Descentralização fora dos planos do Governo de Chapo?
18 de fevereiro de 2025O chefe de Estado moçambicano, que tomou posse há cerca de um mês, disponibilizou recentemente o seu plano de governação para os primeiros 100 dias de governação, que ignora uma das suas anunciadas prioridades aquando da tomada de posse: "criar novas regras" aumentando os poderes executivos dos governadores de província e reduzindo para monitoria e fiscalização os poderes dos secretários de Estado.
"É curioso que, durante a campanha eleitoral, Daniel Chapo em várias situações foi visto em comícios a referir-se à importância de se rever com alguma urgência os principais instrumentos que regulamentam a matéria referente à descentralização", nota Ivan Maússe, pesquisador do Centro de Integridade Pública (CIP).
"Deveria, desde essa altura [da campanha eleitoral], ter concebido um plano porque já tinha uma ideia, virtualmente, de que seria ser o Presidente da República, através da fraude ou não, mas havia uma certeza de que seria Presidente", acrescenta.
Em 2023, o Executivo moçambicano, então liderado por Filipe Nyusi, criou a Comissão de Reflexão sobre o Modelo de Descentralização (CREMOD), que deveria apresentar ao Governo uma proposta sobre o modelo adequado para Moçambique. Volvidos dois anos, nada aconteceu e assistiu-se à mudança do Governo que ainda não o inseriu no seu plano.
Uma forma de legitimar o Governo
Para Ivan Maússe, "acaba sendo um contrassenso e uma questão muito problemática que deveria ter merecido alguma atenção por parte do Governo".
O investigador considera que "é urgente rever este instrumento", até para o novo Governo "ganhar alguma legitimidade".
"A legitimidade que está beliscada por causa da fraude eleitoral pode ser conquistada a partir do momento em que os governos provinciais, que são todos membros da FRELIMO, realizem algum trabalho ao nível da província, como provisão dos serviços públicos essenciais, como forma de granjear simpatias por parte dos cidadãos que vivem nessas províncias e que não se sentem devidamente representados pelo atual Governo", explica Maússe.
Governo "começa mal nas bases"
André Mulungo, investigador do Centro de Democracia e Desenvolvimento (CDD), considera que o plano de governação dos 100 dias ignora questões fundamentais como a descentralização e o bem-estar do povo.
"Aquele plano não é para se levar a sério, porque não tem nada ali que possamos dizer que é prioridade. Aquilo são as bases para o programa de governação. Se nas bases já começaste mal, então isso não nos inspira alguma confiança", afirma o investigador.
André Mulungo diz ainda que este Governo é uma continuação do anterior, sem muitas perspectivas: "Isto tudo é mais do mesmo, é a continuação do mesmo regime que não dá sinais de preocupação com o povo e o bem comum. É só olhar para a forma como está composto este Governo".
Para o investigador do CDD, "o mais grave são as pessoas que vão aconselhar o Presidente Chapo. Se há consenso nacional de que o Governo de Filipe Nyusi foi uma lástima, trazer as pessoas que fizeram parte da administração Nyusi é também assumirmos que não vai acontecer muita coisa neste novo Governo".
A governação descentralizada, em vigor desde 2019, surge na sequência da revisão constitucional de 2018 que visava colocar termo a um conflito político entre o Governo da FRELIMO e a RENAMO, na altura o principal partido da oposição.