Centro de Arte e Mídia: museu e polo de pesquisa e documentação
16 de junho de 2013Para conduzir uma série de projetos interdisciplinares e cooperações com instituições de outros países, o Centro de Arte e Mídia (ZKM), localizado em Karlsruhe, no sudoeste alemão, congrega em sua estrutura o Museu de Arte Nova, o Museu da Mídia, o Instituto de Mídias de Imagem, o Instituto de Música e Acústica e o Instituto de Mídia, Educação e Economia.
Através de uma cooperação estreita com a Escola Superior de Design de Karlsruhe, o ZKM coloca-se como uma plataforma de encontro entre ciência e arte, aberta à experimentação e ao debate, sendo inclusive conhecido pela concessão regular de bolsas a artistas.
"Bauhaus eletrônica"
Desde sua fundação em 1989, o Centro tem como objetivo abordar a interseção entre arte e tecnologia. Chamado pelo seu diretor-fundador, Heinrich Klotz, de "Bauhaus eletrônica", em referência à escola de design de vanguarda que existiu no país entre 1919 e 1933, a ideia inicial desde o surgimento do ZKM já era congregar um espaço que fosse ao mesmo tempo museu e centro para coleções de artemídia, além de estúdio e teatro-cinema.
No decorrer de sua existência, o ZKM trouxe para o público incontáveis trabalhos de relevância para a evolução da artemídia desde os anos 1960. Ao mesmo tempo, projetos específicos realizados pela instituição voltam-se para discussões filosóficas ou debates a respeito de tendências sócio-culturais. Na última quinta-feira (13/06), por exemplo, o ZKM convidou o escritor, cientista político e crítico da globalização Antonio Negri para um debate sobre os conceitos de "público" e "bens coletivos".
Ciberespaço e games
O Museu da Mídia, parte integrante do ZKM, é dedicado exclusivamente à arte interativa, incluindo tecnologias de simulação no ciberespaço e aplicativos. O Museu confronta a artemídia com a cultura popular dos games e não teme discutir em seu espaço a respeito de produtos comerciais e produzidos em escala global. Instalações e ambientes específicos expõem as diferentes estratégias de fazer com que o observador interaja com a obra.
Entre as atuais mostras do ZKM está uma exposição sobre a Geração Beat, centrada na figura de Allen Ginsberg, que dá continuidade a uma mostra dedicada a Burroughs, realizada ali no ano de 2012.
Presença brasileira no ZKM
Na coleção permanente do ZKM, há obras dos brasileiros Eduardo Kac (Reversed Mirror), Waldemar Cordeiro (A Mulher que não é B.B., 1971) e Almir da Silva Mavignier (Sem Título, 1981), bem como uma obra conjunta de Daniela Kutschat-Hanns e Rejane Cantoni (OP_ERA: Sonic Dimension, 2005).
Em 2006, o ZKM abrigou uma ampla retrospectiva da produção de artemídia brasileira intitulada Interconnect @ between attention and immersion, com obras de artistas vencedores do hoje extinto Prêmio Sérgio Motta nos cinco anos que antecederam a mostra. A premissa que guiou a exposição na época era a de apresentar na Alemanha e, por conseguinte na Europa, um Brasil alheio aos clichês "de um exotismo colorido com carnaval, futebol, samba e crianças de rua", apresentando obras de artistas cuja produção se mostrava relevante para o cenário internacional das artes.
A proposta era resgatar trabalhos que se destacavam não somente pela questão estética, mas por questionamentos de crítica social, com conteúdos que muitas vezes geravam uma interseção entre as esferas pública e privada, a fim de refletir a respeito da imagem (e da autoimagem) numa sociedade marcada por mudanças rápidas como a brasileira.
A busca de uma (nova?) identidade através da tecnologia e da mobilidade e do excesso de informação do espaço virtual já foram, na época, alguns dos vieses abordados pela mostra dedicada à artemídia brasileira, que reuniu, entre outros, obras de Lucas Bambozzi, Gisele Beiguelman e André Parente, com curadoria de Daniela Bousso e do diretor do ZKM, Peter Weibel.
Mavignier e a "Nova Tendência"
Outro momento que marcou a "presença brasileira" na história do ZKM foi a mostra bit international, que contou com uma obra do artista brasileiro Waldemar Cordeiro (1925-1973). "Essa exposição tem também uma relação com o Brasil, porque o fundador do movimento artístico Novo Tencedcije ou Nouvelle Tendance (Nova Tendência) foi um brasileiro: Almir da Silva Mavignier, curador em 1961 de uma exposição de mesmo nome na Galeria Suvremene Umjetnosti, em Zagreb. A exposição foi o ponto de partida para o movimento artístico europeu", relata Margit Rosen, pesquisadora e curadora do ZKM. Mavignier é um pintor e artista gráfico carioca, nascido em 1925 e radicado desde os anos 1950 na Alemanha.
Em 2010, o ZKM voltou novamente seus olhos para o Brasil, com a encenação da peça de teatro-música Amazonas, em três partes.
Bense, as artes e o Brasil
No mesmo ano de 2010, foi a vez de Bense e as Artes, em homenagem aos 100 anos de nascimento do filósofo Max Bense (1910-1990). "As relações de Bense com os artistas e poetas brasileiros desempenharam neste contexto um papel decisivo", fala a curadora Rosen. Em 1959, Bense conheceu o então jovem escritor brasileiro Haroldo de Campos, membro do Grupo Noigandres, que reunia poetas concretos brasileiros. O grupo havia sido fundado em 1953 por Haroldo e Augusto de Campos e por Décio Pignatari.
A partir de então foram intensas as trocas entre Bense e Haroldo de Campos, resultando numa visita do filósofo alemão ao Brasil em 1961, quando conheceu pessoalmente, em viagem ao lado de sua mulher, Elisabeth Walther-Bense, diversos nomes do cenário artístico e literário do país. Inspirado nesta viagem, Bense escreveu o livro Brasilianische Intelligenz, lançado em 1965, além de ter assinado a curadoria de várias mostras de artistas brasileiros em Stuttgart.
A mostra no ZKM sobre Bense incluiu obras de Alfredo Volpi, Lygia Clark, Aloisio Magalhães, Bruno Giorgi, Mira Schendel, Almir da Silva Mavignier, bem como de Haroldo e Augusto de Campos e Décio Pignatari.
A hora e a vez de Flusser
Para fins de 2014 e início de 2015, o ZKM planeja uma mostra especial dedicada ao pensador e teórico de mídia Vilém Flusser (1920-1991), com curadoria de Baruch Gottlieb e Siegfried Zielinski e co-curadoria de Margit Rosen. A mostra irá abordar a obra de Flusser a partir, entre outros, do conceito de Bodenlosigkeit (literalmente falta de chão) – inclusive em referência à autobiografia do pensador publicada no Brasil sob o título Bodenlos: Uma Autobiografia –, mas passando também pela teoria da mídia e pela experiência artística na diáspora.
Judeu nascido em Praga em 1920, Flusser fugiu para o Brasil depois de uma passagem por Londres. Viveu em São Paulo entre 1940 e 1975, quando passou a morar no sul da França, tendo ali permanecido até sua morte num acidente de carro no início dos anos 1990. A mostra do ZKM deverá ressaltar o pensamento de Flusser como um movimento situado na migração e na interseção entre diversas culturas, que envolve os continentes europeu e sul-americano e transita entre práticas como a poesia, o cinema, a fotografia, a política, a religião e a filosofia.
A exposição irá apresentar artistas que dialogam com o pensamento de Flusser e aqueles com os quais o próprio pensador manteve relações diretas, além de diversos documentos provenientes do Arquivo Vilém Flusser de Berlim e uma série de publicações de sua autoria, inclusive no "formato eletrônico" – naquela época visto como inovador.