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Desesperados, refugiados africanos desaparecem a caminho da Europa

12 de maio de 2011

Dois grupos de refugiados no campo de Choucha, entre a Tunísia e a Líbia, teriam desaparecido, supostamente ao atravessarem o Mar Mediterrâneo rumo à Europa. Críticos culpam ONU, que tem dificuldade para realocar pessoas

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Refugiado mostra foto de dois somalis que tentaram pegar uma embarcação rumo à ilha italiana de Lampedusa, mas não conseguiram. Refugiados deveriam estar sob guarda da ONU
Refugiado mostra foto de dois somalis que tentaram pegar uma embarcação rumo à ilha italiana de Lampedusa, mas não conseguiram. Refugiados deveriam estar sob guarda da ONUFoto: Gaia Anderson

Segundo a Agência das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR), cerca de 900 somalis que estavam no campo de refugiados de Choucha, na zona fronteiriça entre a Tunísia e a Líbia, terão desaparecido ao longo do mês passado. Estima-se que tenham enfrentado o mar, rumo à Itália. Porém, ninguém garante que essas pessoas tenham de fato atingido o litoral europeu.

Um outro grupo de 40 cidadãos oriundos da Costa do Marfim, que há dez dias abandonou o campo de Choucha, também nunca chegou ao destino. As especulações dão conta de que o grupo esteja perdido no Mediterrâneo.

Insegurança e desespero

Os refugiados em Choucha cansam de esperar por respostas sobre a própria realocação
Os refugiados em Choucha cansam de esperar por respostas sobre a própria realocaçãoFoto: Gaia Anderson

As condições no campo de refugiados de Choucha são precaríssimas, segundo observadores, que dizem que o ACNUR não controla a situação. Em Choucha, segundo a Deutsche Welle apurou, reina um ambiente de insegurança, de falta de perspectivas e de desespero.

A reportagem encontrou cinco jovens refugiados, cidadãos da Costa do Marfim. Antes do início dos protestos contra o presidente Mouammar Kadhafi, em fevereiro, eles trabalhavam na Líbia. Os homens estão preocupados, exibem fotografias de outros africanos, tiradas no campo de Choucha. Fotografias de colegas que, há várias semanas, resolveram enfrentar o mar e que não voltaram a dar sinal de vida.

Ao todo, 40 homens marfinenses terão desaparecido. Os colegas que ficaram já perderam a esperança: “Estamos convencidos que eles perderam a vida”, diz Hammed, um dos jovens.

Mariko Paul, porta-voz da comunidade marfinense no campo de Choucha, acusa o ACNUR de ser responsável pela situação: “Se o ACNUR tivesse feito o que lhe compete, a gente não teria chegado a este estado de coisas”, ataca Mariko. “Quanto aos nossos irmãos marfinenses: é preciso aceitar que houve 40 mortes e agora não sabemos o que podemos dizer aos pais deles”, diz.

Mariko lembra que os jovens que foram ao mar abandonaram o campo de refugiados porque tinham perdido toda a esperança ali.

Hussein Adam mora numa tenda com a mulher e o filho de 14 meses, Mohamed
Hussein Adam mora numa tenda com a mulher e o filho de 14 meses, MohamedFoto: Gaia Anderson

Também Hussein Adam, um dos representantes da comunidade somali no campo, confirma que a vida no campo de refugiados tornou-se muito dura. “O grande problema é que estamos aqui, no meio do deserto, um sítio muito desagradável, onde as temperaturas atingem níveis insuportáveis”.

Não é apenas o calor que aflige os habitantes do campo. Outro problema são as frequentes tempestades, com ventos fortes e muita areia no ar que regularmente destrói as tendas que servem de abrigo aos refugiados.

Processos morosos, meios precários

Mais de 5 mil pessoas vão sobrevivendo ainda nos campos de refugiados tunisinos, junto à fronteira com a Líbia. Mais de metade desses refugiados são oriundos da Somália, da Eritreia ou da Costa do Marfim. Muitas vezes, os países de origem são locais aos quais os fugitivos não querem ou nem podem regressar. O ACNUR assumiu a responsabilidade de realocá-los, mas os processos são morosos e complicados e os meios são precários.

Firas Kayal, funcionário da ONU, diz que a maior dificuldade do ACNUR é conseguir o apoio e a solidariedade das autoridades e de governos no mundo todo: “Todos os dias, apelamos à comunidade internacional, para que ponha à disposição capacidades e infraestruturas para receber estes refugiados de forma legal, para que eles não se vejam obrigados a recorrer a esquemas ilegais, que colocam em risco muitas vidas humanas”, afirma.

Observadores dizem que muitos refugiados decidiram até mesmo regressar à Líbia, possivelmente cerca de 900 deles a partir do campo de Choucha.

Os representantes do ACNUR reconhecem o problema, mas dizem que estão a fazer o melhor que podem. Firas Kayal, funcionário da ONU, diz que fugir do campo e possivelmente entregar-se às redes de tráfico de seres humanos, atirando-se ao mar em embarcações inseguras, não é - de maneira nenhuma -solução.

Mas o ACNUR não pode impedir as pessoas de abandonar o campo. “O campo é aberto. Não podemos proibir ninguém de ir embora. Fazemos tudo o que está ao nosso alcance, informando as pessoas sobre os perigos”, diz Firas Kayal.

Autores: Marine Olivieri / António Cascais

Revisão: Renate Krieger / António Rocha

Em meados de abril, um grupo de 40 marfinenses desapareceu do campo de Choucha
Em meados de abril, um grupo de 40 marfinenses desapareceu do campo de ChouchaFoto: Gaia Anderson