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Com protestos, Senegal vive “primavera africana”

5 de julho de 2011

Antes modelo de democracia e estabilidade, o Senegal vive há dias situação política tensa com manifestações populares contra o presidente Abdoulaye Wade. Ele estaria tentando manter o poder por meio de manipulações

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O presidente senegalês Abdoulaye Wade, que desistiu de alterar a Constituição para se reeleger mais rapidamente
O presidente senegalês Abdoulaye Wade, que desistiu de alterar a Constituição para se reeleger mais rapidamenteFoto: picture-alliance/dpa

Durante uma semana, no final de junho, o Senegal foi palco dos piores protestos de sua história. Manifestantes atiraram pedras e coquetéis molotov; o Exército avançou para o centro da capital Dakar com gás lacrimogêneo e balas de borracha. Centenas de pessoas ficaram feridas. Edifícios públicos foram assaltados, a central da Senelec, a companhia elétrica nacional, pegou fogo.

O motivo para a raiva dos senegaleses é o constante aumento de preços de alimentos e de combustíveis, além dos apagões diários que paralisam a vida pública. Porém, o maior motivo para o descontentamento popular parece ser apenas um homem – o presidente Abdoulaye Wade, que erigiu gigantescos monumentos durante o seu mandato e que quer continuar comandando o país da costa ocidental africana.

“Fui protestar porque é minha obrigação como cidadão deste país. Queria dizer 'não', em alto e bom som – ‘não’ a essa traição que se passa diante de nossos olhos. É um escândalo. E é uma falta de democracia”, indigna-se o empresário Almamy Manga.

Aumento dos preços dos alimentos e dos combustíveis também entre os motivos dos protestos
Aumento dos preços dos alimentos e dos combustíveis também entre os motivos dos protestosFoto: Babou Diallo

Filho do presidente já atua como se estivesse no poder, diz oposicionista

Abdoulaye Wade está há 11 anos no poder. Em 2012, quer concorrer novamente. Apenas isso já é motivo de indignação para muitos senegaleses. Wade queria mudar a Constituição do Senegal para reduzir de 50 para 25% a quota mínima necessária para ser eleito presidente do país. Assim, mesmo com vários concorrentes, o atual presidente poderia ser escolhido mais rapidamente.

Além disso, os críticos de Wade temem que o presidente liberal passe as rédeas do Senegal para o filho mais velho, Karim, bastante impopular no país. Sendo já uma espécie de superministro, Karim Wade seria colocado como vice-presidente.

“Queríamos reforçar a democracia no Senegal com esse passo, não enfraquecê-la!”, diz Moustapha Guirassy, porta-voz do governo e que diz não entender a polêmica em torno das ideias de Abdoulaye Wade. “Além disso, queremos estabelecer o cargo de vice-presidente – o que seria uma contribuição para a divisão do poder”, explica.

Porém, há muito tempo, grande parte dos senegaleses não acredita mais nesse tipo de afirmação. Abdoulaye Bathily, do partido de esquerda Liga Democrática, não dá crédito à carta aberta de Karim Wade, na qual o filho do presidente senegalês se diz aberto a princípios democráticos: “Não podemos aceitar que este país continue unindo a política a um bando de familiares. O filho do presidente está envolvido em todas as decisões importantes – como se já fosse presidente”, diz Bathily. “Isso é simplesmente imoral!”, afirma.

Senegal vive "início do fim da era Wade"

A pressão das ruas fez efeito: Abdoulaye Wade acabou por desistir da alteração da Constituição e a situação no país parece ter se acalmado. Porém, os protestos deverão continuar. Babacar Ndiaye, cientista político, acha que o Senegal acaba de presenciar o nascimento da chamada “primavera africana” – em alusão à chamada “primavera árabe”, cujos movimentos populares acabaram na derrubada de governos na Tunísia e no Egito, por exemplo.

“Este é o início do fim da era Wade”, avalia Ndiaye. “Os protestos são um ponto de viragem na história do nosso país. Nada será como antes. O povo se recusa a seguir o presidente e quer que ele deixe o poder imediatamente”.

Autores: Alexander Göbel (Rabat) / Renate Krieger
Edição: António Rocha

Manifestantes enfrentam a polícia durante protesto diante do Parlamento em Dacar (23/6)
Manifestantes enfrentam a polícia durante protesto diante do Parlamento em Dacar (23/6)Foto: picture alliance/Photoshot