Genocídio colonial: Namíbia rejeita oferta alemã
12 de agosto de 2020O Presidente da Namíbia, Hage Geingob, considera que as reparações oferecidas pela Alemanha pelo genocídio dos grupos étnicos herero e nama na sua então colónia no início do século 20 são "inaceitáveis" e precisam de ser "revistas".
"Continuamos determinados a completar esta missão-chave", disse Geingob, na terça-feira (11.08), no final de uma reunião com o enviado especial para as negociações com a Alemanha, que já duram há cinco anos. O chefe de Estado pediu uma revisão da oferta, que terá o valor de 10 milhões de euros.
Ruprecht Polenz, comissário especial do Governo alemão para o diálogo com a Namíbia, ficou surpreendido com a reação da Namíbia. "Não sei de onde vem esse número. Nunca falei com o lado namibiano sobre números específicos. A Alemanha quer assumir a sua responsabilidade política e moral pelos crimes. O resto é especulação. Os dois lados concordaram com a confidencialidade nas negociações", declarou.
Pouco antes, o Governo tinha emitido uma declaração com a sua posição sobre o estado das negociações, especificando que a oferta da Alemanha, atualmente em cima da mesa, "ainda não é aceitável" para a Namíbia. "A atual oferta de reparação feita pelo Governo alemão continua pendente", disse a Presidência da Namíbia, embora sem divulgar detalhes específicos sobre a proposta.
Pedido de desculpas
A Namíbia salientou que a Alemanha se recusa a falar de "reparação" nestas negociações, palavra que também foi evitada durante as negociações do país com Israel após o Holocausto.
A Alemanha recorreu à fórmula "cicatrização de feridas", considerada inadequada pela Namíbia. Os dois países estão agora a trabalhar num quadro de acordo que fala de "reconciliação".
Berlim comprometeu-se, contudo, a pedir desculpas incondicionais pelo massacre dos grupos étnicos namibianos. O Governo alemão está pronto para pedir desculpas incondicionais ao povo namibiano, garante Ruprecht Polenz.
A pressão da Namíbia sobre a Alemanha está a aumentar. Segundo analistas, como Frederico Links, do Instituto Windhoek de Pesquisa de Políticas Públicas (IPPR), isso deve-se aos problemas económicos que estão a agravar-se na Namíbia.
"A economia da Namíbia está em recessão desde 2016. Tivemos duas secas severas consecutivas. A pandemia de Covid-19 piorou a situação. Portanto, não há muito dinheiro a circular no país. As negociações com a Alemanha são uma forma de o país se livrar de um buraco fiscal", explica.
Compensação monetária
No que diz respeito à compensação, a Namíbia está a fazer progressos na identificação e orçamentação de vários projetos que o país necessita em áreas como o abastecimento de água, eletrificação rural, estradas, habitação, educação ou desenvolvimento agrícola, entre outras.
Geingob instruiu o seu negociador, o embaixador Zed Ngavirue, a requerer de Berlim uma proposta reformulada. Apesar dos progressos nas negociações, Berlim não prevê o pagamento de indemnizações individuais, ao contrário das exigências dos representantes dos povos herero e nama, que apresentaram uma queixa contra a Alemanha em Nova Iorque em 2017.
O primeiro genocídio do século 20
Os ocupantes alemães na Namíbia mataram dezenas de milhares de indígenas herero e nama entre 1904 e 1908. Os massacres são considerados o primeiro genocídio do século 20.
A 12 de janeiro de 1904 houve uma primeira revolta dos herero contra o domínio colonial alemão, seguida, em outubro, pela insurreção da população nama.
Estima-se que os soldados do Imperador Guilherme II tenham chacinado 65.000 hereros de uma população de 80.000 e pelo menos 10.000 dos 20.000 nama.
Este genocídio é considerado um precedente para outras limpezas étnicas.
Em 2015, os dois países começaram a negociar um acordo que combinaria um pedido oficial de desculpas da Alemanha, bem como a ajuda ao desenvolvimento.
Em novembro de 2019, o Parlamento alemão usou pela primeira vez a palavra "genocídio" para se referir a este massacre. O negociador alemão, Ruprecht Polenz, adiantou que o acordo com a Namíbia estava próximo.