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Mpox: Quando terá África vacinas suficientes?

Arthur Sullivan
23 de agosto de 2024

África enfrenta uma escassez de vacinas contra a mpox, à medida que uma nova variante grave do vírus se espalha pelo continente. Custos elevados e a falta de regulamentação dificultam o acesso.

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Vacina contra a mpox da fabricante Bavarian Nordic
O preço das ações da Bavarian Nordic subiu porque a empresa produz atualmente a vacina mais eficaz contra a mpoxFoto: Sven Hoppe/dpa/picture alliance

No início deste mês, a Organização Mundial de Saúde (OMS) declarou o surto de mpox em África como uma emergência de saúde pública de importância internacional.

A maioria dos casos foi detetada na República Democrática do Congo (RDC), mas a doença também se propagou a vários países da África Central e Oriental. A Suécia registou recentemente um caso de uma variante mais perigosa do vírus – o primeiro caso deste tipo registado fora de África.

A nova variante agravou a necessidade de vacinas na República Democrática do Congo e noutros países. Na altura da produção deste artigo, o país ainda não dispunha de nenhuma dose de vacina contra a mpox. Na segunda-feira (19.08), o ministro da Saúde congolês disse que o Japão e os Estados Unidos da América (EUA) se tinham comprometido a doar vacinas antes do final do mês.

A situação pôs mais uma vez em evidência a desigualdade mundial que existe no que diz respeito às vacinas e às crises de saúde pública, bem como o facto de a lucratividade ser frequentemente o principal fator determinante na produção e aquisição de vacinas.

Samuel Roger Kamba, ministro da Saúde da República Democrática do Congo
O ministro da Saúde da RDC, Samue Kamba, afirmou que o Japão e os EUA doaram vacinas contra a mpoxFoto: John Kanyunyu /DW

Stuart Blume, professor emérito de ciência e tecnologia na Universidade de Amesterdão, afirma que as empresas só podem lucrar com as vacinas se o vírus se tornar "um problema" nos países ricos. "Ninguém vai ficar rico a vender vacinas para África", diz.

Que empresas produziram uma vacina contra a mpox?

Atualmente, existe apenas uma vacina contra a mpox que obteve uma aprovação generalizada das principais autoridades de todo o mundo.

Trata-se da vacina MVA-BN, produzida pela empresa dinamarquesa de biotecnologia Bavarian Nordic. A empresa vende a vacina sob as marcas Jynneos, Imvamune e Imvanex. Os EUA comprometeram-se a enviar 50 mil doses das suas reservas para a RDC nos próximos dias.

A vacina LC16 do Japão, fabricada pela KM Biologics, obteve a aprovação nacional japonesa durante o surto anterior de mpox de 2022-2023. A OMS também recomenda a sua utilização, mas ainda não obteve aprovação a nível mundial.

Segundo a agência noticiosa AFP, o Japão comprometeu-se a enviar 3,5 milhões de doses da sua vacina LC16 para a RDC. O Governo japonês pediu que a vacina fosse aplicada especificamente nas crianças, que são particularmente suscetíveis às consequências graves causadas pelo vírus.

Paciente infetada com mpox na República Democrática do Congo
Crianças são mais vulneráveis às consequências da infeção por mpoxFoto: Arlette Bashizi /REUTERS

Uma outra vacina digna de registo é a ACAM2000, originalmente concebida para combater a varíola. A empresa biofarmacêutica norte-americana Emergent BioSolutions comprou a vacina à empresa francesa Sanofi em 2017.

Embora seja uma vacina contra a varíola, os especialistas acreditam que as semelhanças entre os vírus que causam a mpox e a varíola são tão grandes que a ACAM2000 produziria imunidade contra a primeira.

"Atualmente, a OMS recomenda a utilização das vacinas MVA-BN ou LC16, ou a vacina ACAM2000, quando as outras não estão disponíveis", afirma a organização na sua página oficial na Internet.

Outra vacina contra a varíola designada para possível uso contra a mpox é a OrthopoxVac, produzida pela Rússia. Assim como a vacina LC16 do Japão, essa também foi aprovada para uso contra o mpox em 2022. No entanto, só em território russo.

Poderá a Bavarian Nordic atender à procura por vacinas?

No início deste mês, o diretor-executivo da Bavarian Nordic, Paul Chaplin, afirmou que a empresa tem capacidade para produzir milhões de vacinas até ao final do ano, mas que era necessário haver uma procura maior. "Temos a capacidade, mas precisamos que as pessoas comecem a fazer encomendas rapidamente", disse ao jornal económico britânico Financial Times (FT). "Precisamos de encomendas até ao final deste mês se quisermos atingir os 2 milhões [de doses] até ao final deste ano".

A empresa recebeu recentemente uma encomenda de mais de 175 mil doses da Autoridade Europeia de Preparação e Resposta a Emergências Sanitárias (HERA) e diz estar em conversações com outros governos sobre potenciais encomendas que seriam distribuídas em África.

Partículas do vírus mpox vistas ao microscópio
A mpox transmite-se, principalmente, pelo contato direto com as lesões causadas pelo vírus ou líquidos corporaisFoto: Planet Pix/ZUMA Press/picture alliance

A Bavarian Nordic afirma que pode produzir 10 milhões de doses até ao final de 2025, se houver procura suficiente, e que está a trabalhar em estreita colaboração com os Centros Africanos de Controlo e Prevenção de Doenças (África CDC) "para garantir o acesso equitativo à vacina contra a mpox".

O professor Stuart Blume, por sua vez, apela aos governos de países ricos para que se mobilizem e paguem as encomendas em nome de muitos países africanos. "Os países africanos não têm recursos para as comprar e também não está claro se os países ricos vão arranjar o dinheiro", afirma.

No entanto, a regulamentação das vacinas também é um problema em África. A RDC não recebeu vacinas durante o surto de 2022-2023 devido à falta de aprovações, embora agora o país e a Nigéria tenham aprovado a vacina da Bavarian Nordic para uso de emergência.

Outros países atualmente afetados pelo surto em África não aprovaram qualquer vacina, o que complica ainda mais a distribuição dos imunizantes.

Enfermeiro prepara-se para aplicar a vacina contra mpox
Países africanos aguardam a chegada de vacinas doadas por países como Japão e EUAFoto: Joe Raedle/AFP/Getty Images

Lucratividade e quantidade de vacinas produzidas

O preço das ações da Bavarian Nordic subiu cerca de 40% na semana desde que o surto do vírus mpox foi declarado uma emergência de saúde pública – um sinal de como as vacinas podem movimentar os mercados.

Blume diz que o lucro é agora um fator determinante para a produção de vacinas numa crise de saúde pública. "Nas décadas de 1960 e 1970, as preocupações com a saúde pública dominavam efetivamente o campo das vacinas. Com o neoliberalismo dos anos 1980, tornou-se uma questão de rentabilidade e de retorno para os acionistas".

A influência geopolítica também se tornou um fator na produção de vacinas, e o professor da Universidade de Amesterdão cita o exemplo dos esforços chineses e russos durante a pandemia da Covid-19.

"A sua produção não foi necessariamente orientada para o lucro. Foi igualmente orientada para a criação de relações de clientela com outros países", afirma, acrescentando que é difícil dizer qual o papel que a diplomacia vai desempenhar desta vez.

No caso da mpox, Blume receia que a distribuição de vacinas continue a ser lenta em África. "É um pouco como com o ébola", diz, citando o exemplo do vírus que causou milhares de mortes em África nas últimas décadas. "O ébola esteve presente durante anos e só quando afetou o Norte Global é que alguém se interessou em desenvolver uma vacina".

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