Secretismo e violações ameaçam o valor de ritos de iniciação em Moçambique
27 de dezembro de 2013Apesar do respeito que se tem pelos ritos de iniciação em Moçambique, também há casos de abuso em nome da tradição. Algumas mulheres foram violadas no norte do país.
As comunidades da província moçambicana de Cabo Delgado atribuem um grande valor aos ritos de iniciação, considerados há muito um símbolo cultural. Nas etnias, makua, makonde e muani, esta tradição constitui uma fase indispensável na vida da mulher e do homem.
Símbolo de maturidade
Passar pelos ritos de iniciação significa para muitos dignificar a cultura, uma forma de procurar a identidade masculina e feminina e a conquista do respeito na sociedade. Tradicionalmente, estes rituais, são um símbolo de crescimento e maturidade para as raparigas e os rapazes.
Júlia Wachave da Associação Moçambicana das Mulheres de Carreira Jurídica, defende que o conteúdo dos conselhos nos ritos de iniciação deve ser moderado de modo a evitar a violência psicológica das crianças.
“Há certos ensinamentos que já entram numa outra esfera. Por exemplo, os direitos das crianças na questão de se levar as crianças para participarem em ritos de iniciação aos treze, quatorze anos quando elas ainda são muito pequeninas e não decidem nada.”
Os ritos foram uma forma encontrada pela sociedade para consciencializar os rapazes e as raparigas para a preservação, conservação dos valores morais na comunidade, como conduta social, respeito mútuo, sexualidade e para aprenderem a tomar conta dos doentes e dos mortos.
Tradição e Abusos
Mas também há casos de violação coletiva de mulheres no norte de Moçambique, como é denunciado no recém-lançado documentário “Ritos de Iniciação - O Lado Escuro”.
Segundo relatos populares, quando uma mulher invadia o recinto dos ritos de iniciação masculinos, era conduzida aos mais velhos, que analisavam profundamente as causas que a teriam levado a agir dessa forma. Os mais velhos tomavam, então, medidas consoante o problema. Por vezes, a mulher era castigada fisicamente e obrigada a transportar lenha, mas o castigo não implicava violação sexual.
O sociólogo Estevão Mpalume teme o desaparecimento do real sentido de realizar os ritos como manda a tradição, porque as regras tradicionais já não são seguidas como noutros tempos. “Porque as criancas nao aprendem nada e isso pode ameaçar a nossa cultura. Não é um passo educativo conforme era com os nossos antepassados.”, argumenta o sociólogo.
Helena Abacar, anciã e conselheira de raparigas, considera que os ritos de iniciação constituem uma ameaça para a comunidade porque as crianças, após o ritual, são expostas a casamentos prematuros e têm de abandonar a escola.
“É difícil, hoje em dia, os jovens seguirem os ensinamentos dados nos ritos de iniciação de acordo com a realidade social, porque eles intrepretam-os segundo os seus pensamentos”, explica a conselheira.