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Escravatura moderna em Angola: "Sem salário e sem direitos"

Adolfo Guerra (Menongue)
23 de agosto de 2024

No Dia Internacional em Memória do Tráfico de Escravos e da sua Abolição, relatos de trabalhadores angolanos revelam que a escravatura moderna ainda é uma realidade dura e persistente.

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Symbolbild Moderne Sklaverei
Foto: Robert Geiss/picture alliance

Hoje, 23 de agosto, assinala-se o Dia Internacional em Memória do Tráfico de Escravos e da Sua Abolição. No entanto, a escravatura ainda é uma realidade nos dias atuais. Estima-se que 50 milhões de pessoas em todo o mundo sejam vítimas de escravatura moderna, incluindo trabalho forçado, tráfico humano e trabalho infantil. Angola não é exceção.

Casos de maus-tratos, salários baixos e condições de trabalho precárias são frequentemente denunciados no país. João Galanga (nome fictício), de 32 anos, trabalha numa empresa privada de segurança, recebendo teoricamente 26 euros por mês, mas o salário nunca chega a tempo. Ele trabalha longas horas seguidas e se alimenta apenas uma vez por dia.

"O problema maior está na alimentação que nos dão; nos alimentamos uma vez em 24 horas de serviço. Sobre o salário, ficamos vários meses sem pagamento salarial. Quando pagam, não dão o dinheiro todo em atraso. Dão apenas um mês, o resto não pagam", relatou João.

Trabalho análogo à escravidão

Há muito tempo que os sindicatos denunciam o trabalho análogo ao de escravo em Angola, apontando especialmente para empresas privadas estrangeiras do setor da construção civil. Alberto Viagem, diretor da Associação Juventude Unida para o Desenvolvimento Sadio Sociocultural (AJUDSS), ouve denúncias semelhantes:

À lupa: Sabia que há milhões de escravos no mundo?

"Há relatos de funcionários em situações de maus-tratos, sobretudo com cargas horárias acima do recomendável, e em situação deficitária de segurança e higiene de trabalho. Há relatos de remunerações abaixo do salário mínimo nacional [a receberem entre 10 a 16 euros mensais], bem como pessoas a trabalhar sem repouso do mínimo que seja", afirmou.

A pobreza no país potencia este tipo de situações. Cecília Cassapi, coordenadora de projetos da Associação Construindo Comunidades, destaca que muitos angolanos se submetem a trabalhos precários em troca de um prato de comida, tanto dentro do país quanto na vizinha Namíbia.

"De dia submetem-se a trabalhos precários, zungando, trabalhando em casas [trabalhadores domésticos], a pastarem [gados]. Algumas vezes pagam-lhes e outras não. E [os emigrantes] não têm o direito de reclamarem; caso o façam, o senhorio vai à polícia dizendo que eles estão ilegais. Porque há alguns cidadãos angolanos que estão lá ilegalmente", explicou Cecília.

Nova lei, velhos problemas trabalhistas

Angola tem uma nova Lei do Trabalho, que deixou os sindicatos satisfeitos. É uma lei que reforça os direitos dos trabalhadores – por exemplo, garantindo o pagamento de subsídios em caso de doença ou incapacidade.

O desafio será pôr a legislação em prática. Alberto Viagem, diretor da ONG AJUDSS, realça também que é preciso garantir que os trabalhadores que denunciam más práticas não sofram consequências.

"É necessário a intervenção rigorosa das instituições de direito de modo que os nossos irmãos sejam salvaguardados. Porque, face à vulnerabilidade em que muitos se encontram, para salvaguardar o pouco que lhes é pago, eles não terão a coragem de denunciar nem de abandonar tais postos de trabalho. Enquanto isso durar, essas pessoas acabam adquirindo outros problemas nocivos à sua saúde", concluiu.

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