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AfD gera polêmica ao criticar diversidade da seleção alemã

Andreas Sten-Ziemons
3 de julho de 2024

Ultradireita se queixa da falta de jogadores brancos na equipe, que consideram "pouco alemã" e demasiadamente "woke". Políticos de outras vertentes, porém, apoiam entusiasticamente sua seleção na Eurocopa.

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Jogadores da seleção alemã perfilados com crianças durante execução do hino da Alemanha
Seleção alemã é um espelho da sociedade, sendo tão diversificada como a maioria dos jardins de infância ou escolas do paísFoto: Silas Schueller/DeFodi/picture alliance

O ministro da Saúde da Alemanha, Karl Lauterbach, é presença constante nos jogos da seleção alemã na Eurocopa. Ele esteve no segundo jogo da primeira fase do torneio contra a Hungria, em Sttutgart; no terceiro jogo contra a Suíça, em Frankfurt, e na vitória alemã nas oitavas de final contra a Dinamarca, em Dortmund.

O político social-democrata, que ganhou notoriedade ao capitanear a Alemanha na pandemia de covid-19, costuma postar selfies durante as partidas na rede social X ao lado de outros membros do governo federal.

As imagens mostram personalidades como o chanceler federal, Olaf Scholz, e as ministras do Exterior, Annalena Baerbock, e do Interior, Nancy Faeser. As duas também costumam postar no X sobre o torneio de seleções da Europa.

Apesar de Scholz ser mais reservado nas mídias sociais, ele costuma ser perguntado em entrevistas sobre suas opiniões e expectativas em relação à seleção alemã, e acaba revelando que seu entusiasmo é maior do que seu conhecimento sobre futebol.

Tudo isso demonstra que os principais políticos alemães estão refletindo o clima que prevalece no país, de que a Eurocopa é um evento fantástico cercado por uma atmosfera incrível, e que os alemães estão satisfeitos em receber torcedores pacíficos de países como a Escócia, Holanda e outros.

Há também uma sensação de orgulho pela seleção alemã e pela própria Alemanha como país-sede. A expectativa de um novo "conto de fadas de verão", como o que tomou conta do país na Copa do Mundo de 2006, na Alemanha, já foi, em grande parte, atingida.

Os alemães estão se provando bons anfitriões, com as fan zones lotadas e as bandeiras alemãs em toda parte. Sem dúvida alguma, o desempenho da seleção alemã contribui para levar às alturas o interesse pelo torneio.

Rejeição em setores da ultradireita

Em forte contraste com o clima no país, o entusiasmo com a seleção alemã está em baixa entre muitos políticos do partido ultradireitista Alternativa para a Alemanha (AfD), particularmente popular nos estados do leste alemão.

O partido, que obteve votação expressiva nas eleições para o Parlamento Europeu, em junho, defende políticas migratórias e de asilo mais rígidas e afirma defender os valores conservadores sociais e familiares. Alguns de seus membros costumam expressar apoio à Rússia na guerra contra a Ucrânia.

Alguns dos líderes da AfD consideram a seleção alemã como sendo insuficientemente branca, pouco alemã, diversificada demais e exageradamente "woke" – termo coloquial usado para descrever uma atitude assertiva em relação a temas sociais, como a discriminação e o racismo.

O europarlamentar da AfD Maximilian Krah chamou a seleção alemã de "um esquadrão politicamente correto de mercenários" em postagem no TikTok, pouco antes do início da Eurocopa. "É o time do arco-íris, do orgulho", afirmou. "Não podemos ignorar isso."

Björn Höcke, o polêmico líder do bloco parlamentar da AfD no estado da Turíngia, expressou sua reprovação ao futebol que "exala ideologias" de diversidade, segundo afirmou ao semanário suíço Weltwoche.

Zagueiro da seleção alemã Jonathan Tah
Zagueiro da seleção alemã Jonathan Tah tem mãe alemã e pai marfinenseFoto: Revierfoto/IMAGO

Ele lembrou da equipe alemã que venceu a Copa do Mundo de 1990 na Itália e da que chegou às semifinais da edição de 2006 na própria Alemanha como "momentos de felicidade". "Hoje em dia, não consigo me identificar com a equipe nacional", disse Höcke.

Espelho da sociedade

Vários jogadores da equipe alemã deste ano possuem raízes estrangeiras. O zagueiro Jonathan Tah tem mãe alemã e pai marfinense. O lateral direito Benjamin Henrichs é filho de pai alemão e mãe ganesa. O também zagueiro Antonio Rüdiger tem pai alemão e mãe nascida em Sierra Leone.

O capitão da seleção alemã, Ilkay Gündogan, possui raízes turcas, assim como os jogadores Emre Can, e Deniz Undav, enquanto Waldemar Anton é de origem russa. O pai do atacante Leroy Sané é do Senegal, e o de Jamal Musiala, da Nigéria.

A equipe alemã é um espelho da sociedade, sendo tão diversificada como a maioria dos jardins de infância ou escolas em todo o país.

A Alemanha tem uma população de cerca de 84 milhões, com aproximadamente 25 milhões de pessoas com origem migratória. Além disso, 15% dos habitantes não possuem cidadania alemã.

Ainda assim, muitos membros e apoiadores da AfD, além de outros alemães que não são necessariamente eleitores do partido, não veem com bons olhos toda essa diversidade.

Essas pessoas enxergam com desdém e ceticismo qualquer coisa que seja estrangeira, e às vezes expressam temores quanto a supostas desvantagens econômicas e sociais decorrentes da migração excessiva. Outros, porém, são mais extremos e abertamente xenofóbicos.

Zagueiro Antonio Rüdiger comemora lance durante partida
Zagueiro Antonio Rüdiger, um dos líderes da equipe alemã, tem pai alemão e mãe nascida em Sierra LeoneFoto: Christian Charisius/dpa/picture alliance

Com efeito, as seções de comentários nas redes sociais são com frequência repletas de postagens com abusos racistas contra jogadores como Tah, Rüdiger, Sané, ou Henrichs.

Orgulho ou rejeição?

Pouco antes do início da Eurocopa, uma pesquisa gerou polêmica ao perguntar aos entrevistados se eles preferiam que mais jogadores de pele branca fizessem parte da seleção alemã. O resultado: 21% concordaram com a afirmação.

A pesquisa, realizada por um instituto de renome a pedido da emissora pública WDR e apresentada no documentário "Unidade, justiça e diversidade", concluiu que a proporção dos que apoiam a ideia de mais jogadores brancos na seleção era bastante alta entre os eleitores da AfD: 47%.

Desde então, a rejeição à seleção alemã se tornou tema recorrente de discussão entre muitos apoiadores da sigla ultradireitista.

Em um programa de debates políticos na emissora pública ZDF, Serap Güler, um político do partido conservador de centro-direita União Democrata Cristã (CDU), criticou essa postura. "Eu quase apostaria que esses autoproclamados patriotas da AfD rezam diariamente para que a seleção nacional seja eliminada", afirmou.

"Assim, eles poderão dizer 'nós avisamos, eles não são alemães verdadeiros, por isso foram eliminados'", afirmou o filho de turcos nascido na Alemanha. Dessa forma, será interessante ver como os apoiadores da AfD reagirão se a Alemanha vencer a Eurocopa.

Será que o orgulho se sobreporia ao fato de a Alemanha se tornar a melhor equipe da Europa? Ou prevaleceria a rejeição aos "estrangeiros" que possuem a "cor errada de pele" e posições políticas demasiadamente "woke", mas que teriam contribuído para a vitória?