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Coronavírus em África: Medidas a mais ou a menos?

Henry-Laur Allik
24 de março de 2020

Com a propagação cada vez mais rápida da Covid-19, governos implementam medidas mais restritivas para conter a epidemia. O Ruanda impôs um bloqueio total e a África do Sul vai seguir o mesmo caminho. 

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Foto: Reuters/M. Hutchings

Com o número de infeções do novo coronavírus a aumentar na África do Sul, o Presidente Cyril Ramaphosa anunciou na noite de segunda-feira (23.03) um bloqueio de 21 dias a partir de quinta-feira para conter a propagação naquela que é a economia mais industrializada de África, com 57 milhões de pessoas.  

Südafrika Kapstadt World Economic Forum
Presidente sul-africano, Cyril RamaphosaFoto: picture-alliance/AP

O anúncio do chefe de Estado sul-africano chega numa altura em que o número de casos de Covid-19 no país já ultrapassa os 400, com um aumento de 47% entre domingo e segunda-feira, tornando a África do Sul o país com mais casos no continente. O ministro da Saúde, Zweli Mkhize, tinha já lançado o alerta: as infeções "podem afetar até 60% da população".

Antes da África do Sul, o Ruanda também impôs um bloqueio total, o primeiro no continente, que levou a uma corrida às compras.

As medidas impostas pelo Governo têm uma duração prevista de duas semanas, mas muitos ruandeses acreditam que deverão ser prolongadas. Até agora, o Ruanda regista 19 casos confirmados de Covid-19, o número mais elevado na África Oriental.

O bloqueio inclui muitos negócios considerados não essenciais. A medida causou preocupação e incerteza generalizadas entre os ruandeses, que não sabem como vão conseguir alimentar as suas famílias.

Patricia Uwineza, mãe solteira, tem um pequeno salão de cabeleireiro em Kigali: "Ainda tenho de negociar com o banco para aguentar, mas já estamos a ficar sem mantimentos em casa", disse à DW. "Como mãe solteira, tenho de sustentar uma casa de quatro pessoas, por isso podem imaginar quão difícil se está a tornar esta situação." 

Südafrika Kapstadt | Coronavirus | Flughafen
Passageiros no aeroporto internacional da Cidade do CaboFoto: Reuters/S. Hisham

Kagame: Herói ou vilão? 

Os encerramentos também ameaçam deixar muitas pessoas desempregadas, num país onde o emprego é maioritariamente informal. Outro resultado do bloqueio foi a grande procura por produtos alimentares básicos, o que levou ao aumento dos preços. 

Kigali reagiu dando ordem aos comerciantes para venderem apenas a quantidade de comida necessária para um dia, por pessoa, depois de tomar medidas também para travar a especulação. 

O desempenho do Presidente Paul Kagame perante a crise está a dividir os africanos. No Facebook da DW, há quem considere que o chefe de Estado está a ser decisivo, mas ha também quem lhe chame ditador.

Muitos governos africanos, desde Angola ao Zimbabué, adotaram medidas semelhantes, embora não tão radicais. Alguns países proibíram ajuntamentos públicos, encerraram escolas, igrejas, mesquitas e bares e fecharam aeroportos. 45 dos 54 países do continente africano estão a ser afetados.

Na África subsaariana, as infeções ultrapassaram as 1.000 na manhã de segunda-feira (23.03). Países até agora poupados pelo coronavírus, como o Uganda, a Eritreia, Angola e Moçambique, reportaram os seus primeiros casos no fim de semana. Ao mesmo tempo, as mortes por Covid-19 começaram a aumentar.

África não está preparada

O diretor-geral da Organização Mundial de Saúde (OMS), Tedros Adhanom Ghebreyesus, avisou, entretanto, que os números oficiais provavelmente não refletem o cenário real.

A OMS também se mostrou preocupada com o facto de a fraca rede sanitária, a aglomeração populacional nos centros urbanos e a falta de unidades de cuidados intensivos, equipamento e pessoal especializado poderem limitar qualquer resposta.

Uma análise da Rand Corporation, um think-tank norte-americano, revela em 2016 que, dos 25 países mais vulneráveis a surtos infeciosos no mundo, 22 estavam em África.

A rotina de isolamento de cidadãos dos PALOP na Alemanha

No Malawi, profissionais de saúde estão preocupados com a falta de capacidade para lidar com uma epidemia. Os grandes hospitais já estão congestionados. No Hospital Central de Kamuzu, em Lilongwe, há apenas uma cama para cada quatro crianças.

Dinga Mithi, especialista em Saúde, explica à DW que, se não forem tomadas medidas rapidamente, os hospitais podem tornar-se terreno fértil para doenças. "Se este vírus surgir aqui no país, isto significa que muitas pessoas vão contraí-lo", alerta. 

Ter fé não chega 

O Governo do Gana declarou um dia de jejum e oração nacional na quarta-feira, 25 de março, para combater a propagação do vírus. Num nível mais prático, encerrou todas as fronteiras no domingo. Alguns ganianos criticaram ambas as medidas, afirmando que o país precisa de um plano bem coordenado contra a crise, e que o jejum, a oração e o encerramento de fronteiras não são suficientes. 

Na Tanzânia, o facto de o Governo não ter suspendido os encontros religiosos criou um verdadeiro escândalo, especialmente depois de o Presidente John Magufuli ter encorajado as reuniões, pedindo às pessoas que rezassem. O próprio chefe de Estado participou em serviços religiosos no dia em que o país reportou 12 casos do novo coronavírus.

Outros presidentes africanos estão a ser alvo de críticas por não respeitarem as suas próprias medidas. Angola encerrou as fronteiras aéreas, terrestres e marítimas mas, no sábado, o Presidente João Lourenço participou na tomada de posse do Presidente da Namíbia, Hage Geingob. À televisão estatal, João Lourenço disse estar de consciência tranquila: "Não dei um mau exemplo aos angolanos", garantiu, acrescentando que o seu decreto deixava espaço para circunstâncias excecionais. 

Nasra Bishumba (Kigali) e Chimwemwe Padatha (Lilongwe) contribuíram para este artigo.

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