Angola: Professores reivindicam "até à última consequência"
27 de dezembro de 2022Os professores angolanos deram ao Governo até ao dia 16 de janeiro para resolver as suas reivindicações, caso contrário avançarão para a terceira fase da greve, que poderá comprometer o ano letivo.
O Sindicato dos Professores Angolanos (SINPROF) submeteu o caderno reivindicativo ao Ministério da Educação em 2019, mas, até agora, as partes não chegaram a um acordo. O sindicato fala em falta de vontade política por parte do Executivo de João Lourenço para resolver as "questões fraturantes" dos salários, subsídios e do Imposto sobre o Rendimento do Trabalho (IRT).
Em novembro, os professores avançaram para a paralisação das aulas em todo o país, com uma adesão de quase 100%. Os educadores angolanos realizaram já duas fases de greve: a primeira entre os dias 21 e 30 de novembro, e a segunda entre 6 de dezembro e 16 de dezembro.
Neste momento, a greve está suspensa. No entanto, em entrevista à DW, o secretário-geral do Sindicato Nacional dos Professores angolanos, Admar Jinguma, garante que os docentes estão dispostos a ir "até às últimas consequências" para verem as suas exigências atendidas.
DW África: A que se deve a suspensão do início da terceira fase da greve dos professores em Angola?
Admar Jinguma (AJ): Nós, no SINPROF, como vivemos e exercitamos a democracia - até porque os professores devem ser os primeiros cultores da democracia, como um dos valores que se inspiram na escola - levámos à consideração dos professores em assembleia realizada no passado dia 24 os resultados da reunião negocial do dia 15 de dezembro com o Ministério da Educação e o Ministério do Trabalho. Nesse encontro, houve alguma aproximação sobre alguns pontos, sobretudo os que dependiam de uma decisão da ministra da Educação, mas não nos pontos que denominamos fraturantes. Têm a ver com o desagravamento do IRT, revisão de salários e subsídios e outras questões que dependem do concurso de outros departamentos ministeriais do Executivo, nomeadamente das Finanças e do próprio titular do poder, nos termos da nossa Constituição.
DW África: Caso o Ministério da Educação não apresente propostas convincentes, qual será o próximo passo?
AJ: Vamos ver. A bola está novamente do lado do Ministério, que representa o Governo no seu todo, já que são questões que não dependem diretamente do Ministério da Educação, mas de outros departamentos ministeriais do Executivo e duma autorização direta do Presidente João Lourenço. Estamos expectantes.
DW África: Sentem que há pelo menos vontade política por parte do Governo?
AJ: Sobre as questões fraturantes não há vontade. Não há vontade de melhorar os salários dos professores, porque há uma cultura no país de pagar mal aos professores. No setor da Educação, o salário mais baixo é de 87.000 kwanzas [cerca de 162 euros]. O mais alto é de cerca de 385.000 kwanzas [cerca de 717 euros] para o professor doutor que chega ao topo da carreira. Basta olhar para a proposta orçamental que o Governo apresentou agora para perceber o ligeiro aumento que houve na Educação. Vamos sair agora de 6,6% para pouco menos de 7%.
DW África: Este aumento no Orçamento Geral do Estado será, de certa forma, benéfico para os professores?
AJ: Não na perspectiva que se deseja. Nós gostaríamos de ter um orçamento para a Educação que chegasse, pelo menos, à casa dos dois dígitos. Já nem estamos a pedir muito. Angola precisa de materializar os instrumentos internacionais que rubricou que obrigam os governos a destinar 20% do seu orçamento anual para a Educação ou 6% do seu Produto Interno Bruto (PIB).
DW África: O SINPROF diz que está nas mãos do Ministério da Educação e outros departamentos ministeriais apresentar boas propostas no dia 16 de janeiro. Qual seria a proposta ideal para a alteração do estatuto remuneratório dos professores?
AJ: Em relação aos salários, o ideal seria que conseguíssemos pagar por cada técnico médio que entra no setor pelo menos 200.000 kwanzas [cerca de 372 euros] e ao professor doutor que chega ao topo da carreira pelo menos 700.000 [o equivalente a 1304 euros].
DW África: Se tudo se mantiver como está, até onde irá a greve?
AJ: Nós pretendemos ir até às últimas consequências. Pretendemos lançar mão a todas as ferramentas reivindicativas que a Constituição e a lei colocam à nossa disposição. Nós interpolámos as fases de greve, mas pretendemos agora partir para uma greve por tempo indeterminado.
DW África: Ir até às últimas consequências pode significar a paralisação completa do ano letivo? Como é que ficam os alunos?
AJ: Obviamente isto é uma ação legal e se isso viesse a acontecer a culpa só poderia ser imputada ao próprio Governo. O que estamos a reivindicar são questões que decorrem do funcionamento normal das estruturas governativas. Aliás, o próprio Governo devia ter alguma vergonha de estar sempre a ser obrigado a resolver questões que sabe que fazem parte das suas obrigações.