateu sobre o país e pelo "crescente descontentamento com o regime".

Houve emigração em todos os setores da força de trabalho, principalmente dos níveis médios, como funcionários de escritório e vendedores, afirma Duany.

"Em 2022, 33% dos cubanos admitidos nos EUA eram profissionais e gerentes, praticamente a mesma proporção que na força de trabalho em Cuba, então não se pode falar tecnicamente de uma fuga de cérebros. Certamente, é uma emigração fundamentalmente jovem: 45% tinham entre 18 e 44 anos. A ilha está perdendo grande parte de sua população jovem e qualificada", explica.

Nicarágua: fuga de cérebros

No caso da Nicarágua, o cientista político Charles G. Ripley III, da Universidade do Estado do Arizona, pondera que faltam números exatos sobre o êxodo, mas diz que é possível falar em "uma grande fuga de cérebros" como consequência do fechamento e confisco de muitas instituições educacionais e culturais pelo regime de Daniel Ortega. "Tristemente, muitas pessoas educadas estão saindo", lamenta.

A emigração massiva tem sido a resposta à repressão governamental após a crise política de 2018. A economia fraca é outro fator decisivo.

Protestos contra o governo de Ortega em 2018
Protestos contra o governo de Ortega em 2018: desde então, opositores vem sendo duramente perseguidos Foto: Esteban Biba/imago/Agencia EFE

Tanto o grupo de direitos humanos Nicarágua Nunca Mais quanto o think-tank americano Inter-American Dialogue estimam que mais de 700 mil pessoas tenham deixado o país desde 2018. O número equivale a 10% da população nicaraguense, estimada em pouco mais de 7 milhões.

Vida no exílio sob medo e apagamento

Na Nicarágua, intelectuais e profissionais "dificilmente podem desenvolver sua carreira livremente, pois são favorecidas as pessoas afiliadas ao partido do governo", afirma o advogado Salvador Marenco, do Coletivo de Direitos Humanos Nicarágua Nunca Mais. "Os intelectuais saem por perseguição direta ou porque não podem acessar fontes formais de emprego."

Falando do México, Marenco explica à DW que o regime de Ortega até se beneficia da emigração massiva através das remessas que sustentam a combalida economia.

Ele ressalta que a vida no exílio não só priva a Nicarágua de talentos, mas também "gera uma ruptura social com nossa própria história".

"Pessoas importantes têm sido estigmatizadas e apagadas da história da Nicarágua por serem opositores ou defensores dos direitos humanos", denuncia o advogado. "Expatriados tiveram seus registros acadêmicos, de estado civil e de nascimento apagados. O impacto é enorme. É um exílio silencioso, porque as pessoas têm medo de falar, mesmo estando fora do país, por causa da repressão às suas famílias e da repressão transnacional."

Mãe e filha venezuelanas estão abraçadas e descansam durante a travessia para os Estados Unidos
Mãe e filha venezuelanas na travessia para os Estados Unidos: êxodo migratório venezuelano é o segundo maior do mundoFoto: Adrees Latif/REUTERS

Êxodo venezuelano também é principalmente de jovens

No contexto do mais recente êxodo venezuelano, com mais de 7,7 milhões de emigrantes (em um país de estimados 28,8 milhões), principalmente a população entre 25 e 49 anos abandonou o país sul-americano, apontou em 2023 a socióloga Claudia Vargas em entrevista à rádio Onda La Superestación.

O nível de preparo profissional dos venezuelanos no exterior estaria diminuindo, pois trata-se de uma população jovem que não conseguiu concluir ou iniciar seus estudos universitários.

A socióloga especializada em migração criticou sobretudo as barreiras impostas ao talento venezuelano nos principais países que os recebem, como Colômbia, Peru e Equador.

Além da fuga de cérebros na Venezuela, há uma importante fuga de força de trabalho. Por isso, Vargas defende uma política de Estado que permita aos emigrantes uma espécie de reconexão, para que possam contribuir com o país a partir do exterior.