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Como ultradireita se infiltra na cultura da juventude alemã

Silke Wünsch
30 de maio de 2024

Ideias extremistas não aparecem mais associadas apenas a homens de cabeça raspada e coturno. Seus slogans agora são entoados em festas, por jovens segurando uma taça de rosé – e, muitas vezes, no TikTok.

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Mulher jovem com panfletos, em frente de uma faixa amarela segurada por três homens onde se lê "Patrioten weichen nicht zurück"
Integrantes do movimento identitário fazem ação de rua na Alemanha; na faixa, lê-se "patriotas não recuam"Foto: Sachelle Babbar/Zumapress/picture alliance

Foi com uma música alegre que o DJ Gigi d'Agostino conquistou o topo das paradas de sucesso nos anos 2000 com L'amour toujours, um eletropop para dançar e cantar junto que não podia faltar em festas.

Mas uma paródia com letra em alemão, criada sem o consentimento do DJ, integra há cerca de um ano a trilha sonora de uma nova geração de extremistas de direita – para indignação do músico.

As palavras de ordem "fora estrangeiros" e "Alemanha para os alemães" são cantadas com a melodia da música em vídeos no TikTok, em festas de cidades pequenas e em bares da elite – como ocorreu recentemente na ilha de Sylt, no norte da Alemanha.

Jovens vestidos com roupas caras gravaram a si mesmos sem pudor cantando os slogans. Um deles parece fazer a saudação nazista com o braço, um gesto proibido na Alemanha, enquanto coloca dois dedos sobre os lábios, como se quisesse imitar o bigode de Adolf Hitler.

O vídeo viralizou, e mostrou mais uma vez que o extremismo de direita e o racismo não são propagados por pessoas estereotipadas, mas por rostos que podem ser bastante comuns.

Movimento identitário deu pontapé inicial

Os líderes do movimento identitário reconheceram isso na década de 2010. Originado na França, o movimento se espalhou também pela Alemanha e outros países europeus, como Reino Unido, Áustria, Suíça e Dinamarca, no final de 2012, sob o disfarce de um movimento juvenil moderno e moderado, que embrulhava sua ideologia de extrema direita tão habilmente que, no início, passou despercebido. O Twitter, o Facebook e o YouTube foram seus canais de distribuição, com vídeos atraentes que capturaram o zeitgeist e os gostos dos jovens.

Alguns anos depois, em 2019, o movimento identitário foi classificado pelo serviço de inteligência doméstica da Alemanha como extremista de direita, mas sua tática de explorar a cultura dos jovens já estava estabelecida em muitos espaços.

Lobo em pele de cordeiro

O partido de ultradireita Alternativa para a Alemanha (AfD) está representado no Parlamento alemão e tem um número crescente de apoiadores. Apesar de ser monitorado pelo serviço de inteligência doméstica, e de alguns de seus grupos e diretórios regionais serem classificados como extremistas de direita, o partido não está perdendo popularidade.

Ele usa meios simples para fazer as pessoas falarem. Provocar e quebrar tabus, para depois voltar atrás. Ou o método do "lobo em pele de cordeiro": parecer amigável, fingir compreensão pelo outro lado e depois atacar. A polarização também é um método comum – usando dicotomias como a população rural supostamente simples versus a elite rica das grandes cidades, "nós aqui embaixo contra vocês aí em cima".

Muitos jovens votariam na AfD

A AfD e sua ala jovem, a Junge Alternative, identificam na cultura um grande potencial para recrutar novos eleitores. A maior parte disso ocorre nas redes sociais, com o TikTok na dianteira.

Há mais de 20 milhões de usuários do TikTok na Alemanha, a maioria deles são adolescentes. É lá que os extremistas de direita divulgam suas mensagens, muito simples e em uma velocidade impressionante. Com músicas, memes, emojis e embalagens bem-humoradas.

Pessoa assiste a vídeo do TikTok no celular mostrando Maximilian Krah
O membro da AfD e eurodeputado Maximilian Krah, que recentemente disse que nem todos os membros da organização nazista SS eram criminososFoto: Guido Schiefer/IMAGO

O que torna o TikTok particularmente interessante é que os usuários não precisam procurar ativamente esse tipo de conteúdo: os vídeos de propaganda são apresentados nas suas linhas do tempo. Quanto mais curtidas, mais rapidamente eles se espalham.

Esse padrão vem funcionando há anos e está levando os futuros eleitores para os braços da extrema direita. De acordo com a pesquisa de opinião Youth in Germany, 22% dos jovens de 14 a 29 anos na Alemanha votariam na AfD.

Eles não se sentem ouvidos

Não é preciso ir muito longe para descobrir as razões. Os partidos tradicionais não conseguiram alcançar os jovens por décadas. Isso se reflete não apenas em uma política educacional defasada, mas também em decisões políticas locais, como o fechamento de centros juvenis. Os jovens muitas vezes sentem que não estão sendo ouvidos pela maioria dos partidos.

E é aí que a autoproclamada nova direita aparece em cena, fingindo compreensão e cooperação. O termo "nova direita" por si só transmite modernidade e frescor, sem se referir às suas origens: a ideia nacional-socialista que levou ao nazismo e ao assassinato de milhões de pessoas. Com uma roupagem moderna e um instinto aguçado, a nova direita está fazendo incursões nas subculturas dos jovens e aprendendo a falar a língua deles.

Batalha pela supremacia cultural

Existe um termo para essa estratégia: "metapolítica" – exercer influência social além dos programas partidários e do trabalho do governo. As pessoas são abordadas onde se sentem em casa e entre seus pares. Festivais são organizados, barracas de lanches e café são montadas, e um senso de união é criado sob o lema: nós os vemos e os entendemos.

"Com a ajuda dessa metapolítica, as ideias de extrema direita são levadas às pessoas de forma discreta", afirma Lorenz Blumenthaler, da Fundação Amadeu Antonio, à DW. A princípio, a coisa toda parece apolítica e inofensiva, diz Blumenthaler, "mas é assim que eles conseguem penetrar lentamente na mente das pessoas e plantar lá sua ideologia".

Multidão em frente ao Portão de Brandemburgo. Em primeiro plano, uma pessoa ergue placa onde se lê "kein platz für Nazis".
Extremistas também enfrentam resistência, como em diversos atos pela Alemanha no início do ano que reuniram milhares de pessoasFoto: Michael Kuenne/ZUMAPRESS/picture alliance

Com o uso direcionado de polêmicas, propaganda e desinformação em pontos sensíveis dos debates sociais, é mais fácil para a extrema direita vencer a batalha pela supremacia cultural – seja na internet, na moda e no estilo de vida, em grupos de jogos ou em festivais de cidades pequenas.

O sociólogo Felix Schilk, de Tübingen, chama esse fenômeno – seja online ou nas praças de vilarejos – de "espaço pré-político" que deve ser conquistado para se tornar politicamente ativo. Em uma entrevista à rádio Deutschlandfunk, ele disse que o objetivo é que a maioria da população "compartilhe as ideias e internalize os motivos por trás da política".

Apropriação de termos e músicas

Quando um partido como a AfD conquista um desses espaços pré-políticos, ele pode determinar o conteúdo e o discurso. E consegue fazer isso, por exemplo, quando termos originados no discurso racista ou no nacionalismo étnico se tornam aceitáveis ao serem cada vez mais usados.

O exemplo mais recente é a palavra remigração, eufemismo que a extrema direita passou a usar para descrever suas propostas de "expulsão de estrangeiros". Ou o termo Kopftuchmädchen ("garota do lenço na cabeça"), usado para discriminar jovens mulheres muçulmanas, inclusive alemãs.

Essa estratégia também recodifica termos que originalmente tinham conotações positivas, como Gutmensch (derivado de "fazer o bem") ou wokeness (atenção e cuidado com as minorias), que já foram perdidos para os discursos da extrema direita.

Algo semelhante aconteceu com a versão ilegítima da música de Gigi d'Agostino: se ela for tocada em qualquer lugar, os slogans nazistas aparecem. A cobertura da mídia torna a música ainda mais famosa – ela já foi ouvida algumas vezes e é fácil abrir a boca e cantar junto. Primeiro a portas fechadas, depois cada vez mais naturalmente, os outros também a cantam – como no elegante bar de Sylt, onde entoar os slogans racistas com uma taça de rosé na mão era "apenas" uma diversão inofensiva, como afirmaram os envolvidos, de forma pouco crível.