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Bossa Nova marca o novo disco do 2raumwohnung

Rodrigo Rimon

Duo berlinense abandona eletrônicos por um tempo e lança álbum acústico influenciado pela Bossa Nova. Em entrevista à DW-WORLD, eles comentam o processo de reinterpretação de suas músicas e a viagem ao Brasil.

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Novas músicas e velhas canções reformuladasFoto: presse

Enquanto o sol demora para dar as caras na Alemanha, o duo berlinense 2raumwohnung antecipa o verão com um novo álbum: acústico e melancólico. Tão melancólico como a Bossa Nova.

A cantora Inga Humpe, voz do grupo e veterana da Neue Deutsche Welle, fala em "cantar suave como uma brisa quente", embora muitas vezes o álbum melancholisch schön possa parecer frio como se o Kraftwerk interpretasse Tom Jobim.

Mas aí é que a coisa se torna interessante. Há de se perguntar por que é que o barco do 2raumwohnung ancorou em algum lugar no meio do Atlântico, antes de atracar na nossa costa. Chovia em Ipanema ou há algum detalhe da Bossa Nova que passa despercebido aos ouvidos alemães?

melancholisch schön é um álbum híbrido. Não é típico 2raumwohnung, mas são eles mesmos. Não é música brasileira, mas é como se fosse. Não tem a rigidez alemã e sua engenharia musical, mas tampouco a melodia do vento batendo na areia. Resumindo: é o inverno em Ipanema.

Após uma visita ao Brasil – com direito a namorar na areia e acabar com um revólver na cabeça –, Inga Humpe e Tommy Eckart falaram à DW-WORLD como foi se aventurar pelas pampas da bossa nova e da música brasileira em geral.

DW-WORLD: A inspiração do novo álbum foi, sem sombra de dúvida, a bossa nova. De onde surgiu a idéia?

Tommy Eckart: Na verdade, foram duas idéias ao mesmo tempo. Já faz um tempo que a gente queria fazer um álbum mais calmo. A idéia de gravar um disco de Bossa Nova ou com influência sul-americanas veio do nosso baterista, Jens Wagemann, que acabou produzindo o disco. Ele não toca só bateria, mas violão também.

Foi ele quem trouxe essa influência, pois ele está acostumado a esse tipo de música desde pequeno, tanto à percussão quanto aos acordes. No final do ano passado, a gente começou a experimentar e percebeu que nossa música ganhava uma cara completamente nova.

Pressefotos Musik 2raumwohnung neues Album melancholisch schön
Foto: presse

E por que especificamente a bossa nova? O que foi que tanto cativou vocês?

Inga Humpe: O Jens começava a tocar e a gente só escutava. Uma vez, enquanto a gente estava em turnê no verão passado, ele começou a tocar Sexy Girl e Ich und Elaine nesse estilo e funcionou. Aí a gente pensou que, já que queríamos fazer um álbum acústico, que fosse nesse estilo.

Além do mais, eu senti que esse jeito de cantar deu certo comigo, pois é bem leve e relaxante. E o português também pode soar bem duro, como o alemão ou o polonês. Essas coisas foram se acumulando. Além disso, eu não sei de ninguém que tenha gravado um álbum de Bossa Nova em alemão e a idéia de fazer algo novo também nos inspirou muito. Ficamos realmente fascinados pela idéia.

Inga, sua voz encaixa perfeitamente nessas músicas. Mesmo assim, dá para notar que você canta de uma maneira diferente do que de costume. Como foi para você essa experiência?

Inga: Isso foi muito legal, eu me diverti demais. Não foi nem um pouco difícil. Pelo contrário, essa leve alteração do fraseado, da melodia, a expressão da voz na hora de cantar, tudo isso veio, creio eu, de um profundo e inconsciente prazer de estar cantando aquelas músicas.

Como vocês se familiarizaram com a música brasileira? O que vocês escutaram para se preparar para esse disco?

Inga: Nós ouvimos muita coisa. Por exemplo, descobrimos o trabalho do Celso Fonseca.

Tommy: Os dois últimos álbuns dele são incríveis.

Inga: É um brasileiro que mora na Bélgica. E tem também a Cibele. Os dois até gravaram um dueto. É ótimo, tem um pouco da bossa nova tradicional, mas mesmo assim é diferente. Eu estou superentusiasmada com a música deles.

Eu chego a ter a impressão de que a Bossa Nova vive mais fora do Brasil do que dentro dele.

Tommy: Pode ser. Se você pensar na música que toca nos salões das favelas do Rio de Janeiro, por exemplo, a música é mais baseada em dance hall, nos sound systems. Lá você percebe que eles copiam mais as batidas eletrônicas.

Diz-se que, para fazer bossa nova, basta um violão e uma caixa de fósforos. Como foi para vocês compor em um estilo completamente diferente?

Tommy: O mais engraçado é que, no estúdio, foi tudo muito parecido. O violão é o mesmo que a gente usou nos outros álbuns. E também fizemos muita percussão. O que a gente normalmente faz com a ajuda de aparelhos eletrônicos, como o baixo e parte das batidas, excluíamos quase completamente ou usamos com muita moderação. Mas, de resto, foi muito parecido. A gente só se controlou um pouco nos eletrônicos.

Dá pra dizer que vocês quiseram deixar um pouco de lado os elementos mais marcantes do 2raumwohnung?

Tommy: Não, nós apenas não queríamos que esse se tornasse um álbum pesado. O objetivo era gravar um disco relaxante. Por isso tiramos tudo que soe duro aos ouvidos ou exerça uma pressão sobre o corpo, como graves, guitarra elétrica ou tudo que seja estimulante demais. Tentamos fazer um som leve para os ouvidos e relaxante.

Inga: Algo como uma brisa quente, bem suave. Foi nisso que eu pensei na hora de cantar. Eu nem me preocupei em cantar bem, mas com sentimento.

Regravar Sexy Girl deve ter sido superdifícil…

Inga: Sexy Girl foi a mais fácil. Gravamos uma tomada, com o microfone errado, mas saiu perfeito.

Tommy: A Inga cantou em um laptop, na verdade queríamos apenas fazer uma demo tape e acabou ficando assim.

Inga: Dá até para ouvir os cliques no fundo. Foi no meio da noite, eu já tinha tomado algumas além da conta e cantei sem me preocupar.

Leia mais na página seguinte sobre a viagem do 2raumwohnung ao Brasil e por que Inga Humpe não gravou um álbum solo.

Inga, em nossa última entrevista [veja link abaixo] você já tinha falado que gostaria de lançar um disco de Bossa Nova, mas que seria um projeto solo, não do 2raumwohnung. Foi você que convenceu os outros ou como é que isso virou um projeto conjunto?

Inga: Mesmo? Eu nem me lembro.

Tommy: Eu me lembro.

Inga: Eu forcei o Tommy (risos). Não, eu não conseguiria fazer isso sozinha, eu preciso do Tommy. Ele é tão parte disso tudo quanto eu. O Jens também ajudou muito, mas a ajuda do Tommy é essencial. Eu preciso das orelhas dele e de suas idéias. Na verdade, pra que fazer disso um álbum solo? Nós somos o 2raumwohnung e é bom quando o 2raumwohnung grava coisas novas, diferentes.

Vocês compuseram novas músicas e regravaram outras antigas. Por que vocês não interpretaram clássicos brasileiros?

Inga: Isso a gente nunca quis. A idéia não era fazer cover de um original que já é tão bom. A gente não teria coragem, nem seria capaz. O objetivo era regravar nossas músicas em um estilo que lhes desse uma nova cara. Percebemos que é preciso ficar atento para não acabar em lá-lá-lá. Muita gente incorpora elementos da música sul-americana e acaba em lá-lá-lá.

Tommy: Não queríamos que acabasse em easy-listening.

Inga: Queríamos ressaltar esse caráter melancólico, saudoso, que é realmente o elemento singular da bossa nova. Eu acho que em nenhum outro estilo musical se pode ser tão triste como na Bossa Nova.

Pressefotos Musik 2raumwohnung neues Album melancholisch schön
Foto: presse

Vocês já foram ao Brasil?

Inga: Uma vez, a Salvador.

Tommy: No Carnaval. Com tudo a que se tem direito.

Inga: Com revólver na cabeça, assalto e tudo mais. "Politzia-di-tchock" [polícia de choque].

Tommy: A gente estava namorando na praia a 300 metros do nosso hotel, talvez por isso a gente não tenha prestado muita atenção.

Inga: E não tínhamos nem um centavo…

Tommy: Tivemos que fugir, porque você não tem como sair dessa situação. O assaltante não vai guardar a arma e dizer 'ok, da próxima vez traz algum dinheiro'. Aí a gente pensou que correndo até ajudaríamos ele a sair daquela situação. Ele estava tão bêbado, a gente tinha medo que ele sem querer disparasse o gatilho.

2raumwohnung
A gravação do videoclipe foi na ilha de Maiorca, na EspanhaFoto: presse

E como foi musicalmente?

Tommy: Me lembrou a Love Parade, com caminhões que transportam os músicos. A diferença é que os carros lá são muito mais ameaçadores, com aquelas estruturas de metal. E o som é muito mais distorcido, muito mais alto.

Inga: E aqueles grupos percussivos que tocam pelas ruas...

Tommy: É, a gente viu o grupo jovem do Olodum.

Eu agradeço a vocês pela conversa.

Inga: Espera aí, antes de terminar, eu queria dizer que a gente ficou muito feliz pois nos disseram que nossos textos estão sendo usados em uma escola de alemão do Brasil. Acho que no Rio de Janeiro.

Tommy: E a gente recebe muitas cartas do Brasil. Do mundo inteiro, mas dá para dizer que o Brasil está entre as mais presentes, junto à França e à Espanha.

Inga: Talvez por causa da Deutsche Welle! (risos)