As eleições no Brasil detiveram por enquanto a crescente tendência de erosão das democracias no Ocidente. Esse é um sinal importante vindo do quinto maior país do mundo. Apesar da campanha eleitoral brutal, dos campos adversários irreconciliáveis e das muitas tentativas de declarar de antemão a invalidade das eleições, as instituições democráticas do Brasil resistiram. Logo após o fechamento das urnas, o resultado da eleição já era conhecido. Em comparação: nas eleições de meio de mandato nos EUA, o resultado final só deve ser conhecido dias depois.
No Brasil, logo após a divulgação dos resultados, os líderes da Câmara dos Deputados, do Senado e do Supremo Tribunal Federal declararam que a eleição ocorreu de forma limpa e que não havia motivos para contestar o resultado. Os militares se comportaram de forma neutra. Ao mesmo tempo, as burocracias e os políticos de Brasília começaram tranquilamente a se preparar para a transferência de poder.
Mesmo que os radicalizados apoiadores de Bolsonaro continuem acreditando em fraude eleitoral, os políticos eleitos do campo bolsonarista não os levam tão a sério. Inúmeros apoiadores influentes do presidente derrotado, dos setores político, econômico e social – mesmo as eminências pardas evangélicas – pediram o fim dos protestos.
Mesmo que a transição de poder até 1º de janeiro de 2023 ainda possa ser acidentada, a democracia brasileira provou ser dinâmica. A guinada à direita que ocorreu na sociedade brasileira nos últimos anos agora também chegou ao Congresso e às instituições.
Material de estudo para política, Justiça e imprensa
Diferente do que pode ser observado em algumas democracias ao redor do mundo – na Europa, por exemplo – o sistema político do Brasil está se mostrando integrador. Novos protagonistas têm a chance de ganhar o controle do poder político por meio de eleições democráticas. A democracia brasileira mostra uma permeabilidade que não muitos sistemas possuem.
No entanto, essa eleição me preocupa: temo que estrategistas eleitorais da nova direita em todo o mundo olhem de perto a campanha eleitoral de 2022 no Brasil – para copiá-la no futuro. O uso das mídias sociais tanto pela equipe de campanha de Bolsonaro quanto pela de Lula atingiu um novo nível de agressividade e brutalidade, inimaginável pouco tempo atrás.
Sobretudo os 28 dias que antecederam o segundo turno mostraram um uso assustador de fake news nas mídias sociais difícil de imaginar na Europa e nos EUA. As autoridades eleitorais tentaram aplicar as lições das últimas eleições. O Judiciário agiu com mais rapidez e veemência do que até pouco atrás se esperaria. Nas últimas semanas, no entanto, mostrou-se parcialmente impotente nas reações à campanha eleitoral suja.
Todos os partidos tradicionais europeus, os órgãos judiciais relevantes e a mídia não só da Europa como também da América Latina devem estudar cuidadosamente as estratégias de campanha das últimas semanas no Brasil. É previsível que as próximas eleições também sejam brutais em outros Estados democráticos.
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Há mais de 25 anos, o jornalista Alexander Busch é correspondente de América do Sul do grupo editorial Handelsblatt (que publica o semanário Wirtschaftswoche e o diário Handelsblatt) e do jornal Neue Zürcher Zeitung. Nascido em 1963, cresceu na Venezuela e estudou economia e política em Colônia e em Buenos Aires. Busch vive e trabalha em São Paulo e Salvador. É autor de vários livros sobre o Brasil.
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