Caso de colombianos expõe dilemas migratórios da Alemanha
23 de dezembro de 2024Andrea e Tino Wohlmacher deveriam estar estourando uma garrafa de champanhe. Mas, os administradores de uma casa de repouso para 48 pacientes com demência em Wilstedt, próximo a Bremen, estão bastante ocupados pouco antes do Natal e simplesmente não têm tempo para comemorar.
Eles acabam de conquistar uma primeira pequena vitória em meio à selva burocrática alemã que envolve tudo o que diz respeito a pedidos de asilo, migração de trabalhadores qualificados e deportações.
Os dez cuidadores colombianos que trabalham em sua clínica poderão permanecer no país, por enquanto. Para isso, os colombianos entraram para programa de formação profissional de dois ou três anos de duração que os deixa inicialmente protegidos da deportação. "Um peso foi tirado de todos os nossos corações", conta Andrea Wohlmacher à DW.
A história dos dez colombianos é uma lição sobre como é difícil para a Alemanha atrair e manter trabalhadores que o país tanto necessita, e, ao mesmo tempo, separar claramente o asilo e a migração de profissionais qualificados.
Sem formação profissional, os sul-americanos pediram asilo ao chegar na Alemanha. O pedido foi negado. Dessa forma, não podiam simplesmente mudar seu status para migrantes qualificados, mesmo estando já empregados. Sem conseguir mudar de status, eles teriam de deixar a Alemanha, e a clínica onde trabalham teria de fechar as portas devido à falta de pessoal.
"Somos o exemplo típico da migração necessária, o que não se aplica apenas aos trabalhadores qualificados. Há décadas temos falta de trabalhadores na Alemanha, especialmente no setor de enfermagem", explicou Andrea Wohlmacher.
De acordo com o Conselho Alemão de Enfermagem, há atualmente uma escassez de cerca de 115 mil profissionais. Muitos hospitais, serviços assistência domiciliar e asilos dependem de funcionários estrangeiros.
Ministro da Saúde promete ajudar
Quando os seus dez funcionários foram ameaçados de deportação, os dois administradores da clínica decidiram fazer todos os esforços possíveis e levar o caso a público. Eles escreveram uma carta aberta a oito políticos, e dezenas de equipes de televisão os visitaram em Wilstedt.
O Ministro da Saúde alemão, Karl Lauterbach, recebeu pessoalmente uma petição pedindo a permanência dos dez colombianos no país. "Hoje recebi uma petição com 84 mil assinaturas defendendo a permanência de dez auxiliares de enfermagem da Colômbia. Eles cuidam de pessoas com demência. Sem profissionais estrangeiros, ficaremos sem vagas de enfermagem no futuro. Não podemos nos render à xenofobia", escreveu Lauterbach, em seu perfil no X.
O caso gerou indignação na Alemanha. Muitos se perguntam como é possível que estrangeiros bem integrados, que pagam seus impostos e se disponibilizam dia e noite para pacientes com necessidades extremas de cuidados, tenham que deixar o país? Mas, há também o outro lado da moeda: qual sinal Alemanha envia ao exterior se os requerentes de asilo rejeitados e sem formação puderem permanecer no país? A decisão final sobre o caso caberá agora a uma comissão do estado da Baixa Saxônia.
Ao receber a petição, Lauterbach, prometeu fazer tudo o que for legalmente possível para ajudar. "Se não tivéssemos tantos profissionais de enfermagem estrangeiros, não seríamos mais capazes de oferecer cuidados de enfermagem no mesmo nível na Alemanha." Ele diz que o país deve enviar um sinal claro de que "os cuidadores estrangeiros são mais do que bem-vindos aqui, por que dependemos deles e tivemos experiências muito boas com eles."
"Sem irmos a público e sem discussões com os políticos em todos os níveis, provavelmente teríamos continuado a temer as deportações em curto prazo", assegurou Andrea Wohlmacher. A chamada "tolerância de aprendizado" concedida pelas autoridades alemãs deve trazer alívio à clinica e à equipe de cuidadores. Os dez colombianos estão recebendo treinamento para se tornarem auxiliares de enfermagem, cuidadores e cozinheiros, o que afasta por ora a possibilidade de deportação.
Incentivos à migração qualificada
Joachim Stamp, que atua há quase dois anos como representante especial do governo alemão para acordos migratórios, vem mantendo conversações com autoridades na capital colombiana, Bogotá, nos últimos dias.
"Queremos reduzir a migração irregular e permitir uma melhor gestão da migração de trabalhadores", disse Stamp à DW. "Também já deixei claro publicamente na imprensa colombiana que o caminho para o mercado de trabalho alemão não passa pela lei de asilo, mas apenas pela migração ordenada de trabalhadores qualificados".
Apenas 0,4% dos colombianos que pedem asilo na Alemanha tem o pedido aceito, ou seja, um a cada 250. Apesar desse cenário, cada vez mais colombianos tentam se estabelecer na Alemanha desta forma. Em 2018, 138 colombianos pediram asilo na Alemanha, já no ano passado, foram 3.337.
Atualmente, 14 mil colombianos que vivem na Alemanha estão empregados e contribuem para a previdência social. Há também 3.500 estudantes e cerca de 500 pesquisadores.
A Alemanha pretende promover a migração qualificada regular e reduzir o número de pedidos em vão de asilo através de parcerias com países como Colômbia, Geórgia, Uzbequistão, Marrocos e Quênia, para evitar casos como o da casa de repouso com demência em Wilstedt.
"É trágico quando pessoas simpáticas e preparadas são exploradas por traficantes e orientadas erroneamente para pedir asilo. Aparentemente, muitas delas são propositalmente mal-informadas pelas estruturas do tráfico", diz Stamp. "Os colombianos que querem vir para a Alemanha devem encontrar seu caminho através do mercado de trabalho, e não dos alojamentos para refugiados."