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ConflitosCanadá

Assassinato de líder sikh provoca crise entre Canadá e Índia

15 de outubro de 2024

Polícia canadense acusa seis diplomatas indianos de envolvimento no crime e em outros "atos violentos". Índia classifica alegações como "ridículas".

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Manifestantes protestam contra morte de Hardeep Nijjar.
Assassinato do ativista sikh Hardeep Nijjar em território canandense abriu crise na diplomacia do país com a ÍndiaFoto: Ethan Cairns/The Canadian Press via AP/picture alliance

As relações entre a Índia e o Canadá, ambos membros do G20 se deterioraram ainda mais após a polícia canadense acusar formalmente seis diplomatas indianos de envolvimento no assassinato de um ativista sikh em junho de 2023. Eles foram expulsos do país na segunda-feira (14/10).

O indiano Hardeep Singh Nijjar foi assassinado em território canadense num templo sikh próximo a Vancouver. Ele era uma das vozes de um movimento separatista que propunha a criação de um país sikh independente, o Calistão, no estado de Punjab, no norte da Índia.

O primeiro-ministro canadense, Justin Trudeau, declarou nesta segunda-feira que o governo indiano cometeu um erro "ao pensar que poderia apoiar atividades criminosas em solo canadense, sejam assassinatos, extorsões ou outros atos violentos".

A investigação da Polícia Montada Real do Canadá (RCMP) identificou que os diplomatas indianos coletaram ilegalmente informações sobre cidadãos canadenses e as forneceram a organizações criminosas, afirmou o chefe de governo.

A polícia também diz ter encontrado evidências concretas de envolvimento dos diplomatas em "homicídios e crimes violentos". Eles ainda são acusados de tentar interferir nos "processos democráticos" do Canadá.

A Índia tachou as acusações de "ridículas" e, em retaliação, expulsou o alto comissário interino e cinco outros diplomatas canadenses. O Canadá não teria compartilhados as provas citadas e a intenção de Trudeau seria difamar o governo indiano para "obter ganhos políticos".

Ministra de Relações Exteriores do Canadá, Melanie Joly primeiro-ministro Justin Trudeau ao fundo.
Governo canadense diz ter provas de que membros do governo indiano participaram do crimeFoto: Blair Gable/REUTERS

Quem é Nijjar?

Nijjar foi um líder de um movimento separatista que propunha a criação de um país independente para o grupo etnorreligioso sikh. Nascido na Índia, ele migrou para o Canadá nos anos 1990 e era cidadão canadense.

Em 2020, Nijjar foi classificado como terrorista por autoridades indianas e era procurado pelo suposto envolvimento no ataque a um sacerdote hindu. Também era acusado de coordenar a milícia Khalistan Tiger Force (KTF), banida na Índia.

Protestro contra a morte do líder sikh Hardeep Singh Nijjar
Nijjar migrou para o Canadá nos anos 1990 e era uma das vozes pela criação de um Estado SikhFoto: Chris Helgren/REUTERS

Nijjar era uma das vozes que apoiava a realização de referendos não-oficiais para a criação do Calistão no estado de Punjab, onde quase 60% da população é de origem sikh. Três indianos foram presos por seu assassinato.

Movimento separatista tem origens antigas

O sikhismo foi fundado no século 15 por Guru Nanak. O movimento de independência da região de Punjab, porém, ganhou força de revolta armada nos anos 1970 e 1980, deixando um rastro de destruição, com centenas de adeptos assassinados em confrontos com o governo.

Em 1984, uma operação matou 400 separatistas que se refugiavam num templo da Índia, incluindo o líder da revolta armada, Jarnal Bhindranwale. Sua morte desencadeou uma série de tumultos anti-sikh, nos quais multidões hindus foram de casa em casa no norte da Índia, agredindo e matando praticantes do sikhismo.

Naquele mesmo ano, a então primeira-ministra indiana, Indira Gandhi, que comandou a repressão ao movimento, foi assassinada por ativistas sikhs. Separatistas também estiveram por trás da derrubada de um avião da Air India, que resultou em 331 mortes em 1985.

Bandeira amarela e azul do Calistão.
Movimento separatista é banido na Índia e alguns de seus líderes são classificados como terroristasFoto: Darryl Dyck/The Canadian Press/ZUMA press/picture alliance

Nos anos seguintes, o movimento perdeu força, mas continuou popular entre alguns sikhs de Punjab e membros da diáspora no Canadá e nos EUA. Atualmente, o primeiro-ministro da Índia, Narendra Modi, intensifica a busca por ativistas ligados ao movimento.

Diáspora espalhou movimento

Na Índia, a religião é minoritária, representando apenas 1,7% da população, ou 21 milhões, enquanto mais de 80% são seguidores do hinduísmo. A maior comunidade sikh fora da Índia fica justamente no Canadá, onde compõe 2,1% da população, concentrados sobretudo na Colúmbia Britânica e Ontário. Segundo o governo canadense, quase 772 mil praticantes do sikhismo vivem no país.

A Índia tem solicitado a países como Canadá, Austrália e Reino Unido que tomem medidas legais contra ativistas sikhs. Em 2012, um atirador invadiu um templo sikh e matou sete fiéis nos EUA. Em 2023, manifestantes arrancaram a bandeira indiana do alto comissariado do país em Londres e quebraram janelas do prédio. O mesmo aconteceu com o consulado indiano em San Francisco, EUA.

Sikhs protestam contra morte de Hardeep Nijjar
Sikhs reivindicam criação do Calistão, Estado que ocuparia o norte da Índia e seria controlado pelo grupo religiosoFoto: picture alliance / ZUMAPRESS.com

Tensões entre Canadá e Índia aumentam

O medo de Nova Délhi com relação aos grupos separatistas sikhs no Canadá tem sido ofuscado pelos fortes laços de defesa e comércio entre os dois países. Mas a tensão atingiu um novo patamar com a acusação dos canadenses.

Michael Kugelman, especialista do think thank Wilson Center, atribui a reação da Índia à forma como o Canadá fez as acusações: "Nova Délhi é extremamente sensível a qualquer crítica externa às suas políticas. Mas o Canadá não está apenas criticando a política indiana. Está expressando publicamente algumas das alegações mais sérias que um governo pode fazer." Em 2023, em resposta a alegações semelhantes feitas por Trudeau, a Índia mandou o Canadá retirar 41 de seus 62 diplomatas.

Os primeiros-ministros Narendra Modi e Justin Trudeau
Relação entre Canadá e Índia já estava estremecida em 2023, quando o primeiro-ministro canadense Justin Trudeau acusou o governo indiano de participar do assassinatoFoto: AFP

Os Estados Unidos também acusaram um alto funcionário do governo indiano de comandar um plano para assassinar outro líder separatista sikh em Nova York, em 2023. Na segunda-feira, os EUA anunciaram que um comitê indiano viajaria para Washington como parte das investigações.

Para o Ministério das Relações Exteriores do Canadá, isso é um indicativo de que a Índia está colaborando com autoridades americanas, enquanto se recusa a cooperar com as canadenses.

gq/av (AP, ots)