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SociedadePortugal

Aumentam pedidos de ajuda alimentar de africanos em Portugal

9 de novembro de 2020

Em Portugal, a crise económica provocada pela pandemia do coronavírus leva cada vez mais pessoas a pedir ajuda alimentar. A DW foi verificar a situação em Setúbal, onde as respostas camarárias são insuficientes.

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Foto: João Carlos/DW

Quarta-feira à tarde, entre as 15h00 e as 17h30, cinco voluntárias orientadas pelo padre Constantino Alves fazem atendimento social na Igreja da Nossa Senhora da Conceição, em Setúbal.

Liana Ribeiro, angolana mãe de dois filhos, veio buscar alimentos que são distribuídos todos os meses. Conta que teve de pedir ajuda à paróquia por necessidade, porque não tem meios de subsistência suficientes desde que veio para tratamento em Portugal há cerca de dois anos.

"Sim, estou desempregada. Eu vim por questão de saúde. Desde que vim nunca trabalhei", esclarece a angolana que conta que com o surto da pandemia a sua situação se agravou muito. "Não só a Santa Casa [paroquiana], pessoas de família também me têm ajudado muito", acrescenta.

Ao longo da tarde foram chegando mais pessoas, não só portugueses. É o caso de Kizola Ndonga Soki, uma mãe da República Democrática do Congo (RDC) a viver há 24 anos em Setúbal, que agora depende do apoio de instituições de solidariedade social. Confirma que perdeu o emprego de jardinagem com o confinamento imposto, em março passado, pelo surto da pandemia de Covid-19.

"Sou viúva. A minha situação é difícil porque tenho duas meninas na universidade. Tenho de pagar a propina, tenho de pagar tudo. Agora vou ao Centro de Emprego, chamaram-me para ir fazer formação", conta.

Outros cidadãos africanos, entre os beneficiários abordados pela nossa reportagem, não quiseram falar por vergonha, negando expor-se publicamente.

Portugal l Ersuchen um Nahrungsmittelhilfe von in Portugal lebenden Afrikanern
Liana Ribeiro a receber ajuda alimentar de voluntárias da Igreja da Nossa Senhora da ConceiçãoFoto: João Carlos/DW

Mais pedidos de ajuda

Há cada vez mais pessoas a pedir ajuda, sobretudo para comer, tal constatou a DW África no local. Além de alimentos secos, a paróquia também distribui, diariamente no início da noite, refeições quentes para cerca de 300 pessoas. Todos os meses, a instituição apoia, de diversas formas, cerca de 750 pessoas.

Do conjunto, há famílias que receberam cartões pré-carregados para compra de bens alimentares nos supermercados. A instituição criou há cinco anos uma clínica dentária, que, segundo Constantino Alves, presta serviço a baixo custo aos carenciados, tendo já assistido mais duas mil pessoas dos bairros pobres, sem apoio visível, nem da Câmara Municipal nem das juntas de freguesia.

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O padre Constantino confirma que na região de Setúbal o índice de pobreza nos bairros sociais da periferia da cidade é muito elevado, afetando centenas de famílias, entre as quais oriundas de África e descendentes de africanos, que com o agravar da pandemia ficaram no desemprego.

"Ou por desemprego ou trabalho precário, ou por razões de doença ou porque não têm formação profissional, ou porque vieram doutros países e ainda não conseguiram a sua inserção e inclusão, vivem de facto numa situação de exclusão social em que são privados de bens essenciais para viver, bens alimentares, ou que não têm dinheiro para pagar rendas de casa, água e luz", relata o pároco.

Faltam apoios do Estado 

Um dos bairros, também afetado pela pandemia, onde a pobreza faz parte do dia a dia dos seus habitantes, na sua maioria africanos, está na Quinta da Parvoíce, que viveu semanas sem água potável nas torneiras. 

Portugal l Ersuchen um Nahrungsmittelhilfe von in Portugal lebenden Afrikanern
Jorge Pimenta ficou semanas sem águaFoto: João Carlos/DW

"Estivemos aqui, sem exagero, quase um mês de sofrimento sem água. De repente, não houve aviso de corte de água. As Águas do Sado não comunicaram nada. Não houve qualquer diálogo com a população aqui do bairro", queixa-se Jorge Pimenta.

"Entretanto, disseram que iriam resolver e acabaram por não resolver [o problema]. O que aconteceu foi que de repente a água apareceu", conta o habitante do bairro.

No meio deste ambiente, Jorge Pimenta, representante da Comissão de Moradores do bairro, ainda confrontado com um processo de demolição, reclama falta de apoio das instituições camarárias.

"Primeiro foi a demolição, agora é a situação da água e mesmo assim nem a Câmara Municipal nem a Junta de Freguesia vêm cá. Não temos qualquer tipo de apoio. Tem aqui pessoas que estão a passar fome, não têm documentos, não estão a trabalhar", conta.

No seu plano de atividades para 2020, a Câmara Municipal de Setúbal, através da Divisão de Direitos Sociais, diz valorizar o estabelecimento de redes de cooperação com o movimento associativo e as instituições de solidariedade social, entre outras entidades, com vista a "encontrar as respostas mais adequadas aos problemas e carências que afetam os diferentes grupos sociais." Está expresso no documento um plano de integração de imigrantes, que tem em conta o combate à discriminação.

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