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Bolívia decide se dá quarto mandato a Morales

Diego Fernando Gonzalez pv
19 de outubro de 2019

Presidente boliviano, que chegou ao poder em 2006, busca ficar até 2025 no cargo. Seu partido deve sofrer perdas relevantes, mas, a julgar pelas pesquisas, dúvida é se ele vencerá no primeiro ou no segundo turno.

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Faixas eleitorais com foto de Evo Morales e um outro candidato, de braço erguido
Nova candidatura de Morales é controversaFoto: picture-alliance/AP Photo/J. Saenz

A Bolívia elegerá neste domingo (20/10) um novo presidente para a legislatura 2020-2025. O atual mandatário, Evo Morales, no poder desde 2006, busca uma nova reeleição. A oposição, dividida, concentra seus esforços para conseguir levar o pleito ao segundo turno.

A campanha eleitoral foi marcada por bate-bocas em torno das pesquisas de opinião pública, por setores da oposição contestando a candidatura de Morales, e o governo se apresenta como o único capaz de manter a estabilidade econômica.

As pesquisas preveem uma disputa acirrada, mas todas concordam que Morales ficará em primeiro lugar. A questão é se ele sairá vitorioso já no primeiro turno. Conforme estabelecido pela Constituição boliviana, a condição para tal é, ou ele ultrapassar os 50% dos votos, ou obter mais de 40%, com uma diferença de dez pontos percentuais para o segundo colocado.

Na opinião de Iván Velásquez, economista e coordenador da Fundação Konrad Adenauer na Bolívia, durante a campanha eleitoral "debateu-se mais sobre pesquisas do que sobre programas". Ele diz que, enquanto o partido governista Movimento para o Socialismo (MAS) enfatizou sua gestão econômica bem-sucedida nesses 13 anos, "a oposição não apresentou uma proposta sólida de programa que pudesse contrabalancear". Sua fraqueza foi "não poderem mostrar à população que são uma opção diferente".

Manifestantes bolivianos em La Paz
"O povo diz não": referendo de 2016 rejeitou a busca de Evo Morales por um quarto mandato. Mas Justiça liberouFoto: Reuters/D. Mercado

O slogan da campanha do MAS é estabilidade e prosperidade econômica. O próprio Morales ressaltou, ao vencer as eleições em 2005, que a instabilidade reinava não apenas na Bolívia, mas em outros países da região, como Equador e Argentina. Ao chegar ao poder, suas prioridades foram a estatização dos derivados de petróleo e a elaboração de uma nova Constituição. O fato de um indígena e "cocalero" (cultivador de coca) assumir a presidência e levar adiante ambas as medidas deu forma ao que o partido no poder chamou de "Revolução Democrática Cultural".

Foram tempos difíceis, em que nenhum projeto prevalecia sobre outro. "Empate catastrófico", denominou o vice-presidente Álvaro García Linera o período de 2006 a 2009. O presidente boliviano não podia pousar em algumas áreas do país, havia constantes atos de violência e até focos de rebelião armada.

Após arrumar a política, chegou a vez da economia e administração. Hoje, o governo mostra índices notáveis: queda da pobreza e da pobreza extrema (de 38% para menos de 15%), queda dos índices de desigualdade, crescimento sustentado mais que quadruplicado do Produto Interno Bruto (PIB), controle da inflação e bolivianização das poupanças.

Após três reeleições, a população boliviana foi questionada num referendo em 2016 se concordava em modificar a Constituição da Bolívia para permitir a reeleição indefinida. Morales perdeu, mas a Justiça permitiu sua candidatura e hoje ele tem sérias chances de continuar no comando do país.

No entanto, para o cientista político e professor da Universidade Católica de La Paz, Marcelo Arequipa, a ideia de que hoje Morales é apresentado como a única garantia de estabilidade também incorpora certos riscos.

"É uma mensagem que se baseia numa lógica tecnocrática do gerenciamento do poder e que não é a força simbólica de Morales. Ao apresentá-lo desta forma, não se explora o que Morales simboliza, mas o que uma boa administração pública pode significar. Serve para a conjuntura, mas não para algo de fôlego longo."

Caso as pesquisas de opinião não estejam equivocadas, e tendo em mente os 49% dos votos obtidos pelo governo em 2016, pode-se esperar um apoio ao MAS entre 40% e 45%. Nesse caso, permaneceria de longe a principal força do país.

Mas há um fator-chave para se pensar no futuro: em 2005, Morales obteve quase 54%, no referendo revocatório de 2008 recebeu 67%, nas eleições presidenciais de 2009 foram 64% e na de 2014 foram 63%. Estes percentuais também lhe deram o controle de dois terços do congresso, cenário que dificilmente se repetirá após a eleição deste domingo.

Vista aérea de multidão em manifesto noturno
Bolivianos se manifestam em Santa Cruz de la Sierra por resultado de referendo que bloqueia a reeleição de MoralesFoto: Reuters/R. Urzagasti

Dificuldades

Há várias explicações para o desgaste do partido no poder. Por um lado, a simples passagem do tempo. E a derrota no referendo de 2016 e, mais recentemente, nos momentos finais da campanha eleitoral, acontecimentos como os incêndios na Chiquitania, também contribuíram em parte para a deterioração da imagem do partido governista.

"Dizem que foi incendiada uma área do tamanho do departamento de Cochabamba", relata Iván Velásquez. Setores da opinião pública responsabilizaram o governo por endossar indiretamente estes incêndios com uma série de medidas de expansão da fronteira agrícola e pecuária.

"Sempre há capinagem e queimadas a partir de agosto, mas neste período deste ano houve mais. Cana-de-açúcar para etanol, pastagem para o gado ou soja para biodiesel – e há quem diga que também para a folha de coca", analisa o economista. No entanto, nas pesquisas, o dano eleitoral desses fatos parece marginal.

Hoje existem várias frentes que questionam o Executivo boliviano, por vezes com violência. Recentemente, houve tumultos nas cidades de Santa Cruz de la Sierra e Potosí, no âmbito do atos de campanha de Morales. Porém, as demandas de cada região são diversas e não estão relacionadas.

"A fratura histórica regional é antiga. Não se trata de ignorar Morales, mas de uma luta para ver quem governa as elites dessas regiões", explica o professor Marcelo Arequipa, em relação às tensões existentes na próspera Santa Cruz. "Em Potosí foi diferente, porque os protestos são oriundos de problemas do comitê cívico com o governo", acrescenta Velásquez. "As divergências têm a ver com promessas quebradas por privilégios, conflitos de mineração com cooperativos e sobre o lítio."

Arequipa, no entanto, tem focado não tanto no primeiro ou segundo candidato (Morales e Carlos Mesa, da Frente Revolucionária de Esquerda), mas no terceiro e quarto (o senador Óscar Ortiz, candidato da Aliança Bolívia Diz Não, e o pastor evangélico de origem coreana com um discurso de ultradireita Chi Hyun Chung).

"Parece que quem vai liderar o projeto pós-hegemônico do MAS será alguém claramente identificado com a direita", prognostica Arequipa. "A esquerda está presa ao tabu de pensar na sucessão de Morales."

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