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A delicada posição do Egito no conflito Israel-Hamas

Jennifer Holleis
9 de novembro de 2023

Cairo tem que lidar com pressão popular pró-palestinos, apelos para abrir a fronteira com Gaza e temor de que terroristas entrem junto com refugiados.

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Multidão durante protesto, com homens sobre cerca portando uma bandeira do Egito
Nos protestos pró-palestinos, os egípcios também gritaram slogans contra o atual governo no CairoFoto: MOHAMED ABD EL GHANY/REUTERS

O atual conflito entre Israel e o grupo radical islâmico Hamas em Gaza levou o Egito a uma situação delicada. A nação vizinha é o principal facilitador para a entrada de ajuda humanitária em Gaza, mas também traça uma linha vermelha quando se trata de acolher palestinos deslocados.

"O posicionamento do Cairo é cada vez mais permeado pelo alarmante e crescente número de mortes de civis, à medida que a invasão terrestre [em Gaza] prossegue, bem como pela pressão de Europa e EUA para abertura da passagem da fronteira de Rafah aos palestinos que desejam atravessá-la", disse à DW Michelle Pace, pesquisadora do think tank Chatham House, com sede em Londres, e professora da Universidade Roskilde, na Dinamarca.

O presidente egípcio, Abdel Fattah al-Sisi, deixou claro que a passagem da fronteira de Rafah – a única para Gaza não controlada por Israel – não se tornará uma entrada para os palestinos vindos de Gaza. "O Egito confirma clara e estritamente que nunca aceitará o deslocamento de qualquer palestino para o território egípcio", disse.

Sisi repetiu essa afirmação de várias maneiras desde a eclosão do conflito, que começou após o brutal ataque terrorista do Hamas contra Israel, em 7 de outubro, que deixou mortos cerca de 1.400 israelenses.

"O Egito recorda muito bem o que aconteceu em 1948, quando após a Nakba [catástrofe em árabe], os palestinos que tinham sido forçados a abandonar suas casas e povoados não foram autorizados a regressar quando a guerra terminou", disse Pace. "O Egito acredita que esse modelo pode se repetir."

Homem diante de grandes sacos enfileirados em área a céu aberto
Ajuda humanitária está se acumulando na passagem fronteiriça de Rafah, no EgitoFoto: AMR ABDALLAH DALSH/REUTERS

"No entanto, os civis em Gaza têm o direito de procurar refúgio e só eles podem decidir como e quando exercer esse direito. O Egito é obrigado a permitir a entrada de civis, se assim o desejarem", afirmou à DW Timothy E. Kaldas, vice-director do Tahrir Institute for Middle East Policy, sediado em Washington.

"Dito isto, os parceiros de Israel devem deixar bem claro que os habitantes de Gaza têm o direito de regressar a Gaza quando as hostilidades terminarem, e os líderes de Israel devem ser avisados de que impedi-los de o fazer constituiria uma limpeza étnica", acrescentou Kaldas.

Potencial ameaça à segurança

"Outro argumento egípcio contra a permissão de entrada de pessoas é que provavelmente seria impossível separar os combatentes palestinos dos refugiados civis", disse Pace. "Se os grupos jihadistas palestinos estabelecerem ligações logísticas, ideológicas e operacionais com [homólogos] baseados no Sinai, o Egito teme que eles possam tentar lançar ataques contra alvos israelenses a partir do território egípcio, convidando Israel à retaliação e perturbando as suas relações com o Egito".

Sisi também expressou esta preocupação durante uma recente entrevista coletiva no Cairo. "O Sinai se tornaria uma base para operações terroristas contra Israel, e nós, no Egito, assumiríamos a responsabilidade por isso. A paz que criamos [em 1979, quando um tratado de paz com Israel foi assinado] escaparia de nossas mãos, tudo no contexto da eliminação da causa palestina", disse.

Kenneth Roth, ex-diretor executivo da Human Rights Watch e agora professor visitante na Universidade de Princeton, nos EUA, diz que Sisi também é "particularmente solidário com as tentativas de Israel de esmagar o Hamas porque ele próprio usou uma violência terrível para esmagar a Irmandade Muçulmana, espécie de primo mais pacífico do Hamas, incluindo o massacre de 817 manifestantes em 2013 na Praça Rabaa, no Cairo".

Presidente egípcio, Abdel Fattah al-Sisi
Sisi encorajou os egípcios a protestarem pela Palestina mas depois reprimiu quem lançou críticas a seu governoFoto: Ahmad Hassan/AFP/Getty Images

Repressão aos protestos

Este último mês de conflito também teve impacto na relação entre o governo autoritário egípcio e o povo do país. "As diferenças devido às dificuldades econômicas no país, também devido ao autoritarismo, diminuíram um pouco", segundo Nathan Brown, professor de ciência política e assuntos internacionais na Universidade George Washington e atual membro do Hamburg Institute for Advanced Study (HIAS), na Alemanha. "A atenção concentrou-se, em vez disso, na proteção das fronteiras nacionais", acrescentou.

Essa diminuição do descontentamento popular é favorável a Sisi, que provavelmente será reeleito nas próximas eleições presidenciais do Egito, que são amplamente avaliadas como sendo antidemocráticas.

O financiamento internacional em troca de assistência em Gaza também poderia ajudar a resolver a crise econômica em curso no Egito. A moeda local perdeu mais de metade do seu valor desde março de 2022, e as reservas de moeda estrangeira do Egito estão quase esgotadas. O conflito em Gaza também terá impacto no turismo, um pilar da economia egípcia.

Roth duvida que o conflito mantenha a população egípcia e o seu governo alinhados a longo prazo.

"À medida que a opinião pública passa da simpatia por Israel, após o horrível massacre de civis israelenses para o horror face ao número muito maior de civis palestinos que estão agora sendo mortos sob o bombardeamento israelense, serão inevitavelmente colocadas questões sobre a razão pela qual o governo egípcio continua a parceria com Israel", disse Roth à DW.

O governo egípcio já se prepara para eliminar qualquer dissidência pela raiz. Na semana passada, depois de manifestantes egípcios terem apelado à justiça e à liberdade durante comícios pró-palestinos sancionados pelo governo, as forças de segurança egípcias detiveram cerca de 70 pessoas no Cairo e em Alexandria. De acordo com um relatório recente da Human Rights Watch, 16 manifestantes foram acusados de "juntar-se a um grupo terrorista" e "cometer um ato terrorista".