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Música lusófona: A "misturada" de Maria João

Inês Cardoso
11 de maio de 2022

Maria João atuou no JazzFest Bonn, em Bona, na Alemanha, com os OGRE electric. À DW, a artista diz que as origens africanas têm "muita força" no seu trabalho, embora nem sempre tenha tido orgulho em ser luso-africana.

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Maria João auf dem Jazzfest Bonn
Foto: Stélio Guibunda/DW

Maria João, um dos grandes nomes do jazz português, atuou esta segunda-feira (09.05) no Jazzfest Bonn, em Bona, na Alemanha.

A cantora, filha de mãe moçambicana e pai lusitano, tem o coração dividido entre dois países – Moçambique e Portugal.

Quando era criança, viajava muitas vezes até Moçambique, país que acredita ter-lhe concedido a liberdade, a felicidade e a rebeldia, que tanto a caracterizam. O continente africano não só influenciou a sua personalidade, como também a sua música.

"Quando eu oiço os solos que faço, eu fico a pensar ‘Onde é que eu fui buscar aquilo?'. Claro que fui buscar às minhas raízes africanas, às minhas raízes de Moçambique. Que elas cá estão, estão. E estão com muita força e muito orgulho meu. Eu não tive consciência dessa influência, mas ela sempre esteve lá", diz.

Nem sempre gostou de ser luso-africana

Nos tempos de infância, Maria João não gostava de ser luso-africana. Na escola, sofria bullying dos colegas que lhe chamavam nomes como "caixa de óculos" e "Gungunhana". No entanto, com o passar dos anos foi compreendendo a riqueza da multiculturalidade, como agora explica.

"Quando eu era miúda… É uma coisa difícil não ser branca num país [como Portugal]. Apesar de ser clara, [não ser branca] era difícil para mim. Eu não tinha orgulho, nem consciência, nem coisa nenhuma. Eu só queria que não me aborrecessem, que os outros miúdos não me fizessem bullying. Então, queria ser como os outros, que é aquilo que nós fazemos, nós queremos ser iguais [aos outros]", recorda.

"Esse amor por Moçambique e pela minha raíz africana foi uma coisa que se desenvolveu depois da adolescência. À medida que fui crescendo, as coisas tornaram-se presentes e eu ergui o meu orgulho", conta.

Maria João auf dem Jazzfest Bonn
Foto: Stélio Guibunda/DW

Desigualdade de género na música 

Umas das suas referências sempre foi a cantora sul-africana Miriam Makeba. A "Mama Africa", como é conhecida, começou a sua carreira na década de 50. Maria João iniciou o percurso musical nos anos 80. Duas mulheres numa indústria onde a desigualdade de género sempre foi evidente.

"Realmente sempre foi um lugar mais habitado por homens. Agora há muitas mais mulheres, porque agora também há muitas escolas de música. Há muitas miúdas instrumentistas, cantoras e, portanto, a coisa tende a equilibrar-se", afirma.

"Mas eu acho que essa desigualdade não existiu apenas na música, existe em todo o lado, em todas as profissões. Eu acho que tudo se resolve sempre com a educação. Quando a música e a arte tiverem a mesma importância nas escolas que tem a matemática, o inglês e o português", indica.

A artista, que foi uma das primeiras mulheres em Portugal a viver somente do jazz, mostra-se decidida a continuar a cantar e a inovar a música com a sua "misturada", oriunda da dupla nacionalidade que detém.

"Eu acho que me encontrei quando me comecei a exibir. Qual é o meu lugar na música? O que é eu vou fazer? Eu vou fazê-lo como é a minha pele. É uma misturada. A música é tudo aquilo que me apaixona. É toda a música que eu possa habitar", diz.

Quer seja em Portugal, em Moçambique ou no resto do mundo: "Eu vou cantar até morrer, posso-lhe garantir", esclarece a cantora.

No JazzFest Bonn, Maria João e os OGRE electric apresentaram algumas músicas do mais recente álbum Open Your Mouth (2020). A atuação contou com os músicos João Farinha, no teclado, e Silvan Strauß, na bateria.

O projeto Ogre, que iniciou em 2012, mistura vários estilos musicais como o jazz, o hip-hop, o soul e a música eletrónica.

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