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Luzia Moniz: "Esta é uma perseguição às minhas liberdades"

13 de junho de 2024

Ativista angolana critica o Governo de João Lourenço de perseguição à sua liberdade e de ingerência nos assuntos internos dos Estados membros da União Africana, representados em Lisboa.

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Luzia Moniz, jornalista e socióloga angolana
Luzia Moniz, jornalista e socióloga angolanaFoto: João Carlos/DW

"Esta é uma perseguição do regime de Luanda às minhas liberdades", afirmou Luzia Moniz em declarações à DW. A jornalista reagiu à posição da Embaixada de Angola em Lisboa que, no mês passado, recusou-se, por orientação de Luanda, a participar na cerimónia oficial do Dia de África por ela fazer parte da lista de convidados. 

Luzia Moniz considera "uma chantagem" a postura da Embaixada de Angola de Portugal, ao produzir uma nota verbal, através da qual é classificada como "cidadã luso-angolana que faz activismo contra a mais alta magistratura e Governo da República de Angola, legitimamente eleito".

Intolerância e perseguição

"Ao mesmo tempo mostra o nível de intolerância e perseguição política, o ataque às liberdades, à minha liberdade de expressão, a que o regime de João Lourenço se dedica. Isto não é uma surpresa para ninguém, sobretudo para quem acompanha a realidade política angolana", disse.

A polémica veio a público depois da Embaixada de Angola ter emitido uma nota, com data de 27 de maio, dirigida às 15 embaixadas africanas acreditadas em Portugal, dizendo que não participaria na cerimónia oficial da celebração do Dia de África, que se realizou num hotel de Lisboa no dia 29 do mesmo mês.

A Embaixada, dirigida pela diplomata angolana Maria de Jesus Ferreira, recusou participar nas celebrações pelo facto de constar na lista dos convidados o nome de Luzia Moniz.

Para a Embaixada angolana, a manutenção pelos Embaixadores do Grupo Africano do nome da jornalista na lista de convidados violava "o princípio de promoção de Unidade, Solidariedade e Coesão entre os Estados previsto no Acto Constitutivo da União Africana".

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Postura inadmissível

Mas, para Luzia Moniz, a postura da representação diplomática angolana é também "inadmissível" em relação aos outros embaixadores do grupo. E mostra, por outro lado, "um desfasamento muito grande de Angola em relação ao resto do continente".

"Angola tem estado orgulhosamente só, de costas viradas para aquilo que é a África, aquilo que são os anseios do continente e que tenta usar o continente africano mais para servir interesses de outras potências e nada que tem a ver nem com as políticas africanas nem com os princípios da própria organização, muito menos com os programas e projetos da Agenda 2063 da União Africana."

A ativista qualifica de "completamente absurda e fora do normal" a decisão do Governo de Luanda de impedir uma cidadã da diáspora de exercer ativismo. Ou de participar no que considera ser "o dia mais importante do continente africano", o Dia de África, assinalado a 25 de maio, para a qual sempre foi convidada como apresentadora.

"E o país que quer presidir à organização prima pela ausência porque essa cidadã [Luzia Moniz] está presente [entre os convidados]. Isto mostra fraqueza, incompetência, impreparação e mostra uma coisa gravíssima: ingerência nos assuntos internos dos outros estados. Porque os Estados são livres de constituir os seus convidados, assim como Angola também é livre de constituir os seus convidados", disse.

A DW contactou a Embaixada de Angola em Lisboa, mas os serviços de imprensa remeteram-nos para o Governo de Luanda, de onde partiu a decisão.

Entre os embaixadores que fazem parte do Grupo Africano em Lisboa nenhum quis pronunciar-se sobre o assunto. Mas, segundo o "Novo Jornal", onde Luzia Moniz escreve como colunista, "a maior parte dos embaixadores do chamado Grupo Africano ficou perplexa e indignada com esta atitude inédita da embaixadora de Angola em Portugal".

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Reações

A postura do Governo de Angola, por intermédio da sua Embaixada na capital portuguesa, tem provocado reações diversas através das redes sociais. Uma das críticas prende-se com as incongruências da posição do Governo de Angola, apontadas pelo analista angolano Carlos Gonçalves.

"Nada justifica uma retaliação em Lisboa para uma função de apresentadora aos encontros do Grupo Africano que ela desempenha já desde 2017. Outra incongruência é o facto de a Embaixadora desvalorizar uma atividade do Grupo Africano em cima do lançamento da candidatura de Angola a presidência da União Africana [em 2025]".

E mais ainda, adianta o jornalista: a nota contra Luzia Moniz surge semanas depois do Presidente de Angola, João Lourenço, ter promovido em Lisboa uma sessão de aproximação à comunidade angolana na diáspora.

"Ou seja, é um desalinhamento total que levanta os desígnios das liberdades consagradas na Constituição. É uma manobra de diversão muito pouco abonatória da ação diplomática."

No final da entrevista à DW, a socióloga expressou tristeza pelo facto de Angola estar a ser manchada com mais este episódio de perseguição a jornalistas e ativistas. Por outro lado, diz estar a receber "imensas mensagens de solidariedade” dos quatro cantos do mundo.

"Alegra-me saber que o mundo não tolera autocratas ditadores venham eles banhados ou não em petrodólares", afirmou.

Na qualidade de escritora e socióloga, Luzia Moniz lança no próximo dia 28 deste mês o seu novo livro com o título "Liberte-se Sr. Presidente!".