Artilharia pesada na reta final das eleições na Colômbia
23 de maio de 2014A paz vai perdendo importância para os colombianos, à medida que se aproxima o domingo (25/05) das eleições presidenciais. Há dois meses, o tema era o terceiro assunto mais importante da campanha. Três semanas atrás, uma pesquisa de opinião mostrou que os eleitores da Colômbia empurraram a paz para o sexto lugar no ranking de tópicos relevantes na corrida presidencial.
Outros assuntos se mostram mais urgentes a população, como os onerosos sistemas de educação e saúde, a criminalidade galopante. Muitos colombianos parecem ter se acostumado com guerra entre o Estado e as Farc.
Ainda que 63% da população não mais conte com o sucesso das negociações entre o governo e os guerrilheiros, o cessar-fogo estipulado unilateralmente pelas Farc e os rebeldes do ELN marca o pleito. Esta é a quarta tentativa de se alcançar a paz, e nunca se chegou tão perto de um resultado positivo.
Para o atual chefe de Estado, Juan Manuel Santos, que pretende ser reeleito no domingo, um sucesso das negociações seria a coroação de sua carreira política, fazendo com que seja para sempre lembrado como o presidente que conseguiu colocar fim à guerra que durou mais de 50 anos e fez 200 mil mortos.
No entanto, na capital Bogotá e em outras grandes cidades, a guerrilha, apesar de sangrenta, parece estar muito distante da realidade do cotidiano. Nos grandes centros urbanos, as preocupações diárias são outras. Por exemplo, como pagar 1,5 milhão de pesos (aproximadamente 1.740 reais) por um semestre da universidade do filho, quando o salário mensal é apenas a metade dessa soma? Ou: como bancar os caros seguros de saúde?
Risco tático
Assim, Juan Manuel Santos poderá perder a vitória que já tem como certa, pelo fato de – na visão de muitos eleitores – ter-se concentrado excessivamente no processo de paz. "Santos esperou demais para iniciar uma campanha na mídia e também para convencer a população urbana da importância da paz", avalia o analista político Ariel Ávila.
Ele destaca que a guerra contra as Farc ocorre principalmente no interior, só afetando diretamente 5% da população. Os moradores das grandes cidades pouco conhecimento tomam dos conflitos.
Os apoiadores de Santos tentam desfazer essa ideia e ainda salvar a sua quota de votos. "É errado acreditar que o conflito está distante", diz Mauricio Rodríguez, conselheiro do presidente. "O Estado gasta 5 bilhões de dólares na guerra contra as Farc, dinheiro que acaba faltando à educação e à saúde. Estamos falando de 1% e 1,5% a PIB", ressalta.
AdversárioZuluaga cresce
Com sua campanha quase monotemática, porém, Santos arrisca muito. Aquele que é praticamente seu único adversário sério na corrida presidencial, Óscar Iván Zuluaga, tenta se sobressair com uma política de linha dura.
"Após quase dois anos de negociações, ainda não há resultados concretos", alfineta o candidato do direitista Partido Centro Democrático. "Pelo contrário: as Farc seguem recrutando crianças, assassinando policiais e soldados e extorquindo dos comerciantes. Os colombianos não acreditam nesse processo de paz." O oposicionista promete que, se ganhar as eleições, vai impor condições duras para a continuação das negociações.
Por trás de Zuluaga está o ex-presidente Álvaro Uribe (2002-2010), um dos poucos na Colômbia contrários às negociações com a guerrilha – tema que causou seu desentendimento com o antigo pupilo político Santos. Agora, seu novo protegido Zuluaga mostra dureza – com visível sucesso, pois se apoia em antigos sentimentos.
"Essa é a estratégia traiçoeira do ex-presidente Uribe: instigar o ódio e pregar que a única solução para salvar o país do narcoterrorismo é a via militar", observa o analista de conflitos Juan Carlos Palou, que há anos acompanha as confrontações entre governo e guerrilheiros na Colômbia.
Artilharia pesada
As frentes governista e oposicionista são tão inconciliáveis, que a campanha eleitoral ganhou contornos de guerra suja, em sua reta final. Santos foi acusado de receber milhões dos traficantes de drogas, embora haja quaisquer provas disso. Zuluaga, por sua vez, foi flagrado em vídeo com um suposto hacker, tentando descobrir como fazer para prejudicar Santos a partir de dados espionados do serviço secreto. O candidato da oposição jura que o vídeo é uma farsa.
A artilharia pesada entre os candidatos acaba se refletindo no posicionamento do eleitorado. A mais influente revista do país, Semana, diz ser um país polarizado que irá às urnas escolher seu próximo presidente.
É bastante improvável que já haja um vencedor no primeiro turno. Para o possível segundo turno, em 15 de junho, pesquisas de opinião preveem um empate técnico entre Santos e Zuluaga. Caso o atual presidente perca as eleições, isso deverá significar o fim do processo de paz na Colômbia – mais uma vez.