Moçambique: Haverá "dedo" da UE na repressão de protestos?
3 de janeiro de 2025São muitas vezes confundidas com as forças ruandesas, mas são as QRF, em português,Forças de Reação Rápida. São treinadas e financiadas pela União Europeia (UE) no âmbito da luta contra a insurgência em Cabo Delgado.
Quem as conhece e acompanha as manifestações em prol da verdade eleitoral em Moçambique, já se cansou de as ver, como é o caso da ativista Fátima Mimbire: "O que eu sei e confirmo, porque conheço o uniforme, é que estiveram aqui em Maputo forças da QRF (Quick Response Force) que foi financiada para dar resposta à situação de Cabo Delgado", garante, em entrevista à DW África.
Segundo a ativista, as forças estão "altamente equipadas, contrariamente às forças nacionais financiadas e treinadas pelo Governo".
"Esta força esteve aqui em Maputo, sim", frisa Fátima Mimbire.
"Muito mau sinal"
As QRF também foram vistas noutros lugares do país, transportando-se em viaturas blindadas. A população vaiou-as, exigindo a sua retirada. É que do Exército receia-se um uso desproporcional da força contra civis, mesmo desarmados. Exemplo disso foi o brutal atropelamento aparentemente intencional de Maria Matusse por um carro blindado BTR em finais de novembro.
A ex-eurodeputada portuguesa Ana Gomes partilha dos receios dos moçambicanos: "Eu acho muito mau sinal que forças treinadas pela UE para combater o terrorismo estejam a ser desviadas para Maputo. É sinal de que há intuitos de continuar a campanha repressiva e sanguinária que se está a exercer sobre o povo em protesto", afirma.
Estará o financiador ciente?
Os moçambicanos estão igualmente intrigados com o desvio dessas forças do objetivo para o qual foi criada para conter reprimir protestos. Saberá o financiador disso? A eurodeputada da Iniciativa Liberal Ana Vasconcelos Martins responde: "Não estou na posição para opinar sobre a veracidade desses factos. Mas há muitas alegações feitas nesse sentido".
"Uma coisa desejável é sempre que haja uma avaliação criteriosa de quaisquer fundos europeus. Alias, é uma questão em que a Iniciativa Liberal tem sido potente, quer seja para fundos aplicados nos países-membro da UE, quer seja fundos que vão para fora. Para a UE, em nome da sua própria credibilidade, essa deve ser, a nosso ver, sempre um esforço que a UE deve fazer", acrescenta a eurodeputada.
UE "pode e deve averiguar"
No início de novembro, os 27 emitiram um comunicado refutando um eventual patrocínio as forças ruandesas, igualmente a combaterem o terrorismo no norte, que supostamente estariam a reprimir os protestos, embora nunca tenham sido apresentadas provas. Porém, não se assiste às mesma postura em relação ao caso real das QRF, que foram vistas por muito tempo nas ruas.
É prática da União Europeia monitorar os apoios que saem dos bolsos do contribuinte europeu? "Acho que a UE pode e deve averiguar sempe como os fundos são utilizados e tem mecanismos de report sobre o assunto. Agora, sobre os mecanismos para o fazer, isso já uma questão mais detalhada e não poderei agora desenvolver", responde Ana Vasconcelos Martins.
O apoio da UE às QRF saiu a escopo e martelo, depois de muita ponderação dos 27. O Conselho da União Europeia anunciou em maio a prorrogação da missão de treino militar até 30 de junho de 2026, com um orçamento previsto de 14 milhões de euros para os próximos dois anos, que será apenas para o funcionamento da operação, o que está a ser desrespeitado a olhos vistos.