Há um risco de uma greve silenciosa no setor da saúde
28 de agosto de 2023A partir desta segunda-feira (28.08), os hospitais públicos moçambicanos voltaram a operar normalmente. Um cenário que não era visto há mais de um mês, desde o início da greve dos médicos a 10 de julho.
"Serviços mínimos" passaram a ser a regra, mas mesmo com essa garantia, o país enfrentou o caos.
A Rede Moçambicana de Pessoas Vivendo com HIV e SIDA lamenta que membros da organização tenham sido forçados a interromper a toma de antirretrovirais, conforme contou à DW, Júlio Mujojo.
"Se não existe este serviço acaba provocando ao paciente a resistência aos medicamentos”, avisa Mujojo para quem "se a pessoa não está a tomar os remédios vai ter problemas difíceis”, sublinha.
Houve também pacientes que tiveram cirurgias adiadas e outros enviados para casa sem atendimento, contou um profissional de saúde à DW sob anonimato.
Decisão unilateral?
Após os médicos, em 20 de agosto, os profissionais da saúde também anunciaram a sua greve, suspensa neste domingo (27.08), conforme disse o Presidente da Associação, Anselmo Muchave, numa conferência de imprensa.
"Nós sensibilizámo-nos com o povo moçambicano e suspendemos a greve até ao dia 5 de novembro”, informou Muchave garantindo que enquanto isso, a classe continua em diálogo com o Governo.
A ativista social Quitéria Guirengane desconfia que a decisão de suspender a greve dos médicos e dos profissionais de saúde tenha sido unilateral, por isso ainda não de pode falar de alívio.
"Seria um alívio se ouvíssemos um discurso esperançoso. A Associação dos médicos e dos profissionais de saúde demonstrou que não estão satisfeitos. O semblante que acompanha essa decisão é marcado por descontentamento, pois os seus membros percebem a falta de sensibilidade governamental", observa a ativista.
Greve silenciosa
Guirengane teme que, se o Governo não levar a sério, os problemas no setor da saúde, o país poderá enfrentar uma greve silenciosa "que pode resultar em custos humanos significativos em diversas áreas do país."
Júlio Mujojo também está preocupado com a possibilidade de uma greve silenciosa e acredita que o Governo não está "minimizar” o clamor da classe médica.
"O Governo precisa de entender que o médico é essencial para a nossa sociedade. Precisamos de respeitá-lo. O Governo ainda não está a respeitar o lema [o nosso maior valor é a vida], " considera.
E se essa situação persistir, Mujojo alerta "as pessoas estão a morrer diariamente nos hospitais. Agora, as pessoas têm medo de ir ao hospital e preferem morrer em casa", lamenta.
A greve dos médicos e dos profissionais de saúde é apenas a ponta do iceberg dos problemas estruturais que Moçambique enfrenta, lembra a ativista Quitéria Guirengane, "estamos a viver por cima de uma bomba-relógio na área da saúde, da educação, da polícia, da defesa e segurança. Isso deve assustar-nos como povo."