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Ativista angolano Rafael Marques passa de acusador a acusado

Pinto,Maria João13 de novembro de 2012

Rafael Marques é arguido numa queixa-crime movida na justiça portuguesa por nove generais e duas empresas angolanas. Isto acontece depois do ativista os ter processado num caso de extração de diamantes nas Lundas.

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O ativista e jornalista angolano é arguido numa queixa-crime movida na justiça portuguesa por nove generais e duas empresas angolanas.

Ele é acusado de "injúria e calúnia", um ano depois de um processo levantado pelo próprio Rafael Marques na justiça angolana, em que acusa os nove generais e as duas empresas da prática de "atos quotidianos de tortura e, com frequência, de homicídio", nas Lundas, zonas de extração mineira em Angola.

Mas Rafael Marques contesta a fundamentação da queixa-crime, lembrando que os visados estão a recorrer à justiça portuguesa, quando o inquérito sobre a situação nas Lundas foi aberto em Angola e começaram a ser ouvidas as testemunhas.


Generais em manoboras de distração
Esta segunda-feira (13.11), depois de ter sido ouvido no Departamento de Investigação e Ação Penal em Lisboa, Portugal, Rafael Marques afirmou que o caso se trata de uma manobra de distração.

Segundo o ativista angolano só "quando as testemunhas começaram a ser ouvidas, e as empresas aparecem como denunciadas, os generais decidiram, depois dos processos estarem a correr, começar uma ação em Portugal como forma de desviar as atenções do processo que decorre em Angola."

Rafael Marques investiga as práticas relacionadas com a extração mineira desde 2004, especialmente nas Lundas, que resultaram na publicação de um livro intitulado "Diamantes de sangue: Tortura e Corrupção em Angola" em 2011.

O ativista angolano não hesita na altura de justificar o processo movido contra os generais e empresas que agora o acusam de calúnia: "Crimes contra a humanidade porque as empresas que dirigem, e de forma ilícita fazem negócios com o Estado angolano, à luz da legislação angolana, são responsáveis por uma série de violações dos direitos humanos."

Uma acusação que, de acordo com Rafael Marques, foi sustentada na Procuradoria-Geral da República de Angola, da qual resultou um inquérito que estava a decorrer normalmente, até esta segunda-feira (12.11).

Atirar areia aos olhos?

Para o ativista o processo que decorre em Angola não passa de uma manobra e explica que "os generais decidiram optar não pela justiça angolana, mas pela justiça portuguesa para evitar precisamente que as questões de corrupção e de outras ilicitudes dos seus envolvimentos fossem discutidas em Angola."

Com isso os generais quereriam também, na opinião de Rafael Marques, tornar a sua situação mais difícil: "É mais seguro discutir aqui onde os portugueses não conhecem os meandros e onde é mais difícil para um ativista e jornalista como eu trazer testemunhas das áreas de exploração mineira."

Rafael Marques é também testemunha num processo apresentado por um cidadão angolano a residir em Portugal, que deu origem a um inquérito-crime aberto pelo Ministério Público português.

O caso envolve três altos dirigentes do regime angolano - Manuel Vicente, vice-presidente de Angola, o general Vieira Dias, ministro de Estado e chefe da Casa Militar do Presidente angolano e Leopoldino Nascimento, consultor do general "Kopelipa". Em causa, suspeitas de fraude e branqueamento de capitais.

A partir de Lisboa justiça portuguesa tranca ativista em Luanda

No ambito deste processo foi imposto ao ativista uma medida de coação de termo de identidade e residência. O ativista, entretanto, considera "um procedimento normal
em casos como este".

Mas por outro lado Rafael Marques acha estranho, que os cidadãos de um país
se queixem dos seus próprios cidadãos noutro país.

Na prática, o ativista não poderá "sair de Luanda, por mais de cinco dias, sem comunicar às autoridades portuguesas".

Relações Angola-Portugal chamuscadas?
Uma notícia que já deu origem a uma reação do Jornal de Angola que, através do seu editorial, sob o título "Jogos Perigosos", deixou o alerta: o caso prejudica as relações entre Portugal e Angola.

O jornal estatal vai mais longe, condenando as elites políticas portuguesas pelo seu ódio a Angola e ataques cegos aos políticos angolanos. Para Rafael Marques isso evidência a má criação do executivo angolano e a forma chantagista como tem estado a desenvolver uma diplomacia baseada na corrupção e compra de amizades.

Rafael Marques considera mesmo que "Angola esperava uma certa vassalagem das autoridades portuguesas e que neste momento não está a ser o que esperava."

Quanto à queixa-crime movida pelos generais sócios das empresas que atuam nas Lundas, visados no processo levantado por Rafael Marques na justiça angolana, aguarda-se a decisão da justiça portuguesa para saber se o caso vai ou não a julgamento.

Para já, depois de imposta a medida de coação de termo de identidade e residência, Rafael Marques não poderá sair de Luanda por um período superior a cinco dias sem informar as autoridades portuguesas.

Autora: Maria João Pinto
Edição: Nádia Issufo/António Rocha