“Não deixei os cofres do Estado vazios”, diz JES
21 de novembro de 2018Na inédita conferência de imprensa, sem direito a perguntas aos jornalistas, realizada esta quarta-feira (21.11.), na sede da sua fundação, em Luanda, o ex-Presidente da República de Angola José Eduardo dos Santos foi peremtório em responder ao seu sucessor João Lourenço, que no último sábado (17.11.) disse ao jornal português Expresso que encontrou os cofres do Estado angolano vazios.
"Não deixei os cofres do Estado vazios. Em setembro de 2017, na passagem de testemunho, deixei 15 mil milhões de dólares no Banco Nacional de Angola como reservas internacionais líquidas a cargo do um gestor que era o governador do BNA [Banco Nacional de Angola ] sob orientação do Governo", disse dos José Eduardo dos Santos.
Na entrevista ao jornal português Expresso, João Lourenço queixou-se também da ausência de uma "verdadeira passagem de pasta" por parte de José Eduardo Santos.
"Esperava uma verdadeira passagem de pasta em que me fosse dado a conhecer os grandes dossiês do país e isso, de facto, não aconteceu", afirmou o chefe de Estado angolano.João Lourenço disse ainda que o seu executivo, que tomou posse em setembro de 2017, esteve "diante de uma anormalidade com despachos feitos em vésperas" da investidura "para favorecer quem pretendiam favorecer", numa referência aos filhos de Eduardo dos Santos.
Reservas internacionais líquidas
Ao novo Presidente da República, José Eduardo dos Santos, que governou o país por quase 40 anos, disse - também - que aquando da sua saída deixou o Orçamento Geral do Estado 2017/2018, já elaborado, mas a "nova equipa governativa não quis seguir a proposta deixada", tendo acrescentado que "apesar da crise económica, resultante da baixa do preço do petróleo no mercado internacional", o seu Governo tinha a economia "controlada"."Não desvalorizámos a moeda, pagámos regularmente os salários dos funcionários públicos, incluindo o décimo terceiro mês, mantivemos o poder de compra dos cidadãos, fazendo atualizações em função da taxa de inflação. Com a produção nacional e com alguns produtos importados, garantimos a cesta básica, as matérias primas para a indústria e materiais para construção".
Reações às declarações
Os pronunciamentos do ex-Chefe de Estado já começaram a gerar debates, sobretudo nas redes sociais onde os cidadãos perguntam: quem tem razão, o anterior ou ao atual Presidente?
Em declarações a DW África o analista político Alexandre Neto Solombe, explica o que viu nas palavras do ex-Presidente angolano:"Vi na mensagem de Eduardo dos Santos, um homem igual a si mesmo. (...) Mais do que tudo, é o reafirmar por parte de Eduardo dos Santos de que no tempo dele as coisas estavam boas inclusivamente o facto de ter deixado 15 mil milhões de dólares", destaca o analista.
Para o também economista, os 15 mil milhões de dólares "equivaleriam, a pouco mais, segundo avaliação do FMI [Fundo Monetário Internacional], a seis meses de importação de bens e serviços tomando como base a quantia que gasta mensalmente Angola para suprimir necessidades em alimentos, serviços e todo o resto que é prioritário, ou seja o cabaz de importação do Governo do país."
Novos pronunciamentos?
Assim sendo, observadores notam que o debate sobre os cofres do Estado está instalado. Alexandre Neto Solombe espera por novos pronunciamentos do atual chefe de Estado.João Lourenço, deslocou-se esta quarta-feira (21.11.) a Portugal, onde efetua, a partir de amanhã, uma visita de Estado de três dias com o objetivo de normalizar as relações entre os dois países, azedadas pelo "irritante" caso Manuel Vicente, citado na operação Fizz (que tem na base as acusações de corrupção e branqueamento de capitais e tem três arguidos em Portugal e um em Angola).
A conferência de imprensa, promovida pelo presidente Eduardo dos Santos, revela uma coisa: a transição no seio do MPLA não foi pacífica, conclui o jornalista Solombe: "Definitivamente está esclarecido que, afinal de contas, a transição no seio do MPLA não tinha sido pacifica, como se procurou exteriorizar num dado momento, fazendo dela inclusivamente uma 'referência' no continente africano. Esta era mais a ideia de propaganda que nós tivemos naquele período, em que João Lourenço tomou conta do poder e mesmo no período anterior, nomeadamente, durante a campanha eleitoral".