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Guiné-Bissau: Quem preside ao Conselho de Ministros?

26 de junho de 2023

Depois das eleições, guineenses questionam se o Presidente poderá continuar a presidir ao Conselho de Ministros sempre que quiser, como afirmou o próprio Umaro Sissoco Embaló.

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Guinea-Bissau Bissau Kabinettsitzung mit Präsident Umaro Sissoco Embaló
Foto: DW/B. Darame

Passadas as eleições, os guineenses questionam agora como vai ser a relação entre o Presidente da República e o próximo Governo da coligação PAI - Terra Ranka, que venceu com maioria absoluta.

Muitas vezes, a coabitação entre o Presidente guineense e o chefe do Executivo tem sido difícil. Uma das perguntas que mais se coloca neste momento é se o Presidente poderá continuar a presidir ao Conselho de Ministros sempre que quiser, como afirmou o próprio Umaro Sissoco Embaló.

A Constituição da Guiné-Bissau é clara no Artigo 68º, alínea m) – uma das atribuições do Presidente da República é presidir ao Conselho de Ministros, "quando entender".

Nos 29 anos de democracia guineense, o Presidente que mais usou este dispositivo constitucional é Umaro Sissoco Embaló, que tem liderado quase todas as reuniões dos ministros do Governo liderado por Nuno Gomes Nabiam.

Guinea-Bissau | Palamentswahlen | Präsident Umaro Sissoco Embalo
Sissoco Embaló vota nas eleições de 4 de junho, em GabuFoto: DW

O jurista guineense Bubacar Turé diz que este artigo foi inscrito na Lei Magna durante a transição constitucional entre 1991 e 1993. O propósito era confortar o então Presidente, João Bernardo Vieira, que liderou essa transição do país para o regime semipresidencialista.

"Na altura, o país estava a sair do partido único para o multipartidarismo", recorda. "Portanto, esta norma foi consagrada na Constituição para tentar agradar ao chefe único que existia, que era o Presidente da República e, ao mesmo tempo, o chefe do Governo".

Uma fonte de instabilidade?

Os críticos argumentam, no entanto, que este artigo poderá dar um pendor presidencialista ao semipresidencialismo, diferente de outros sistemas onde o chefe de Estado só pode presidir ao Conselho de Ministros se for convidado. Além disso, poderá ser uma fonte instabilidade entre o novo Executivo e Sissoco Embaló.

O atual chefe de Estado elogia a Constituição guineense: "Tem um bocado do pendor presidencialista. É a grande herança que o Nino Vieira deu aos guineenses", afirmou, recentemente.

Mas, para o jurista Vítor Fernandes, não é bem assim: "Continuamos a ser um país com o regime semipresidencialista com pendor parlamentar. Não é como as pessoas querem pintar agora", frisa.

Guinea-Bissau Ministerrat der Regierung von Nuno Gomes Nabiam
Foto de arquivo (2020): Conselho de Ministros do Governo de Nuno NabiamFoto: DW/B. Darame

"Um fator acelerador dos conflitos"

Será que presidir ao Conselho de Ministros é o mesmo que presidir ao Governo? O Presidente da República está a participar na governação do país?

O jurista Bubacar Turé diz que lei magna dissipou esta dúvida com o princípio da separação e interdependência dos órgãos de soberania, uma vez que "a própria Constituição consagra expressamente que o chefe do Governo, do Executivo, é o primeiro-ministro".

"É evidente que esta norma constitui, na minha perspetiva, um irritante e até um fator acelerador dos conflitos institucionais entre o Presidente da República e o primeiro-ministro", sublinha.

O jurista considera que a norma "deve ser interpretada de forma sistemática, tendo em consideração que há outras normas da Constituição que atribuem o título de chefe de Governo ao primeiro-ministro e, por conseguinte, são reservadas a ele as competências de dirigir e coordenar a ação e execução das leis e não ao Presidente da República.

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Umaro Sissoco EmbalóFoto: Afolabi Sotunde/REUTERS

A interpretação de Sissoco

Em declarações aos jornalistas, no passado dia 12 de junho, Sissoco Embaló revelou ter uma interpretação diferente: "O Presidente é o chefe do Executivo e o primeiro-ministro é o chefe do Governo. O Presidente da República pode presidir ao Conselho de Ministros a cada semana. Nada lhe retira esse direito. Posso Presidir ao Conselho de Ministros todas as semanas e durante cinco anos. É preciso que as pessoas entendam isto", afirmou.

De acordo com o jurista Bubacar Turé, a norma constitucional sobre a presidência do Conselho de Ministros só dá poderes ao Presidente para acompanhar a atividade governativa. Nada mais. Mas a prática é diferente: "Quando vemos o Presidente a presidir a quase todos os Conselhos de Ministros, isso significa que ele passa também a participar nas decisões governativas. Passa também a ser o Executivo. Isso é uma tentação absolutista que o atual Presidente da República tem. Na minha perspetiva, isso desvirtua o espírito e a letra da Constituição".

Bubacar Turé convida, por isso, Umaro Sissoco Embaló a adaptar-se à normal constitucional para evitar mais instabilidade no país.

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Um novo contexto?

O jurista Vítor Fernandes duvida que Sissoco Embaló continue a presidir ao Conselho de Ministros na nova legislatura, por ser um novo contexto: "Isto funcionava de certa forma por ser ele quem dominava o Governo, por ser de iniciativa presidencial. Quase era o seu Governo e não funcionava no regime semipresidencial. Por isso, o Presidente decidia quase tudo", explica.

Os especialistas são unânimes num ponto: presidir às reuniões do Conselho de Ministros, a título honorário, não é a mesma coisa que presidir ao órgão, algo que é da exclusiva competência do chefe do Executivo. E o Presidente da República não é membro de pleno direito do Conselho de Ministros – não tem direito de voto.

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