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Lei do vandalismo: "Há excessos e limitações dos direitos"

António Cascais
30 de agosto de 2024

Em vésperas de mais uma manifestação em Angola, Bangula Quemba, professor de Direito Penal em Luanda, considera que a nova lei do vandalismo é suscetível de restringir direitos fundamentais consagrados na Constituição.

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Pessoas algemadas em Angola
Nova lei do vandalismo prevê penas até 25 anos de cadeia efetiva em AngolaFoto: A. Guerra/DW

O Tribunal Constitucional (TC) de Angolaconsiderou que o denominado "movimento cívico" não tem legitimidade para requerer a sindicância da constitucionalidade da Lei dos Crimes de Vandalismo de Bens e Serviços Públicos.

A presidente do Constitucional de Angola, Laurinda Cardoso, na resposta à providência cautelar do "movimento cívico - plataforma de organizações cívicas e políticas contra a referida lei - refere que o procedimento cautelar "não é expediente jurídico apropriado para arguir a constitucionalidade das normas" da lei em acusa.

O professor de Direito Penal e Processo Penal da Universidade Católica de Luanda, Bangula Quemba, em entrevista à DW África, não quis comentar o acórdão do Tribunal Constitucional de Angola, mas sublinha que - do seu ponto de vista - a Lei dos Crimes de Vandalismo, recentemente aprovada, é suscetível de restringir os direitos fundamentais dos cidadãos, consagrados na Constituição de Angola.

Ativistas angolanos dizem sofrer ameaças por convocarem protesto contra leis que limitam liberdades. Manifestação está marcada para 31 de agosto em Luanda.

DW África: Na sua perspetiva, a Lei dos Crimes de Vandalismo fere os princípios da Constituição de Angola?

Bangula Quemba (BQ): Eu acho que sim, porque aquilo que a lei chama de vandalismo, na verdade, é um ato que o código penal já o consagra. Se nós atentarmos a própria lei, nota-se claramente que há um conjunto de condutas que estão já salvaguardadas pelos crimes de dano, de furto e de roubo. O que o legislador fez foi esvaziar parte de algum capítulo do Código Penal e depois, então, autonomizar este capítulo como a lei dos crimes de vandalismo.

Sede do Tribunal Constitucional de Angola
Sede do Tribunal Constitucional de AngolaFoto: Osvaldo Silva/AFP/Getty Images

DW África: Esta nova lei do vandalismo, que foi aprovada, restringe os direitos fundamentais dos cidadãos?

BQ: Creio que sim, por uma razão muito simples: o direito à manifestação é um direito fundamental e é normal que, num ato de manifestação, haja algum excesso. É normal, por exemplo, que num ato de manifestação, o manifestante, por exemplo, pegue num spray e pinte uma parede. Este ato de pegar num spray e pintar uma parede deve ser concebido como uma forma de manifestação desse sentimento que ele tem de indignação em relação a uma situação social. No contexto da manifestação, isso não pode ser tido como um ato de vandalismo, tal e qual como a lei pretende dizer. Eu acho que aqui há excessos e há verdadeiramente limitações dos direitos e liberdades dos cidadãos no que diz respeito ao direito à manifestação.

DW África: Uma das críticas que se tem dito contra esta nova lei é o facto de a lei prever penas completamente desproporcionais para quem pratica atos de vandalismo. É isso?

BQ: Temos penas absurdas, como, por exemplo, uma pena de 20 a 25 anos por vandalização de bem jurídico. Está-se a equiparar a vandalização do bem jurídico a um homicídio qualificado.

DW África: Surgiu um movimento cívico, uma plataforma, que convocou uma manifestação para este sábado. O Tribunal Constitucional de Angola já disse que esse movimento não tem legitimidade para inquirir a lei de vandalismo. Qual é a sua posição?

BQ: Eu não posso comentar a questão em relação ao Tribunal Constitucional, porque não conheço o acórdão proferido por este Tribunal em relação à lei do crime de vandalismo.

DW África: O presidente do Bloco Democrático pediu uma audiência urgente ao Ministro do Interior para abordar a postura da polícia. Concorda com essa iniciativa?

BQ: Eu acho que é uma iniciativa normal e que também tem respaldo constitucional. Qualquer cidadão pode dirigir-se às autoridades administrativas para manifestar alguma insatisfação. O facto de se ter dirigido ao Ministro do Interior cumpre o que está exatamente consagrado no artigo 73 da Constituição, que prevê que qualquer cidadão pode dirigir alguma petição, denúncia ou reclamação às autoridades administrativas.